18. O porquê

5.2K 608 209
                                    

Richie passou o restante do dia comigo. Conversamos bastante, enquanto ele preparou algo para comermos. Ele conseguiu me acalmar e transformar meu humor totalmente. Assim que ele foi embora no final do dia, eu me sentia um pouco mais preparada pro que viria a seguir. Poderia não ser perfeito e talvez eu tivesse que recomeçar mais uma vez, mas era um passo que eu tinha que tomar.

Consegui dormir uma noite semi tranquila e acordei com um senso incomum de confiança. Mandei mensagem para Aran, perguntando se podíamos nos ver no almoço e em seguida mandei mensagem para Freen, perguntando quando ela teria um tempo livre para nos encontrarmos.

Enquanto eu aguardava a resposta de ambos, fui para a área externa da minha casa e coloquei minhas luvas. Conectei meu celular na caixa de som e coloquei uma playlist animada para me colocar no clima. Comecei dando alguns pulinhos, e logo em seguida comecei a treinar os os movimentos dos meus pés, fazendo algumas sequências de golpes no ar com as mãos. Quando senti que estava aquecida o suficiente, já sentindo algumas gotas de suor na minha pele, decidi que era hora de ir para o saco de pancada. Antes de conseguir dar meu primeiro golpe, no entanto, a campainha tocou.

Suspirei, um tanto frustrada, e me encaminhei até a porta. Abri a mesma e do outro lado estava Freen. Nem me surpreendi dessa vez, apesar do meu coração acelerar um pouco, mas isso acontecia sempre na sua presença. Ela me olhou com olhos levemente arregalados, que foram do meu rosto e desceram para o restante do meu corpo, em análise. Fiquei um pouco tímida nos meus shorts pretos curtos e camiseta colada branca, minhas luvas na minha mão direita. Seus olhos demoraram algum tempo no meu corpo, até voltarem para os meus olhos, mais escuros e intensos que antes. Eu vi o movimento da sua garganta quando ela engoliu em seco e em qualquer outro momento eu me derreteria a sua óbvia atração. Mas no momento isso só me fez querer rir e chorar ao mesmo tempo pela ironia de tudo.

"Desculpa aparecer do nada, mas a sua mensagem me assustou um pouco," ela falou finalmente, como se deixando sóbrios seus pensamentos.

"Que bom que você veio. Precisamos conversar," falei num tom de voz sério e firme, que fez seu rosto cair levemente para a esquerda e me olhar em confusão. "Entra," disse mais suavemente, dando um passo para ao lado para lhe dar espaço.

Eu a levei comigo até o pátio externo da minha casa, onde desliguei a música que ainda saia dos auto falantes e deixei minhas luvas no local adequado. Ela ia atrás de mim, parecendo atenta em todos os meus movimentos. A levei para além do saco de boxe, onde eu tinha um conjunto de mesa e bancos de bambu. Meu jardim não era tão lindo ou bem cuidado como o dela, mas algumas flores se espalhavam pelo ambiente.

Indiquei para que ela sentasse no banco acolchoado e me sentei do outro lado do mesmo, me virando para ficar de frente a ela. Essa era a hora.

"Você parece séria," ela disse, passando a mão nos seus cabelos em um gesto de nervosismo. Mordi meu lábio inferior, pensando que queria poder confortá-la, mas a verdade era que eu também estava nervosa.

"Depois da nossa última conversa," decidi começar. "Eu fiquei muito confusa com algumas coisas ditas e eu sei que o motivo de ainda não termos conversado mais sobre o nosso passado, foi porque eu tentei evitar o assunto a todas custas," continuei, fechando meus olhos nesse final. "Mas eu não posso mais fazer isso, para a minha saúde mental, Freen, eu preciso finalmente para de fugir da verdade," concluí, voltando a me sentir segura com a minha decisão.

Freen me encarava com um misto de confusão e, não sei, admiração? Não saberia confirmar, mas ela me encarava de um jeito intenso, porém gentil.

"Eu estou disposta a conversar com você sobre o que você quiser, Becky. Tem partes do passado que ainda são dolorosas de lembrar para mim, principalmente as consequências das minhas próprias decisões. Mas eu estou disposta a conversar com você e revirar qualquer ferida," ela disse levando sua mão até meu rosto, tirando dali uma mecha de cabelo. Fechei meus olhos com seu toque tão habitual, me transportando para um tempo onde as coisas eram mais fáceis. "A gente merece isso," ela concluiu, passando as pontas dos seus dedos levemente na minha bochecha, antes de retirar sua mão do meu rosto.

Abri meus olhos lentamente e encarei a mulher a minha frente. Seu olhar era mais maduro, suas feições mais delineadas, mas ela ainda era exatamente a mulher de 23 anos que eu me apaixonei. Seu sorriso ainda era gentil, sua expressão ainda era paciente e ela ainda conseguia fazer todo o meu corpo pulsar.

Como podia ser que ela ainda me fizesse sentir tudo isso e me olhar desse jeito, me tratar dessa forma e não sentir o mesmo?

"Por quê?" perguntei o que mais me atordoava durante todos esses anos. "Por quê você deixou de me amar?" falei sem pensar, fechando meus olhos e levando minhas mãos até o meu rosto, sentindo as lágrimas se formarem.

Não era assim que eu queria começar aquela conversa, mas acho que todos os sentimentos acumulados extravasaram ao mesmo tempo. Senti seus braços ao meu redor, me puxando para de encontro ao seu corpo. Deixei me envolver pelo seu conforto, numa desesperada tentativa de sentir menos. Como se isso fosse possível em sua presença.

Freen me cobriu em seu abraço e puxou minha cabeça gentilmente para meu rosto encaixar no seu pescoço, enquanto acariciava meus cabelos em conforto.

Seu cheiro doce, tão perto, tão forte e intenso me fez chorar um pouco mais forte, enquanto eu agarrei o pano de sua camisa com meus punhos fechados. Freen me apertou ainda mais em seus braços e beijou o topo da minha cabeça antes de falar as únicas palavras que eu não esperava ouvir:

"Eu nunca deixei de te amar, Becky."

E como isso era possível?

Me afastei abruptamente do seu toque para lhe encarar nos olhos.

"Não diga isso. Você terminou comigo do nada um dia qualquer, apenas terminou comigo. Como pode dizer que nunca deixou de me amar?" falei com raiva, entre as lágrimas que ainda insistiam em cair.

"Você sabe o porquê, Becky," ela disse tentando se reaproximar de mim e tomar minhas mãos nas suas, mas eu não deixei, me levantando e passando minha mão direita no meu rosto, tentando limpar algumas lágrimas.

"Do que você está falando, Freen? Você não vê o meu estado? Eu passei anos assim, chorando por você. Questionando cada palavra, atitude, gesto que eu usei que fez você deixar de me amar. Passei anos preferindo a dúvida porque saber a verdade me quebraria, mas agora eu sei que fiz errado. Eu preciso saber a verdade," falei deixando meus braços caírem ao meu lado.

Freen me olhava com os olhos cerrados e a testa franzida em confusão.

"Eu lhe expliquei na carta," ela disse tão baixo que eu quase não escutei.

"O que?" perguntei mesmo tendo ouvido. Mais porque não entendi o que ela quis dizer com aquilo.

"Eu lhe expliquei tudo na carta, Becky," ela disse se levantando do banco também e ficando diretamente na minha frente. "Você disse que tinha entendido, não lembra? Aquele dia no nosso último evento juntas? Eu perguntei se você tinha recebido o que eu havia mandado, você disse que sim. Eu perguntei se você me entendia e voce disse que sim. Você disse que sim e..." ela parou, com a voz embargada, olhando para o chão por alguns segundos antes de voltar o seu olhar ao meu. "Você disse que sim e depois sumiu da minha vida."

Notas da autora:

Eita lasqueira lkkkkkk

A partir do próximo veremos, finalmente, o PoV da Freen. Prontas?

Eu não sei se estou.

Espero que gostem e até o próximo!

People ChangeOnde histórias criam vida. Descubra agora