XXIII. Você sempre me teve.

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Fazia bons anos que não acordava em meio a um silêncio gostoso, tendo o canto dos passarinhos e relinchar dos cavalos como único som que conseguia chegar até os ouvidos das pessoas que estavam na casa. O relógio marcava oito horas da manhã e tinha certeza que praticamente toda a família já estava acordada, mas não tinha coragem de ser a primeira pessoa a sair daquele quarto com Maya ao seu lado. Gostava de ter a chance de poder estar só ao seu lado por mais alguns minutos, mesmo que a loirinha ainda dormisse tranquilamente encolhida no lado da cama que escolheu tomar como seu desde a primeira noite que dormiram juntas.

Já tinha tomado banho e escolhido a roupa mais fresca que tinha colocado em sua mala, mas continuava em um silêncio absoluto para não interromper o sono de Caccini, que parecia estar exausta demais nos dois últimos dias. Pegou seu celular para ver as fotos que havia tirado no dia anterior, a maioria delas sendo de momentos que as pessoas estavam distraídas o bastante para não notar sua presença, o que, na sua opinião, só tornava todas as memórias mais espontâneas e especiais.

Aproveitou que a amiga não tinha se mexido em momento algum nos últimos minutos e que alguns raios de Sol adentravam as brechas da cortina, iluminando minimamente o rosto da garota. Normalmente já achava que Caccini tinha um brilho próprio, como se uma junção perfeita dos melhores sentimentos criasse vida, se materializando na sua frente. Mas nunca tinha a observado com atenção enquanto dormia, talvez porque quando ela acabava dormindo em sua casa já precisavam acordar com rapidez para não perderem tempo e conseguirem acompanhar a rotina de Soraya e Lilian, que dividiam a responsabilidade de levá-las até a escola em certos dias.

Mas, agora que parecia ter todo o tempo do mundo, um sorriso suave brincou em seus lábios ao ver Maya com o cenho levemente franzido e abraçada a um dos travesseiros que não usaram, uma de suas pernas esticada enquanto a outra estava dobrada, era como se ela nem devesse estar em um mundo como aquele. Mirou o celular em sua direção e assim que encontrou o ângulo perfeito, tirou umas três fotos por pura precaução, já que sabia que a primeira já tinha saído linda.

— Você não dorme, Bambina? — as palavras ecoaram pelo quarto em um tom de voz sonolento alguns minutos mais tarde, causando um sobressalto na garota. Desviou o olhar de suas redes sociais e fitou o corpo da loira, mas não encontrou as íris verdes, ainda escondidas pelas pálpebras fechadas.

— Me desculpa, não queria te acordar — respondeu no mesmo tom baixo e carinhoso, descansando as costas na cabeceira.

— Está tudo bem, você não fez nada que pudesse me despertar, só senti que não estava mais deitada ao meu lado — abriu apenas um dos olhos e rapidamente encontrou o castanho escuro com toda a atenção voltada para si, lhe causando uma breve timidez — Fiquei preocupada.

— Não precisa, só acho que me acostumei com um horário e nem toda a exaustão do mundo está conseguindo me manter mais tempo deitada na cama — deu de ombros, encolhendo as próprias pernas e as abraçando, descansando o queixo em seu joelho. Maya analisou sua expressão em busca de um sinal que demonstrasse estar sentindo, mas quando não o encontrou, deu um meio sorriso carregado de ternura.

— Confio em você. Bom, já vejo que você está toda arrumada e não quero te fazer perder tempo nesse quarto, então vou ir tomar um banho logo — por mais que sentisse seu corpo implorando por mais alguns minutos naquela posição, sem a necessidade de enfrentar qualquer coisa que estivesse fora daquele quarto, o fez sem pensar duas vezes por saber que deixaria a outra feliz. Se sentou na cama em um só movimento e lançou um sorriso preguiçoso para a mais nova antes de andar até o banheiro em passos um pouco arrastados, arrancando uma risada nasal de Cecília.

Voltou a se distrair em seu celular enquanto esperava a loira ficar pronta, mas a verdade era que sua mente estava longe dali. Estava tentando ao máximo manter todos seus sentimentos para si e acreditar nos próprios pensamentos quando repetia diversas vezes que estava bem, mesmo com o misto de acontecimentos que aconteceram nos dois últimos dias. Mas agora parecia que estava a um triz de transbordar, de se deixar ser frágil, mas não desejava que isso acontecesse quando estivesse ao redor da família.

De repente mãe • Simone & SorayaOnde histórias criam vida. Descubra agora