Mal conseguimos jantar direito por causa do cansaço. Ele me acomodou na cama dele, ajeitando meu pulso, colocando a bolsa de gelo em cima.
Não consegui sustentar meus olhos abertos por mais tempo e adormeci.
Agora, eram exatamente 01h32 da manhã, horário da noite que meu sono geralmente dava lugar a insônia. Apesar de estar cansada, estar ali... Naquela casa... Naquela cama... Debaixo do mesmo teto que aquele homem... Me fazia sentir se ansiosa.
Eu me lembrava vagamente dele ter levado um travesseiro e ter falado algo sobre sofá. Aos poucos meus olhos e ouvidos foram se acostumando ao ambiente. Conseguia escutar um som baixo vindo de algum lugar da casa.
Me levantei em silêncio e sai seguindo pelo corredor, parei no batente de uma porta, ali deveria ser seu escritório.
Ele estava sentado de costas para a porta, diante se uma mesa de desenho, com uma luz iluminando diretamente em cima de algo que ele desenhava.
Em algum lugar daquele ambiente havia uma caixinha de som tocando Caetano Veloso:
"Fonte de mel Nos olhos de gueixa Kabuki, máscara (Você é linda)"
Quando meus olhos se acostumaram com a escuridão, passei a observar suas costas.
O apartamento estava frio, ele vestia a camiseta do pijama, mas ainda assim eu conseguia ver o movimento que seus músculos das costas faziam quando ele impunha forca no braço para pintar algo que eu não conseguia ver de longe, por causa da miopia.
Soltei um suspiro e fiquei com medo de entrar naquele ambiente.
Parecia tão sagrado. Tão dele, tão ele...
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Como alguém que percebe a presença de algo, ele olha de relance.
Quando olha e me vê, levanta rápido, vindo em minha direção.
- Aconteceu alguma coisa? Tá sentindo dor? - Ele olha para meu pulso e eu o levanto, mostrando que está bem melhor.
- Não, está tudo bem.
- Insônia? - Eu assinto. - Insônia? - Eu também pergunto. Ele confirma.
Ele pega a caixinha de som e o celular no escritório e me guia até a cozinha.
- Vamos tomar um chá quente, estava desenhando, dizem que as telas...
- Pioram a insônia. Também não as uso quando acordo de madrugada. Mas não sei desenhar nem um coração direito. - Digo e ele dá uma risada.
Me sento no balcão enquanto ele se movimenta pela cozinha. Percebo que a música de Caetano está no modo repeat:
"Linda E sabe viver Você me faz feliz (Você é linda)"
