XVII. Alarme falso.

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Não conseguia se recordar a última vez em que teve uma manhã repleta de cuidados e amor após uma noite de bebedeira, normalmente precisava buscar os próprios remédios para aliviar a indisposição que a irritava, dispensava tomar café da manhã por não ter ânimo o bastante para preparar algo antes de ir trabalhar e o que mais a deixava angustiada era o silêncio ensurdecedor recaído por todo seu apartamento.

Mas na cobertura de Soraya era completamente o oposto sem grandes esforços, como costumava ser no apartamento de Marta e Rodrigo, ou na casa que um dia fora sua e da loira.

Respirou fundo o aroma da mulher impregnado pelo lençol e travesseiros, até parecendo que ela estava ali ao seu lado, mas o jeito com que a brisa fresca batia em cheio contra seu corpo era o sinal da realidade: estava sozinha, exatamente como vem sendo há anos. Abriu os olhos com certa dificuldade, desejando poder se esconder naquela cama por mais algumas horas, ou quem sabe dias. O cheiro gostoso vindo da cozinha foi o motivo para ter se levantado após uma luta interna, seu estômago implorando para que dessa vez não dispensasse comer alguma coisa antes de ir para o trabalho.

Não trocou as roupas que usava de Lilian, se sentia confortável nelas, então caminhou até o banheiro de Soraya só para lavar seu rosto e dar um jeito nos fios bagunçados, que lhe arrancaram uma risada rouca. Repousou o olhar pelo balcão da pia e em todos os produtos que a loira sempre gostou de usar, quando eram casadas uma das coisas que se tornava a terapia para a mulher era poder arrumar todos eles em uma ordem perfeita, mesmo que no dia seguinte acabassem desorganizados novamente. Ela se empenhava naquela tarefa e nunca interrompeu seu momento, era como um aviso de que precisava de alguns minutos sozinha, organizar balcões e armários era o seu jeito de tentar fazer o mesmo com sua mente. E aparentemente aquilo continuava um costume da mulher.

Conseguiu ouvir uma risada alta em um dos quartos do outro lado do corredor e em segundos reconheceu ser Cecília, o que fez surgir um sorriso suave em seus lábios. Nunca pôde imaginar ser capaz de amar tanto alguém em tão pouco tempo, era um sentimento genuíno, terno, que só a fazia desejar proteger a mais nova de qualquer coisa, do jeito que queria ter sido capaz de fazer em todos os anos que perdeu da vida da garota.

Deixou o quarto de Thronicke assim que arrumou a cama do mesmo jeito que a mulher gostava e caminhou para fora do quarto a passos curtos enquanto tentava juntar forças necessárias para dar início ao seu dia. Assim que abriu a porta encontrou Lilian e Cecília saindo do quarto da mais nova, se sentiu bem melhor assim que seu corpo foi envolvido pelos braços da filha, tinha certeza que um de seus dons era renovar suas energias e tornar melhor qualquer coisa que estivesse ao seu redor.

— Bom dia, mãe.

— Bom dia, pequena — tentou transparecer um pouco de felicidade ou bom humor, o que não era fácil quando sua cabeça parecia estar prestes a explodir. Recebeu de bom grado o beijo em sua bochecha e retribuiu o sorriso suave que Lilian lhe destinou após comentar sobre suas roupas, tinha certeza que ela tiraria uma foto assim que acabasse se entretendo com algo antes de ir embora.

Andou na direção da cozinha quando se separou da mais nova, jurando que as duas a seguiam logo atrás, mas deixou de prestar atenção nisso ao fitar Soraya andando até ela. A mulher usava um de seus costumeiros vestidos longos, amava todas as peças que constituíam o closet da ex-esposa, cada peça falava por si só sobre os gostos que ela tinha, mas seus favoritos sempre seriam aqueles vestidos. Eles ornavam perfeitamente com Thronicke, a deixavam mais leve, ela ficava ainda mais apaixonante — se isso sequer fosse possível de acontecer.

— Bom dia, Simone. Como está se sentindo? — o tom de voz doce e calmo que ela tinha era completamente diferente do que recebeu na primeira vez que a encontrou depois do divórcio. Nada comparado com palavras ríspidas, comportamento auto defensivo para tentar mantê-la o mais longe possível.

De repente mãe • Simone & SorayaOnde histórias criam vida. Descubra agora