CAPÍTULO 5

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Kian

Não parei de pensar na garota de suéter vermelho em nenhum momento durante a volta para o meu apartamento. Dirigi lentamente, dando risadas curtas ao pensar nas expressões da garota, e senti novamente aquele arrepio ao lembrar dos olhos azuis-prateados dela que, agora em minha memória, parecia até brilhar de tão lindos.
Ao entrar no minúsculo apartamento, fui recebido pelo silêncio costumeiro, grato por ocupar o último andar e não ter que lidar com vizinhos sapateando sobre minha cabeça. Ainda assim, aquele prédio velho tinha paredes finas e conseguia ouvir malmente uma briga de casal, uma TV alta ligada em um canal culinário e, talvez, um casal transando nos andares abaixo.
Em um movimento fluido e carregado de tédio, alcancei uma garrafa de tequila lacrada em um dos armários, retirando o lacre da tampa enquanto atravessava o cômodo até a poltrona em frente à janela. Não cheguei a me sentar, pois batidas suaves na porta da frente me fizeram parar no meio do ato.
Coloquei a garrafa sobre a mesa ao lado da poltrona e caminhei até a porta da frente, sem me incomodar em olhar através do olho mágico para ver quem esperava do outro lado. Para alguém como eu, não havia nada o que temer. Ainda assim, fui pego de surpresa quando um desconhecido me atingiu no queixo com um gancho de direita, fazendo com que eu caísse de costas no chão.
Filho da puta, xinguei em pensamento, e gargalhei em voz alta enquanto me levantava, sentindo o gosto de sangue na língua.
— Grande Kian! — disse o homem que fechava a porta com o próprio corpo.
Passei a língua no lábio inferior e encarei o homem, sem conseguir conter a risada ao reconhecê-lo.
— Devon — cumprimentei — Vejo que a última surra não te ensinou nada.
— Acha que vai ficar por aquilo mesmo? — Devon retrucou em um tom mais brusco e irritado, entrando no apartamento de punhos cerrados.
Eu havia surrado Devon e sua gangue meses atrás. Até matei um deles. Estava bebendo com Nathan tranquilamente quando eles e os amigos chegaram para fazer confusão. Tentei ser educado e dei apenas um soco, mas eles quiseram mais. Então um morreu e os outros ficaram gravemente feridos. Agora, é claro, ele quer vingança.
— Você veio sozinho. — Olhei por cima do ombro dele antes de o encarar — Diria que é coragem, mas suícidio soa melhor.
Devon não falou nada, apenas avançou na minha direção e acertou novamente meu rosto. Dessa vez, eu apenas cambaleei, rindo secamente, sem humor, apenas para provocar meu oponente.
— Poderia te oferecer um pouco de leite para fortalecer os ossos, mas não tenho nenhum — olhei para o homem, dando um sorriso de canto de boca — Bom, pelo menos, não de garrafa.
— Eu vou matar você!! — Devon avançou mais uma vez, porém, quando ergueu o punho, eu o segurei, impedindo o soco a centímetros do meu rosto.
— É minha vez — Usei a mão livre para agarrar Devon pelo pescoço e o erguer do chão.
O homem agarrou meu braço em uma tentativa inútil de se desvencilhar. O joguei contra a parede próximo da porta e não esperei que o Devon se recuperasse antes de o atingir no rosto tantas vezes que os nós de meus dedos abriram e começaram a sangrar. Quando Devon já estava com o rosto irreconhecível e tonto demais, eu o puxei pelo pescoço mais uma vez e o lancei escada abaixo para um alguém qualquer o recolher dali.
Com um suspiro pesado, fechei a porta violentamente e entrei no banheiro para checar os estragos. Os punhos estavam sangrando e o lábio inferior cortado. Toquei o corte no lábio com o polegar e sorri. Acho que estou mais sexy…
Bufei com tédio e lavei o rosto com água, e limpei as mãos com álcool, trincando os dentes ao notar que as feridas estavam demorando para cicatrizar. Não era novidade e nem surpresa.
Minha aura estava fraca, e eu precisava recarregar as energias. Nada acontecia se não o fizesse, claro, mas gostava de estar mais forte - para se curar e para sentir algo a mais além daquele vazio eterno. Transar com humanos e ter uma troca de energia era eficaz, mas não durava muito. E, na noite anterior, não ousei me alimentar da essência da garota pois ela não tinha uma energia muito boa. Como se a minha fosse espetacular.
Enfaixei os punhos e caminhei mais uma vez para minha poltrona, me sentando nela ao abrir a garrafa de tequila e beber direto do gargalo enquanto olhava para o céu noturno, disposto a passar as próximas horas ali.

Um Doce Sacrilégio | Corações Infernais | Livro umOnde histórias criam vida. Descubra agora