Já se passavam das 07h00 horas da manhã, eu entrava no elevador um pouco tenso, o olhar vagando de um lugar a outro, sentindo-se fora de contexto. Esse era o meu primeiro dia na empresa e por mais que fosse uma empresa da família, odiava o fato de ter que olhar para a cara do meu "pai" todos os dias, teria que me adaptar a um desgosto rotineiro. Adorava minha vida em São Paulo, tinha um bom emprego, uma rotina e amigos bacanas, cercado por lugares, festas e garotas que me satisfaziam.
Porém, depois que minha mãe quase implorou para que eu voltasse para BH e assumisse um cargo na empresa do meu pai, concedi e fiz sua vontade, não por ele ou pela empresa, mas por consideração a ela.
Minha infância tinha sido bastante conturbada, onde ainda carrego muitas questões e dilemas e para ser mais específico "traumas". Assim que completei meus 18 anos fui embora de casa, sem olhar para trás e sem carregar a menor culpa possível. Construí minha vida em São Paulo e era muito feliz apesar de tudo. Contudo, sentia falta da minha mãe, mesmo sabendo que ela continuava sua vida ao lado daquela pessoa rude que se dizia ser meu pai, mas que nunca seria capaz de desenvolver nenhum sentimento paterno pelo filho.FLASH BACK ON:
18 anos antes...- É a última vez na minha vida que eu vou presenciar isso - Alexandre juntava seus pertences em uma mala.
- Filho, pelo amor de Deus, não faz isso, ele prometeu que nunca mais encosta a mão em mim - a mãe de Alexandre falava em meio a lágrimas que escorriam pelo rosto machucado, tentando desesperadamente fazer o filho ficar ao seu lado.
- MÃE! É sempre a última vez, é sempre porque ele está com raiva, ele sempre se arrepende, pede desculpas e diz que é a última vez. Ele é um covarde, desgraçado. Até quando a senhora vai aguentar isso, até ele tirar sua vida? Você espera mesmo que eu fiquei aqui e presencie ele acabar com sua saúde física e emocional dia após dia? Se eu ficar aqui, eu juro, eu o mato com minhas próprias mãos - a mãe continuava aos prantos chorando pela partida do filho.
Em um ato desesperado, Alexandre segura os ombros da mãe, da mulher que o criou, cuidou, ensinou seus valores morais, éticos, educou, mas que não tinha forças para abandonar a pessoa que sugava sua vivacidade - Mãe... - ele começou - Vem embora comigo, eu cuido da senhora, eu tento trabalhar e colocar menos cadeiras no curso, nós dois iremos vencer juntos, eu não vou permitir que nada lhe falte ou lhe machuque, vamos mãe! - ele disse acariciando o rosto da mais velha.
- Filho... - ela respondeu quase de forma inaudível. Nesse momento Alexandre entendeu tudo, ela nunca o deixaria, iria passar o resto da vida em sofrimento ao lado "dele". Naquele momento ele sabia que apesar de já não acreditar que pudesse existir amor entre um homem e uma mulher, a relação materna que havia construído... agora estava quebrada. Já não sabia o que era amor, vagava no limbo em desacreditar que tal sentimento latente e avassalador existe dentro de qualquer ser humano.Alexandre deixava para trás as duas metades que o formaram, os DNAs que se combinaram através das células que ele carregaria pelo resto de sua vida. Em uma metade, havia a mulher que o amava, que lhe dedicara todo seu tempo para cuidá-lo, mas que exalava insegurança, medo, fragilidade, submissão, invalidez. A outra metade, alguém que não sentia nada menos que ódio, aquele que ele conhecia pelo olhar possessivo, violento, brutal. Essas pessoas seriam os fantasmas que assolavam suas noites de insônia, seus demônios internos que não parariam de sussurrar em seu ouvido.
Saiu da casa dos pais e foi morar em São Paulo, na terra da garoa começou a Faculdade de Arquitetura, suas habilidades com desenhos o ajudaram a concluir o curso de forma prodigiosa. Morou boa parte desse tempo com o padrinho, Dante, quando arrumou seu primeiro estágio em uma empresa não muito grande, alugou um apartamento pequeno. Depois de certo período, alcançou crescimento na vida profissional, sendo contratado por uma das maiores empresas de arquitetura de São Paulo e se tornou um dos arquitetos mais conhecidos do país, com projetos como o "Condomínio Edifício Itália", o arranha-céu que lhe proporcionou prêmios, considerado o segundo edifício mais alto de São Paulo e um dos maiores do país, chegando a 146 metros e indo até o seu 46° andar.

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soulmate | GN
Hayran KurguQuando um simples desafio entre amigas muda completamente a vida de Giovanna.