CAPÍTULO 19
A ponte aérea de Nova York para Paris é um dos trechos mais cobiçados pelos profissionais da aviação. E finalmente havia chegado a minha vez. Era meu primeiro voo para a França e eu fui designado como piloto de alívio. Isso quer dizer que nas primeiras horas do voo eu estaria na área de descanso, até que chegasse a vez de um dos outros pilotos fazer seu intervalo.
Naquele avião específico, a instalação de descanso da tripulação era um assento reclinável de primeira classe com uma cortina blecaute ao redor, para ajudar a escurecer o espaço. Não era à prova de som, não era exatamente à prova de luz, e geralmente éramos atingidos por carrinhos de comissários, passageiros transeuntes e pessoas nos chutando do assento de trás. Nossos "cochilos" geralmente podiam durar noventa minutos no voo para o leste e pouco mais de duas horas no voo de volta. Algumas pessoas conseguiam dormir o tempo todo, e outras não. Normalmente, eu dormia cerca de uma hora, pegava um café para acordar e voltava para a cabine de comando.
Como piloto de revezamento, substituí o capitão, que fez a segunda pausa, e o primeiro oficial que fez a terceira pausa. Durante esse tempo, assumi as funções associadas. O comandante foi designado para voar aquele trecho, então, quando substituí o capitão, eu estava encarregado de pilotar a aeronave, bem como a autoridade das funções de voo. Se algo importante acontecesse, porém, interromperíamos o descanso do capitão e retomaríamos uma tripulação de três pessoas para resolver o problema. Ao atingirmos a costa no noroeste da França, acordamos o outro primeiro oficial.
O voo terminou, e nós passamos pela imigração e alfândega no aeroporto de Paris-Charles de Gaulle. Fomos de van até o hotel, onde eu apenas tirei mais um breve cochilo antes de me encontrar com Rebecca.
Ela foi me buscar no hotel, dirigindo seu bonito Tesla vermelho cereja.
- É claro que você dirige um carro elétrico - ironizei ao colocar o cinto de segurança. - É a sua cara.
- Engraçadinho. Você é quem menos pode zombar das escolhas de carros dos outros. Quando te conheci você dirigia um Muscle Car.
- Ei! Era um esportivo clássico e você sabe.
- Era uma lata velha - caçoou.
Nós dois rimos. Eu não podia discordar.
- É bom te ver de novo, irmã - falei, mudando o tom da conversa. - Senti saudades.
- Bienvenue à Paris, maninho - respondeu.
Logo saiu dirigindo. Não queria perder nem um segundo daquele ensolarado dia de verão em Paris.
No meio do caminho, notei que tinha esquecido meu celular no hotel, mas que mal isso poderia fazer? Eu estava de folga e queria aproveitar o pouco tempo livre que tinha com minha irmã, a quem eu não via há muito tempo.
Ela queria me mostrar a Paris que os turistas não conhecem. Nossa primeira parada foi a ilha de St. Louis. Se trata de uma charmosa ilha fluvial, que repousa no leito do Rio Sena. Parecia até mesmo outra cidade. A pequena ilha é entrecortada por ruelas e permeada de inúmeros bares, restaurantes, sorveterias e lojinhas.
- Este local, que não passava de um pântano no século XV, passou a ser, na década de 20, o ponto predileto da chamada "Geração Perdida" - Rebecca explicou, como uma orgulhosa guia turística. - Essa turminha da vanguarda europeia era formada por artistas e escritores, como Ernest Hemingway, Gertrude Stein, James Joyce e T. S. Eliot...
- Legal - comentei, sem saber o que mais dizer.
Sugeri que visitássemos a ilha vizinha, onde está localizada a histórica Catedral Notre Dame, mas ela tinha uma ideia melhor. Em vez disso, fomos perambular pelas ruelas do bairro boêmio de Montmartre.
A parte mais interessante do passeio foi a área alta do bairro, próximo à belíssima igreja Sacré Coeur, posto que esta permaneceu um pouco mais alheia à modernização da cidade. Caminhar pelas ruelas dali parecia uma viagem no tempo.
Na praça dos artistas, nos deparamos com um punhado de pintores, com cavalete, papel e aquarela nas mãos, que, antes de mais nada, se ofereciam para pintar um retrato nosso.
Por fim, fomos ao pitoresco bairro Montparnasse, onde ela me convenceu a subir a não-tão-famosa Torre Montparnasse, com seus quase 60 andares.
- É infinitamente mais vantajoso subir esta torre, do que subir a Torre Eiffel - ela argumentava quando chegamos ao topo. - Primeiramente, porque nesta não há filas quilométricas e, em segundo, porque desta, você tem uma vista privilegiada daquela - ela apontou para frente e eu olhei, maravilhado, para o horizonte, onde se podia ver praticamente toda a cidade, especialmente a imponente Torre Eiffel, iluminada ao fundo, diante de um pôr do sol de tirar o fôlego.
- Tudo bem. Nisso você tem razão - concordei, porque ela tinha mesmo.
- E aí, você ainda acha que Paris é superestimada?
- Talvez. Mas confesso que qualquer cidade fica melhor com você nela, maninha.
Ela fez uma careta e me deu um soco no ombro.
- Você é muito piegas. Vem, vamos descer. Ainda tem mais um lugar que quero te mostrar.
Mal tive tempo de apreciar a vista e nós já estávamos indo embora.
Ela me levou para conhecer sua pâtisserie que ficava naquele mesmo bairro.
- Bem vindo à Le Doux Bonheur.
Era um estabelecimento relativamente pequeno, porém aconchegante. Exalava um delicioso aroma de massa amanteigada e chocolate. As vitrines eram de encher os olhos, repletas de diversos doces de aparência tão apetitosa que chegava a dar água na boca.
Ela permitiu que eu experimentasse a especialidade da casa: a Éclair com Praliné de Avelã Caramelizada.
- Talvez essa seja a melhor coisa que já comi - falei, ainda mastigando.
- Gentileza sua.
- Estou falando sério. Esta aqui é, sem dúvida, a melhor confeitaria de Paris.
- É uma pâtisserie - ela me corrigiu imediatamente.
- E tem diferença?
- Qualquer lojinha de doces pode se intitular confeitaria. Mas as pâtisseries precisam, necessariamente, ser comandadas por um maître pâtissier licenciado.
- Certo. Essa é a melhor pâtisserie de Paris, então -
retifiquei.
- Não chega nem perto disso. Eu não posso competir com Pierre Hermé.
- Pierre quem?
Ela deu uma risada irônica e, em seguida, pôs fim ao assunto.
- Pff! Deixa pra lá.
Antes de voltar para o hotel, ainda pude provar alguns de seus autênticos macarons, profiteroles e um delicioso clafoutis de cereja.
Foi maravilhoso poder rever minha irmã. Ela me deixou de volta no hotel quando já era noite. Me deu de presente um macacãozinho para o bebê. Tinha um desenho da Torre Eiffel estampado na frente, acompanhado da frase "J'aime Paris" (eu amo Paris).
- Não vou deixar meu sobrinho cair na onda do pai de que a Cidade Luz é superestimada - ela justificou. - Essa criança já vai nascer amando Paris.
Minha única reação foi dar risada.
- Obrigado. De verdade. Por tudo. Hoje foi um dia sensacional.
- Sempre que vier a Paris, já sabe onde me encontrar.
Nós nos abraçamos, e eu subi para meu quarto de hotel. Ao chegar lá, notei que meu celular estava descarregado, mas eu estava cansado demais para procurar um carregador. Apenas caí no sono. Um grande erro.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Sob O Pôr Do Sol
RomanceO terceiro livro da série. A conclusão da história de Sammy e Jessie.