De repente mãe • Simone & Soraya

XXI. Destinadas.

Respirou fundo o aroma floral tão próximo de seu nariz, bem mais evidente do que nas últimas semanas por não ter se afastado do corpo da mulher nem por um segundo naquela noite, também tinha certeza que o perfume estava impregnado em sua roupa e desejou poder ficar com elas por tempo indeterminado, sentindo a calmaria que aquele cheiro lhe causava.

Simone, depois de horas se remexendo sem parar, dormia tranquilamente em seus braços, mas sua mão continuava firme contra a sua, quase como em uma tentativa de evitar a possível chance de tentar sair dali, o que fez surgir um pequeno sorriso nos lábios da loira. O silêncio recaído por aquela fazenda só a relembrou o motivo de amar estar naquele lugar, era uma paz sem igual, não existiam palavras o bastante para descrever o misto de emoções que acabava sentindo. O canto dos passarinhos sendo o único som que conseguiam ouvir no início da manhã era um vivo sinal de que tinham deixado para trás a agitação da capital e entrado em um mundo que costumava ser só delas e das pessoas que amavam, um mundo onde problemas pareciam não chegar, mas agora era diferente.

Não abriu os olhos mesmo já despertada, sair daquele enlace era uma incerteza sobre quando e se o teria novamente em algum momento, mas seu estômago implorava para que comesse alguma coisa depois de tantas horas sem se alimentar. Então, a contragosto, se afastou lentamente do corpo da mais velha e torceu mentalmente para que ela não acabasse acordando, suspirando aliviada quando isso não aconteceu. Andou para fora do quarto a passos baixos, mas só depois de cobrir cuidadosamente o corpo da ex-esposa e garantir que ela estava bem, a casa estava absurdamente silenciosa, diferente do que costumava acontecer na maioria dos dias de anos atrás.

O cheiro gostoso do café da manhã feito por Irene não preenchia nenhum cômodo, causando um estranhamento na loira, que aos poucos percebeu estar sozinha na residência. Se perguntou onde Eduarda e Cecília poderiam estar, mas acabou constatando que elas provavelmente tinham ido fazer um passeio pela fazenda. Andou até uma das grandes janelas da sala principal, tendo uma ampla visão dos principais pontos da propriedade, assim como dos bichos soltos pelo pátio.

Franziu o cenho ao ver uma caminhonete estacionada embaixo de uma das árvores, mas não havia sinal de ninguém diferente, então cogitou ser de algum veterinário que fazia visitas semanais para os cavalos, deixando de lado o veículo. Caminhou até a cozinha com a esperança de ter alguma coisa pronta, por mais simples que fosse, mas ela estava vazia como todo o restante da casa, arrancando um suspiro frustrado da loira. E, por uma fração de segundos, surgiu uma súbita vontade e certa coragem para tentar se arriscar no preparo do café, mas se tentasse o fazer com o conhecimento de receitas que tinha em sua mente, o máximo que sairia seria uma fatia de pão com geléia e ainda corria o risco de errar em alguma coisa.

Levou uma das mãos até o bolso traseiro de sua calça e recorreu à única pessoa que tinha visto o celular recentemente, já que Lilian parecia ter desaparecido do mapa, aumentando a preocupação dentro de seu peito. Clicou no botão para iniciar uma ligação com Marta, não levando mais do que três toques para a mais velha atendê-la com um tom de voz amoroso:

— Bom dia, meu amor! Aconteceu alguma coisa?

— Bom dia, mãe — não tinha a mesma animação da mulher, mas suas palavras carregaram uma quantidade similar de carinho sem nenhum esforço — Não aconteceu nada demais, eu só preciso da sua ajuda em algo.

— Você tem a minha atenção, querida — conseguia ouvir o barulho das teclas do notebook de Marta cessaram, confirmando que nada mais poderia fazê-la dividir a atenção com a filha, não se importando se fosse a coisa mais séria ou importante do mundo, Soraya e Lilian sempre seriam sua prioridade.

— Será que pode me mandar a receita do bolo da vovó e me falar como não queimar os ovos mexidos? — se recostou em um dos balcões, as pontas de seus dedos brincando com o pingente de Sol.