"Olhando para você torna isso mais difícil
Mas eu sei que você encontrará outro
Que nem sempre a faça querer chorar
— Sleeping at Last"San Diego, Califórnia | Presente.
Me estico o máximo que posso na escada para conseguir encaixar o livro na última prateleira da estante. Odiava quando pegavam os mais antigos. Histórias da cidade.
Trabalhar em uma biblioteca, era como ser dona dela. Você era responsável pelo empréstimo de livros, devolução e reposição dos mesmos nas estantes. A única coisa que não fazia era limpar, para resumir. E não me entenda mal, eu amo livros. Eu amo trabalhar em uma biblioteca –poderia desempenhar essa função até que minhas costas e pernas, devido à idade, me impedissem de subir essas escadas para encaixar os livros de volta no lugar. Mas que era cansativo, eu não poderia negar.
– Moça – ouço alguém me chamar, assim que desço o último degrau da escada móvel, com cuidado –, onde fica a sessão de fantasia?
Era uma garota. Cabelo mediano, negro e ondulado. Olhos azuis penetrantes, a pele clara, e as vestes totalmente despojadas. Ela passava um ar de despojada, na verdade. As características trazem memórias à minha cabeça, e preciso piscar algumas vezes e desviar o olhar para me lembrar da realidade em qual vivo.
Já se passaram 10 anos, Camila, por Deus!
Acho que, mesmo que eu já não me lembrasse em relação a sentimentos com tanta frequência, minha mente ainda encontrava um jeito de a procurar em todas as pessoas. Seja um cabelo preto, uma jaqueta de couro, um olho claro –principalmente verde. Qualquer coisa já bastava para minha mente me enfiar em uma fantasia. E, para ser sincera, sequer sei o porquê disso. Eu fui embora, eu não quis mais procurar, eu arranquei todas as fotos do meu quarto, guardei todos os objetos. Eu me livrei dela.
— No terceiro corredor à direita, meu bem – eu digo, apontando a direção. – Busca algum específico?
— Na verdade, eu só estou seguindo ordens da minha namorada que me obrigou a buscar um livro de fantasia pra ler – não consigo evitar um sorriso com a forma natural que ela revela isso. É bonito ver como as pessoas hoje em dia se dão bem com suas sexualidade e as expõe dessa maneira, naturalmente, como sempre deveria ter sido.
Não que eu não me desse bem com a minha sexualidade ou tivesse alguma vergonha de responder quando alguém me perguntava. Digo na época em que eu realmente desfrutava de alguém com o mesmo sexo que eu. As coisas não eram tão bem resolvidas assim. Obviamente, não era uma "época anos 80", mas as chances de eu revelar que estava buscando um livro para minha namorada e a bibliotecária não me olhasse de cima a baixo com desdém eram muito baixas. As vezes, imagino quantas pessoas não teriam se assumido na minha época se o mundo não fosse tão mais aberto assim.
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Em Outra Vida, Talvez?
FanfictionTalvez sejamos a pessoa certa, na hora errada. Um romance adolescente. Um término indefinido. Um amor interrompido. Já haviam se passado 10 anos desde que Camila a vira, e, embora tenha seguido com sua vida sem ela, as lembranças sempre a assombrar...