Insurgente

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Tris

Ao alcançarmos a cidade, todos na caminhonete param de conversar e contraem os lábios, com o rosto pálido. Marcus desvia de buracos no asfalto do tamanho de pessoas e pedaços de ônibus quebrados. O trajeto fica mais fácil quando deixamos o território dos sem-facção e entramos na parte mais limpa da cidade.

De repente, ouço tiros. Dessa distância, eles soam como estalos.

Por um segundo, fico desorientada, e tudo o que consigo ver são os líderes da Abnegação de joelhos sobre a calçada e os membros da Audácia com o rosto inexpressivo e armas nas mãos; tudo o que consigo ver é minha mãe virando-se para receber os tiros e Will desabando no chão. Mordo meu punho para não soltar um grito, e a dor me traz de volta ao presente.

Abandonando o comboio de caminhonetes, Marcus vira na avenida Madison e, quando estamos a apenas duas quadras da avenida Michigan, onde a batalha está sendo travada, ele entra em um beco e desliga o motor.

Fernando pula para fora da carroceria e me oferece a mão.

— Vamos, Insurgente — diz ele, piscando.

— O quê? — pergunto. Seguro seu braço e deslizo para fora da caminhonete.

Ele abre a bolsa sobre a qual estava sentado. Está cheia de roupas azuis. Ele as vasculha, jogando peças para mim, Rebecca e para Christina. Fico com uma camiseta azul e uma calça jeans.

— Insurgente. Substantivo. Uma pessoa que age em oposição à autoridade estabelecida, mas que não é necessariamente considerada agressiva.

Ignoro o questionamento de Christina sobre o garoto dar nome à tudo e observo Rebecca... Ela anda distante desde que voltou da Erudição, não acho estranho, porque sei que deve ter passado por coisas terríveis... Também não fiquei impressionada quando me contou sobre Marcus e que ela estava pensando em seguir o plano dele, afinal, Rebecca é totalmente capaz de fazer o que for para interesse próprio, até mesmo deixar o namorado para trás.

Mas ela está calma demais.

Vestimos nossas novas roupas nos escondendo atrás da caminhonete. Penteio o cabelo para alisá-lo, depois o prendo atrás das orelhas.

— Deixa eu ajudar você — diz Cara. Ela afasta uma mecha de cabelo do meu rosto e prende-a com um grampo prateado, como as garotas da Erudição costumam fazer.

Rebecca está amarrando seu enorme cabelo, mamãe costumava não cortar muito seus cabelos, papai não parecia notar, mas eu sabia que mamãe adorava os grandes cachos de Becky.

— Caramba, Becky... Até assim você fica bonita. — Diz Christina e minha irmã sorri convencida. É verdade, mas sei que Christina está usando isso para tentar animar a garota.

— Valeu. — responde.

Finalmente prontas, Fernando e outro garoto da Erudição aparecem com as armas.

— Você quer uma? Ou prefere carregar o atordoador?

Encaro a arma em sua mão. Se eu não carregar pelo menos o atordoador, ficarei completamente vulnerável a pessoas que atirarão em mim sem pensar duas vezes. Mas, se eu escolher o atordoador, demonstrarei minha fraqueza diante de Fernando, Cara e Marcus.

— Sabe o que Will diria? — pergunta Christina.

— O quê? — digo, com a voz trêmula.

— Ele diria para você superar isso logo. Para deixar de ser tão irracional e pegar logo a droga da arma.

Will não tinha muita paciência para a irracionalidade. Christina deve estar certa;
ela o conhecia melhor do que eu. E ela, que perdeu alguém querido aquele dia, assim como eu, foi capaz de me perdoar, um ato que deve ter sido quase impossível. Teria sido impossível para mim, se fosse o inverso. Então, por que é tão difícil perdoar a mim mesma?

Insurreto (2- Insurgente) Onde histórias criam vida. Descubra agora