Capítulo 23

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CAPÍTULO 23

Acordar sozinho em um quarto de hotel qualquer era uma sensação com a qual eu estava acostumado. Mas acordar sozinho em nossa casa era algo no mínimo inesperado.

Para meu alívio, encontrei Jessie no quartinho do bebê, dormindo em sua poltrona de amamentação, com uma das mãos sobre as grades do berço de Matthew, que dormia tranquilo na companhia de sua mãe. Ao me ouvir entrar no quarto, Jessie abriu os olhos. Ela tinha o sono leve, algo que obteve com o dom da maternidade.

- Você dormiu aqui? - fui logo perguntando.

Ela pressionou os dedos contra as têmporas, suspirou e assentiu com a cabeça, sem dizer qualquer palavra.

- Por quê? - insisti na conversa.

- Porque você estava no quarto.

- E qual o problema?

- Eu não queria mandar você dormir no sofá. Mas também não consegui me deitar ao seu lado.

Aquilo doeu em mim mais do que ela pretendia que doesse. Minha própria mulher não queria se deitar comigo. Eu me senti um lixo.

- Jessie, eu sou seu marido. Por que não quis dormir comigo?

- Porque eu estava com raiva... ainda estou.

- Você está com raiva de mim porque eu preciso trabalhar? Isso não é justo.

- Lá vai você de novo com essa sua tal justiça. Como é justo que eu tenha que criar nosso filho sozinha? Me diz onde está a justiça do nosso filho ter de crescer com um pai ausente? Porque você nunca está aqui. Nem por ele, nem por mim. Você não esteve nem no nascimento do seu filho, nem no aniversário dele. E você certamente não está aqui agora, quando eu mais preciso.

- Eu não posso simplesmente largar meu emprego para estar aqui o tempo todo. Eu tenho que trabalhar. E você sabe disso.

- Não é só sobre o seu emprego. Você não entende.

- Então sobre o que é?

- É sobre o fato de você nunca estar aqui - ela deu um longo suspiro. - Nunca. Mesmo quando você está em casa, você nunca está realmente aqui para nós. Está sempre muito cansado, ou muito ocupado, ou com muito "jet lag", ou dormindo... sempre parece ter algo mais urgente, ou mais importante do que nós na sua lista de prioridades. E isso dói muito.

Seus olhos se encheram de lágrimas, assim como os meus. Nossa acalorada discussão acabou acordando Matthew, que começou a chorar, se revirando no berço. Ela quis pegá-lo, mas eu fui mais rápido. Eu o carreguei no colo e tentei acalmá-lo, mas ele continuava se debatendo e resmungando.

- Você está segurando ele errado - criticou.

- Como assim? Estou carregando ele como se carrega um bebê.

- Ele gosta de ficar virado. Prefere ter a visão livre.

Eu tentei e tentei, mas ele continuava a se revirar e reclamar enquanto eu o carregava. Então Jessie finalmente estendeu os braços e ele foi, feliz da vida, para o colo dela. Quando ele enfim se acalmou, tentei retomar nossa conversa:

- Me desculpe. Você sabe que você e Matthew são a coisa mais importante do mundo para mim. Não quero que pense que existe qualquer outra coisa que importe mais. Porque não existe.

- Eu ouço você dizer isso, mas suas ações falam mais alto. Eu preciso de você, Sammy... e seu filho também precisa de você. Ele sente falta do pai - ela balançava Matthew nos braços enquanto falava -, e eu sinto falta do meu marido. Eu não posso fazer isso sozinha. Não consigo. E já não aguento mais.

- Eu vou melhorar. Eu prometo.

Descobrir que eu nem sequer sabia como segurar meu próprio filho no colo foi um choque de realidade para mim. Esse era um dos meus maiores medos desde o seu nascimento, e agora estava se concretizando: eu não sabia carregar meu filho direito. E essa era apenas uma das muitas falhas que eu estava cometendo na paternidade. Ao me esforçar para me tornar um pai melhor, notei que eu não estava apenas sendo um pai ausente, mas também negligente.

Naquele mesmo dia, tentei trocar as fraldas dele pela primeira vez em muito tempo e precisei da ajuda de Jessie que, pacientemente, me relembrou como fazê-lo. Mais tarde, ao tentar alimentá-lo, descobri que, apesar da pouca idade, Matthew era um garoto de opinião forte, recusando com veemência qualquer coisa que não gostasse. Também descobri que sua mãe já sabia disso e havia inventado inúmeras técnicas mirabolantes para fazer com que ele comesse, mesmo quando eu desistira. Ao me permitir passar mais tempo com meu pequeno, percebi o quanto estava perdendo por não estar mais presente.

Nosso filhote estava crescendo rapidamente, e eu estava perdendo grande parte da alegria de poder participar da criação dele. Matthew estava ficando cada dia mais adorável. Deixou para trás aquela aparência franzina de um recém-nascido prematuro e tornou-se um lindo e saudável garotinho. Seus olhos eram azuis como os de sua mãe, mas sua pele era quase tão escura quanto a minha. Os poucos cabelos que tinha eram castanho-escuros e encaracolados, como os meus, mas ele também tinha sardas no rosto, como as de sua mãe. E tinha o sorriso mais amável do mundo todo.

A partir daquele dia, me comprometi a passar mais tempo de qualidade com minha esposa e nosso filho, mesmo que isso significasse menos horas dormidas. Era perceptível que Jessie estava exausta e sobrecarregada, e a culpa era majoritariamente minha. Me arrependi amargamente. E ela foi extremamente compreensiva, mesmo estando cansada e magoada.

À noite, depois de muita relutância, Matthew adormeceu em meus braços e eu o coloquei em seu berço. Quando disse a Jessie que eu dormiria no sofá, ela sorriu piedosamente e estendeu a mão para mim.

- Vem. Essa cama é tão minha quanto sua. E eu já estou cansada de dormir sozinha.

Aceitei seu convite, sem pestanejar. Me deitei ao lado de minha mulher e me aconcheguei no calor de seu corpo. Naquela noite finalmente fizemos as pazes, e fizemos amor pela primeira vez em semanas.

Quis o destino que nosso amor de reconciliação fosse também de concepção. Algumas semanas mais tarde, descobrimos uma nova gravidez.

Sob O Pôr Do SolOnde histórias criam vida. Descubra agora