twenty two

72 7 0
                                    

A conversa se dissipou. Ela ficou calada e a mesa continuou vazia. Eu continuei observando, sem saber ao certo o motivo disso.

— Você continua encarando. — Lorna disse depois de um certo tempo em silêncio, logo após olhando para mesa também. — O que tem de especial?

— seis lugares. — Conforme pensava mais sobre eles, as boas memórias foram surgindo de repente em minha cabeça. Eram poucas, mas o suficiente para me deixar feliz ou satisfeita com a minha vida naquele momento.

Nos dias de treinamento, Scott costumava nos liberar cedo do combate corpo a corpo, Kitty e Harley sempre eram os primeiros a sair, logo atrás ia eu e Kamala e por último Gwen e Peter. Nós costumávamos ir sempre em um lugar muito específico da Torre: uma área de lazer na parte comercial, alguns andares a baixo. Os Vingadores não tinham ideia daquele lugar, só os funcionários daquela ala, eles nos deixavam entrar e descansar ali, sem reclamações alguma.

Uma mesa com quatro lugares se tornava seis.

A conversa era mínima, quase pouca, todo mundo ficava muito cansado depois do treino, mas Gwen sempre dizia que iríamos ser um grupo que lutaria no futuro e que era melhor nos conhecer, mas nem mesmo ela quis se apresentar com mais detalhe.

Ninguém se conhecia direito. Eu não conhecia Harley direito. E ele muito menos eu. Não contava detalhes, ele sabia meu nome, meu aniversário, meus pais e minha situação, e ele escolheu cuidar e se importar de um dia para o outro e eu não soube assimilar isso naquele momento porque ele foi a primeira pessoa, e eu não sabia como a sensação era.

— Você tem que superar. — Eu a encarei com certa raiva quando ela me disse isso de repente. Lorna se virou para mim, com a mão na cintura e um semblante nojento de menina mimada.

— A mesa? — Eu tentei me acalmar, tentando soar engraçado para não explodir com ela.

— Seu namorado. — Aquilo me deixou nervosa e sentimental.

— O Harley– — Eu estremeci quando disse, depois de quase três anos, o nome dele em voz alta. Soava estranho, soava indiferente, eu estava me esquecendo dele como um todo. — Ele sofreu junto comigo, não dá simplesmente pra superar.

— Ah, lógico que dá, só que você não quer isso. — Ela sorriu, como se estivesse certa. Aquilo me deixou confusa.

— Lorna, você tá se ouvindo falar? — Eu estava em choque. — Você não me conhece, você não conhece a minha trajetória e nem a dele.

— Você acabou de me contar tudo, Lizzie. — Ela repetiu. — Você gosta de lembrar que está sofrendo e gosta de parecer depressiva para os outros.

Eu levantei abruptamente e a encarei nos olhos antes de pensar no que fazer ou falar nessa situação. Eu não tinha a mínima noção do que acontecia ou do que eu fiz para ela agir daquela forma comigo, mas eu não toleraria ela tirar sarro do meu luto e soar como se Harley fosse passageiro e insignificante para mim.

Mas gritar ou bater não valeria a pena, não parecia justo com uma criança que só queria me tirar do sério.

Eu saí da casa com pressa e parei bem em frente ao local onde Loki sumiu, no lado de fora da casa, quase perto da rua.

Respirei fundo o ar, como se nunca tivesse respirado em toda minha vida. Fechei os olhos e descansei o corpo, eu estava muito tensa, muito eufórica, quase sem ar. E eu não queria estar assim.

Kamala era ótima em dizer palavras bonitas, em aumentar o astral do pessoal apenas com seu sorriso lindo e sua personalidade marcante. Era tão engraçado quando ela e Peter tentavam fazer brincadeiras um com o outro, usando os poderes ou não. Era tudo tão alegre, tão diferente.

Mas mesmo lembrando disso, eu não conseguia me acalmar.

Estava tudo desmoronando.

Eu sentei no chão e observei a paisagem na minha frente. Como na fazenda, pensei. Rodeada de bonecas e lanches, com minha mãe sorrindo e com meu pai sempre sentado no sofá lendo um livro infantil. A vida era muito fácil, e eu não me lembrava como ela havia virado do avesso.

Lizzie. Eu encarei o chão quando ouvi uma voz muito mais que reconhecível sussurrando perto de mim, se eu encarasse ele, a minha mente saberia que eu estaria mais estável que nunca em relação a ele. — Por que você está tão magra?

Ele parou bem na minha frente.

Olha pra mim. Não olhei, não era normal isso estar acontecendo, eu estava bem dias atrás. — É quase natal, Peter adora essa data, mas ele está com um problemão agora, e eu preciso de sua ajuda para outra coisa também.

Eu ergui as sobrancelhas e mordi meu lábio inferior com tanta força que eu senti o gosto do sangue. Eu não conseguia me erguer e sair dali.

Eu salvei a Lorna, mas ela acabou ficando aqui do que na nova base dos Vingadores. — Eu arregalei os olhos e ergui o olhar, só para me assustar com a grande mancha roxa perto do seu olho esquerdo, onde o Soldado Invernal bateu. Aquilo me apavorou tanto que a primeira reação foi fechar os olhos com força, e, quando abri, ele me encarou com preocupação. — Eu sou real, Elizabeth, e a marca também.

— Você está transparente. — Eu disse como se fosse óbvio. Ele parecia um fantasma que iria me assombrar para sempre.

Eu estou sendo cobaia de um plano astral da America. — Ele disse depois de uns segundos calado. — É estranho, eu sei, mas eu sou real, eu estou vivo.

— Certo. — Eu disse, tentando não entrar fundo nisso. — Só diga o que você quer e suma, por favor.

Você não acredita em mim. — Ele disse com a voz fraca. — Aconteceu algo muito grave com o Peter e só você e eu nos lembramos dele, eu não consigo falar com ele, só tenho você agora. — Ele se aproximou. — Por favor, acredite em mim.

— Você, meu amigo morto que eu não consigo superar, me dizendo para voltar para Manhattan, no momento que eu mais quero voltar. — Eu deduzi rapidamente, isso era tudo fruto da minha mente. Eu virei de costas e andei em direção a casa.

— Lizzie, eu sou seu líder. — Eu continuei a andar, entrei em casa, e nada mais aconteceu.

— E você tá morto. — Eu sussurrei.

A Filha de Tony StarkOnde histórias criam vida. Descubra agora