Flagrados.

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Linda Graymark.

Um simples beijo pode acabar se tornando um enorme problema, e essa frase é verdadeira em vários sentidos, vou citar alguns exemplos: Primeiro, se você beijar alguém por quem você é apaixonada e a outra pessoa não sentir o mesmo por você um simples beijo pode lhe deixar com o coração partido. Segundo, se a pessoa a qual você beijou for seu amigo a amizade de vocês pode acabar ficando estranha e isso pode se tornar outro problema pois você pode acabar perdendo uma amizade incrível. Terceiro, você pode beijar o seu namorado no seu quarto de forma inocente sem nenhum pensamento de fazer algo a mais e o seu pai flagrar vocês e pensar mil besteiras sobre até aonde esse simples beijo levaria e isso se resultar em uma tremenda tempestade cheia de raios e trovões, essa terceira questão é o meu caso.
Nesse exato momento estou sentada ao lado de Romeu no pequeno sofá da sala enquanto o meu pai anda na nossa frente de um lado para o outro com uma mão no queixo sem dar uma palavra se quer, já o meu namorado está com o olhar fixo no meu pai com uma expressão de pura confusão no olhar, como se estivesse com uma luta interna dentro de si, algo que eu não consigo entender. Ele está assim desde que viu o meu pai pela primeira vez na porta do meu quarto, no começo eu achei que era porque nós tínhamos sido pegos nos beijando no meu quarto, mais depois que o meu pai nos mandou ir para a sala e nos mandou sentar no sofá, eu achei que a sua expressão mudaria já que o "flagra" já havia passado, mais não. Precisava acabar logo com essa situação com o meu pai para que eu e Romeu pudéssemos sair e ele pudesse me explicar o porque de estar assim, então eu me coloquei de pé e falei.
- Papai eu...
- Sente-se. - Ele ordenou já parando de andar e olhando para mim com a expressão mais séria que eu já tinha visto.
- Mais papai... - Eu tentei outra vez, mais fui interrompida novamente.
- Sente-se Linda, eu não vou falar outra vez. - Mesmo contra a vontade, eu sentei, mais não iria deixar ele me tratar como se eu tivesse cometido um crime.
- Papai, isso é ridículo, você não pode me tratar como se eu fosse uma criança a qual você da um sermão por ter feito uma travessura. - Se eu tinha achado que a sua expressão anterior era a mais séria com a qual ele já tinha me olhado, eu estava terrivelmente enganada, o modo que ele estava me olhando agora, esse sim era a pior.
- Você está chamando a situação que eu acabei de presenciar de "travessura"? - Disse. - Você acha mesmo que pode se referir a isso como travessura? - Respirei fundo e respondi.
- Não papai, eu não quis dizer isso, eu só acho que você está dando muita importância ao que acabou de acontecer.
- Muita importância Linda? - Ele disse incrédulo. - No seu primeiro dia de volta você arranja um "amigo", no segundo eu pego você aos beijos com ele no seu quarto, o que vai acontecer no terceiro? Será que você poderia me falar para eu já ficar preparado. - Não importa se ele era o meu pai, eu não iria deixa-lo falar comigo desse jeito.
- Papai, eu não vou permitir que você fale comigo assim. - Eu disse já me levantando. - Você é o meu pai e apesar dos anos em que passamos longe um do outro deveria saber que eu jamais faria algo assim.
- Assim como?
- Como deve estar passando pela sua cabeça. - Parece que o meu tom de voz mais "altivo" fez Romeu despertar do que seja lá o que estivesse acontecendo com ele, pois ele se levantou e segurou o meu braço com as duas mãos e disse.
- Linda, mantenha a calma. - Disse para mim e depois se dirigiu ao meu pai. - Senhor, eu peço desculpas pelo o que acabou de acontecer, sei que eu não deveria ter entrado em sua casa sem a sua permissão ou sem o senhor estar presente, mais eu garanto que nem eu e nem Linda tínhamos nenhuma intenção de fazer nada naquele quarto, pelo menos nada do que o senhor provavelmente deve estar pensando nesse momento.
- E será que eu posso saber que tipo de intenção vocês tinham? - Perguntou o meu pai tirando a sua atenção de mim e a dirigindo a Romeu.
- Nada demais, eu lhe garanto. - Disse. - Na verdade, foi eu que perguntei a Linda se ela queria que eu subisse com ela, a sua filha não tem culpa de nada.
- E posso saber qual era a sua intenção em subir? - Meu pai continuou. - Embora ao meu ver esse fato não tire a culpa da minha filha, já que ela concordou que você subisse até aqui.
- Eu estava curioso para saber como era o lugar em que Linda vivia, a sua filha é muito importante para mim, e quando uma pessoa é importante para você, você quer saber tudo sobre ela, até as coisas que para outras pessoas parecem sem importância.
- E minha filha já é tão importante assim para você? - Perguntou - Mesmo você a tendo conhecido ontem? - Essa era a minha deixa para interromper essa conversa, já que eu não sabia o que Romeu iria responder.
- Papai, eu não o conheci ontem. - Disse e meu pai voltou o olhar para mim. - Nós nos conhecemos naquele acampamento que você e a mamãe me mandaram quando eu era criança, você lembra? - Eu disse e a expressão no rosto do meu pai mudou de séria para surpresa.
- Não me diga que ele é aquele garoto que você vivia pedindo para que eu anotasse o telefone para ligar para ele. - Olhei para Romeu que agora me olhava com um lindo sorriso no rosto após ouvir essa afirmação do meu pai.
- Sim papai, é ele. - Disse e voltei o olhar para o meu pai. - Nós nos reencontramos por acaso em uma loja no centro ontem.
- Eu imagino como você deve ter ficado feliz, porque aquele garoto realmente parecia ser importante para você, pelo tanto que você pedia que eu ligasse para ele.
- Ele era. - Me virei para Romeu. - Ele é. - Ouvi o meu pai suspirar então voltei a olhar para ele, que agora estava com uma expressão mais suave no rosto. - Então por favor, não fique chateado comigo ok?
- Linda, eu não estou chateado com você, eu nunca fico, você sabe disso, eu estou chateado com a situação, o que é diferente, por acaso você sabe o que é para um pai encontrar a sua princesinha beijando um garoto pela primeira vez? - Disse e com isso eu soube que situação estava resolvida. - Um pai nunca está pronto para conhecer o primeiro namorado de sua filha.
- Nós não estamos namorando, pai. - Nao me pergunte porque eu disse isso, eu sei que esse seria provávelmente o momento ideal para eu resolver esse assunto, mais algo dentro de mim, nem me pergunte o que porque eu não faço idéia, me diz que essa não é a hora certa para o meu pai saber que eu estou namorando com o Romeu, apesar do beijo que o meu pai presenciou, de alguma forma eu tenho que fazer o meu pai acreditar que nós somos apenas amigos.
- Depois do que eu acabei de ver você quer que eu acredite nisso? - Disse meu pai com uma sombrancelha arqueada. - Eu olhei para Romeu com um olhar suplicando por ajuda, eu pensei que ele iria me olharia com fogo nos olhos depois do que eu acabei de dizer, mais pelo incrível que pareça, a sua expressão estava calma, então, atendendo o meu silencioso pedido de socorro, ele soltou o meu braço, olhou para o meu pai e disse.
- Sua filha disse a verdade, senhor, nós não estamos namorando. - Disse ele com uma voz calma.
- Então o que significa o beijo que eu acabei de ver? - Perguntou o meu pai ao olhar para ele.
- Foi apenas uma coisa de momento, Linda estava me contando sobre a sua relação com a mãe. - Explicou. - Eu tentei consola-la e com a emoção do momento acabamos nos beijando, mais foi apenas isso, sua filha e eu somos apenas amigos. - A expressão do meu pai relaxou, seus ombros ficaram caídos e o seu olhar pesaroso, Romeu havia tocado no seu ponto fraco, então eu sabia que o meu pai iria acreditar em nós agora.
- A situação de Linda com a mãe é complicada, esse fato sempre a fez muito mal. - Disse. - Obrigado por ter ficado com ela e, me desculpe por ter reagido daquela forma e não ter deixado vocês explicarem o que realmente aconteceu.
- O senhor não precisa me agradecer e nem perdir desculpas, sou eu que tenho que pedir desculpas por ter entrado em sua casa sem a sua permissão, garanto que isso não vai mais se repetir. - Romeu disse e o meu pai fez que sim com a cabeça. Com a situação resolvida, eu aproveitei para finalmente tentar sair com Romeu, eu tinha que perguntar a ele o motivo dele ter ficado daquele jeito ao ver o meu pai.
- Bom. - Comecei. - Já que está tudo resolvido, acho que nós já podemos ir. - Falei e com isso tive novamente a atenção do meu pai voltada para mim.
- Ir? - Meu pai perguntou.
- Sim papai, nós estavamos de saída, eu apenas subi para guardar o quadro que eu ganhei de presente, pois eu não queria deixa-lo na portaria. - Respondi.
- E será que eu posso saber aonde vocês vão? - Como eu não sabia para aonde iríamos, eu olhei para Romeu, que sorriu e disse.
- Vou levar Linda para ver a melhor loja de quadros do Rio de Janeiro, senhor. - Disse. - Eles tem quadros incríveis lá e, apesar do lugar não ser tão grande, eles tem uma cafeteria dentro do lugar que tem o melhor cappucino que a sua filha irá experimentar na vida. - A simples idéia de passar a tarde em meio a pinturas fez a minha alma sorrir, era como se a minha alma precisasse da arte para sobreviver. - E depois. - Ele continuou, se o senhor não se importar, eu gostaria de leva- la para jantar na minha casa, foi um pedido da minha mãe. - Ele se virou para mim. - Ela quer te conhecer. - Tudo bem, por essa eu não esperava. Uma coisa era sair com Romeu, outra coisa bem diferente era conhecer a sua mãe, apesar de eu sentir uma conexão inexplicavel com Romeu ao ponto de parecer que eu o reconheço praticamente desde sempre, tinha que admitir que em uma coisa o meu estava certo, fazia apenas dois dias que nós tínhamos nos reencontrado e, sinceramente, não sei se eu estou preparada para conhecer a mãe dele.
- Linda, você quer ir? - O meu pai me perguntou. Fiquei em silêncio por um momento, é claro que eu poderia dizer não, mais nesse caso eu poderia acabar magoando o Romeu, então eu meio que não tinha opção.
- Sim papai, eu quero ir. - Disse por fim.
- Pois muito bem. - Disse e virou-se para Romeu novamente. - Eu quero Linda em casa antes das dez, mesmo que eu não esteja aqui e ela deve atender ao celular todas as vezes que eu ligar, estamos entendidos?
- Sim, senhor. - Romeu disse e confirmou com a cabeça. Ao papai mencionar o fato de não estar em casa, uma coisa me veio em mente.
- Papai, falando sobre o senhor não estar em casa, o que está fazendo em casa a essa hora? Não deveria estar no trabalho?
- Deveria, mais eu acabei esquecendo um documento importante e tive que voltar, sorte a sua, não é? - Ele disse com um sorriso irônico no rosto.
- Muita sorte. - Disse sorrindo também.
- Bem, vamos? - Disse Romeu se dirigindo para mim.
- Sim. - Eu disse e seguimos em direção a porta. Papai nos acompanhou até o elevador, quando ele chegou eu perguntei.
- O senhor não vem? - Perguntei ao meu pai.
- O documento, lembra? - Disse. - Com tudo o que aconteceu eu nem mesmo cheguei a pega-lo. - Fiz que sim com a cabeça e eu e Romeu entramos no elevador, quando a porta já estava se fechando, papai perguntou. - A propósito, qual é o seu nome rapaz?
- Romeu. - Então a porta do elevador se fechou enquanto o meu pai olhava para Romeu com uma expressão de puro choque.

***

Estávamos passeando pelas diversas salas da loja de quadros em que Romeu tinha me levado, mais para mim era como se eu estivesse andando entre as nuvens, pois parecia que eu estava em um sonho.
Todas as paredes da loja eram de um tom de azul bem escuro com algumas luzes de led amarela espalhadas de forma aleatória, era como se vários vagalumes estivessem voando pelas paredes e o teto era de uma cor branca, já o piso era de um cimento preto com algumas partes na cor cinza. Já os quadros... Eram de tirar o fôlego. Cada sala era dedicado a um tipo de pintura, como paisagens, pintura abstrata ou nos estilos de Van Gogh ou jackson Polock, confesso que esse último era o meu preferido, eu adorava como Polock misturava várias cores em uma tela, dando vida a uma tela em branco, e era por isso que eu amava tanto arte, porque arte é vida. Era como uma pessoa expressava o que tinha dentro do seu coração, expondo os seus sentimentos mais profundos e secretos, seu pensamento mais íntimo. Eu ficava imaginando o que o pintor estava pensando em cada pincelada que ele dava na tela, onde estava a sua mente e o seu coração nesse momento, deve ser mágico criar algo assim e era essa magia que eu queria expressar durante toda a minha.
- É lindo, não é? - Disse Romeu enquanto olhavamos um quadro na última sala da loja, ele não havia falado nada desde que entramos na loja, ele apenas sorria para mim ao me ver olhar os quadros, acho que ele sabia como eu estava me sentindo e queria que eu aproveitasse o momento. Romeu me entendia de uma forma que nem eu mesma conseguia me entender, era incrível a conexão que tínhamos.
- Lindo é pouco, é magnífico. - Respondi. - Agora eu sei porque esse é o seu lugar preferido no mundo.
- Esse não é o meu lugar preferido no mundo, só do Rio. - Disse. - O meu lugar preferido no mundo é aonde você estiver. - Olhei para ele e lhe dei o sorriso mais apaixonado que eu tinha. - Você está com fome? - Ele me perguntou.
- É agora que eu vou experimentar o melhor cappucino do mundo?
- Pode ter certeza que sim. - Ele respondeu.
- Estão vamos, quero saber se você está realmente falando a verdade. - E com isso Romeu pegou na minha mão e me levou até a cafeteria da loja, era um lugar pequeno com uma parede toda de vidro que dava vista para a rua, tinha algumas mesas de plástico espalhadas pelo lugar, cada um com duas ou três cadeiras e, a frente, um enorme balcão com alguns tipos de bolos e doces, e atrás do enorme balcão havia pessoas preparando vários cafés enquanto outras atendiam os clientes. Romeu nos levou até uma mesa com duas cadeiras perto da enorme janela e disse.
- Pode se sentar aqui, eu vou até lá fazer os nossos pedidos, o que você gostaria de comer? Ele perguntou enquanto eu me sentava em uma das cadeiras e olhava para o cardápio na mesa mais não o peguei, em vez disso eu olhei para Romeu e disse.
- Quero o que você sempre pede quando vem aqui. - Ele sorriu para mim ao me responder.
- Como quiser, doce Julieta. - E com isso ele saiu indo em direção ao enorme balcão.
Depois que Romeu saiu eu fiquei olhando pela janela vendo as pessoas andando na rua, mais o meu pensamento foi levado até a expressão no rosto do meu pai antes do elevador se fechar, seu olhar era de pura incredulidade, não conseguia entender porque ele tinha olhado para o Romeu daquele jeito. Simplesmente não tinha motivo para isso, ainda mais porque a tensão do momento já tinha passado.
- Está tudo bem? - Eu estava tão perdida naquele pensamento que nem havia me dado conta de que Romeu tinha chegado, ele colocou uma enorme bandeija no meio da mesa e se sentou na outra cadeira ficando de frente para mim.
- Sim, está, eu só estava pensando. - Eu respondi..
- No jeito como o seu pai me olhou quando a porta do elevador se fechou? - Ele disse enquanto colocava uma xícara de vidro com um creme branco e um pedaço de torta de chocolate com pedaços de morango a minha frente.
- Você também percebeu?
- E tinha como não perceber? Ninguém nunca me olhou daquele jeito em toda a minha vida. - Disse enquanto colocava outro café e outra torta iguais aos meus a sua frente. - Você falou alguma coisa para o seu pai sobre mim para que possa justificar a forma como ele me olhou daquele jeito?
- Não, mais... - Então eu me lembrei de algo. - Você.
- Eu?
- Sim, você também estava olhando de uma forma bem estranha para o meu pai. - Ele ficou em silêncio. - Romeu, porque você olhou para o meu pai daquele jeito? - Ele suspirou.
- Eu não sei, juro que eu não sei. - Ele respondeu. - Quando eu vi o seu pai... Senti algo estranho, era como se eu conhecesse o de algum lugar, o que é loucura porque eu nunca vi o seu pai em toda a minha vida.
- Tem certeza de que você nunca viu o meu pai? Talvez o tenha visto na rua ou no hospital em que ele trabalha.
- Linda, eu posso afirmar que nunca na minha vida eu vi o seu pai, nem na rua e muito menos no trabalho dele, eu nem mesmo sei em que hospital o seu pai trabalha. - Ele afirmou.
- Então... Como...
- Eu não sei. - Ele disse e nós ficamos em silêncio pensando, como Romeu podia conhecer o meu pai sem conhece-lo de verdade. Isso não fazia sentido, respirei fundo e resolvi tomar um gole do café que Romeu havia trazido para mim e.
- Meus Deus! - Eu disse e olhei para o café e depois para Romeu que sorria olhando para mim. - Esse café é incrível.
- Eu disse. - E com isso nós continuamos comendo enquanto olhavamos o tempo passar pela enorme janela ao nosso lado.

Até Onde Você Iria Por Amor. Concluída. Onde histórias criam vida. Descubra agora