Pra Chapa, ainda estava complicado superar. Naquela noite, foi pro quarto do pai. A cama dele era maior e a irmã também os acompanhou.
Se lembraram da época em que elas tinham medo e a cama do pai e da mãe se tornava o refúgio. Ou das várias noites que dormiram naquela cama, depois do falecimento da mãe, ouvindo o choro velado do pai, na madrugada. Um refúgio, que tinha se tornado dor.Aquela casa, tinha tanta história pra contar.
Quando Ray iniciou uma vida com Isabella De Silva, eles não tinham quase nada. Só um pouco de dinheiro pra iniciar um investimento. Ela era recém chegada do Brasil, estava começando na faculdade de administração e ele também. Estavam no mesmo ramo e isso já era um começo.Foi amor à primeira vista. Mas demoraram um pouco pra assumir. Isabella inclusive, chegou a voltar pro Brasil, por três meses. Mas ela usava dos trechos de uma música natural do país, que citava a palavra "Maktub", que significa "estava escrito, tinha que acontecer". Ray nunca tinha esquecido das palavras dela antes de embarcar "Vida longa, mundo pequeno. A gente ainda vai se encontrar." Também era da música.
Bella estava certa. Conseguiu uma bolsa três meses depois e retornou a Denver, onde Ray morava e ela antes estudava. Se reencontraram. Iniciaram um namoro.
E eles não demoraram muito a dar vida ao sonho que não era só de um ou do outro. Com dezoito anos: namoro e o início da empresa, além da faculdade. Com vinte e um, Bella e Ray se casar. Quando ambos tinham vinte quatro, Samanta nasceu. Vinte e cinco e então, a pequena Elena.
Era incrível dividir os mesmos sonhos com quem se ama.Entre sete e oito anos depois, voltando de uma viagem de negócios de três dias, Bella perdeu o controle do carro, capotou e acabou falecendo.
Deixou pra trás, um marido, duas filhas, uma empresa, uma vida inteirinha pela frente.Ray, que já não tinha mais o pai que o criou, ainda teve que travar uma luta na justiça com a sogra, que fez de tudo pra tirar suas pequenas. Ele não deixou, lutou o quanto pode, elas eram tudo que ele tinha.
Hoje em dia, a avó nem mesmo ligava.
Ray já lidava com os traumas de um pai tóxico na infância, agora ainda tudo isso, uma encourara de problemas e tristezas.Nos primeiros meses de luto, era naquela cama, naquele quarto, onde tinha um grande quadro com a foto de Isabella, que os três dormiam. Acalentando a dor um do outro. Lidando com o luto como podiam.
Samanta, teve que amadurecer cedo demais. Ajudava o pai com a irmã. Deixou grande parte da infância de lado. Mas ainda assim, não se deixou levar pela tristeza, tinha o coração da mãe, o gênio doce e amável. Era uma garota feliz, procurava ver o lado bom das coisas. Quando precisava também, era muito rígida e brava.
Já Chapa, não entendia muito bem na época e isso só a fazia sofrer ainda mais. Olhar pra cozinha e não achar a mãe cozinhando, não ter o beijo de boa noite da sua grande heroína, ver o seu pai chorando, olhando pra foto de sua mãe. Lidar com a saudade excessiva.
Toda a casa tinha lembranças de Isabella. Foi o primeiro bem material conquistado pelos Manchester de Silva. Queriam uma casa grande, com quintal, com vários quartos, por conta das crianças.
Isabella dizia que queria ter pelo menos mais dois meninos. Ela tinha muitos, muitos sonhos.Os sonhos de uma mulher incrível, ceifados de uma forma tão dura, dolorosa.
Era tudo isso que passava na cabeça de Ray, naquele momento, meio de madrugada, com as duas filhas deitadas no quarto dele e da falecida esposa. Olhou pro quadro de Isabella, suspirando. Se levantou pra ir buscar um copo de água e ficou parado na cozinha, ainda perdido nos pensamentos.
Sam: Papai? - Franziu o cenho. A cara de sono, os pés no chão, a calça ultrapassando os pés. Conseguiu visualizar a mesma garota aos dez anos, parado na porta. Percebeu que tinha devido a mais de meia hora.
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Oneshots Bapa - Bose e Chapa
RomanceCompilados de Oneshot Bapa - pequenas histórias de Bose e Chapa da Força Danger.