39: O pior de mim.

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Enzo

Amigos, tenho muitos. Todo mundo na faculdade é meu amigo. Todos gostam de mim, são legais comigo. Mas tem um pequeno problema, eles não gostam de me dividir. Nem eu, nem o Marcos, o Ruan ou o Vincenty. Somos como um produto no supermercado, se você não pode pagar, não pode abrir.

Ou seja, pessoas sem nada para fazer, criando algo para fazer. Alguém para idolatrar. Mas com tanto cantor por aí, não entendo. Não entra na minha cabeça. No fim das contas, as pessoas só querem falar, mal ou bem. Todo mundo é assim.

Acelero o carro. Peguei com o Vincenty, emprestado. Imagina eu horas atrás: passando creme de abacate no meu lindo rosto antes de dormir e do nada recebo uma ligação da minha namorada chorando.

— Que porra tá acontecendo? — Me pergunto. Avisto um grupo na frente da mansão.

Paro perto da calçada. Elas esperam todas juntas. A primeira coisa que escuto quando abro a porta do carro é:
— Alguém mordeu a canela da sua namorada!

— Como é?

Ela está apoiada na Vitória, apoiada em uma única perna. Sua boca cotada, sua canela com marcas de dentes e sangue. O cabelo bagunçado. Uma garota toda de preto e branco aparece, vindo da casa.

— Perdi de ganhar mil reais! — Resmunga.

— Você aceita dinheiro para fazer qualquer coisa. Não é? — Tereza pergunta.

— Quase tudo.

Continuo sem entender absolutamente nada. Encaro a minha namorada. Vou até  ela lhe pegando no colo. Prioridades. Sento no banco do motorista com ela no meu colo.

— Me expliquem no caminho. — Buzino. Elas entram também. Sem perder tempo.

Espero para ouvi-las falar. Uma explicação. Qualquer coisa. Piso no acelerador. Aurora abraça meu pescoço.

— É melhor ir no hospital. Você se jogo feio no chão para quebrar aquela cadeira!

— Oi?

— Recapitulando: Lola era nossa amiga. Chamo a gente para passar um tempo na casa dela quando os pais sairam, e além de tudo, é meia irmã do desgraçado do Julian. Coisa que ninguém podia adivinhar. Ele tava mundo bem longe. Mas as três vacas convidaram ele para voltar. — Tereza tagarela. — E não para aí. Além de amarrar a Aurora, elas queriam cortar o cabelo dela. Por que? Não sei, porra!

Me concentro na estrada. Ela está certa em ficar brava. Eu também estou. Ser louco o bastante para tentar mexer comigo é uma coisa. Mas ser louco de tocar nela, não, só pode ser sacanagem.

Tenta achar um motivo, não vai mudar nada. As pessoas não precisam de motivos nem pra matar. Por que qualquer um daquela faculdade de merda iria querer ter um motivo para ser escroto?

— A culpa não é dele, Tereza! — Aurora fala.

— Eu sei. Mas estou com raiva. Então ignore o que eu falar hoje.

— Calma, vamos pensar no que fazer. — Gabriele tenta acalmar os ânimos.

Nego, apertando o volante:
— Vocês não vão fazer nada.

( … )

— Eu vou fazer!

— Não. Que ideia de psicopata é essa? — Enrolo o esparadrapo onde tem marcas de dente, não sem antes desinfectar.

— Só vou pôr fogo na casa dela, e hackear as contas bancárias para que nunca mais possa fazer uma plástica. O dinheiro vai para instituições de caridade, que tal?

— Que medo. — Vitória se afasta.

— Isso é cruel demais! — Resmunga.

Tem infinitas coisas que eu podia fazer. Como deixar a tal Lola paraplégica. Não é difícil, e até fácil. O pior de mim, posso colocar fogo na cidade inteira ou só na faculdade para começar. Ser como todo mundo.

— O mundo é cruel. Por que eu não posso ser também? — Retruco.

— Você é melhor do que elas. — Parece estar falando mais para si mesma do que para mim.

Nego, rindo sem humor.

— Não quero ser melhor. Quero ser pior!

— Ela tem vários hematomas. Não sinto pena. Só, o irmão dela me batia igual. Ela já tem o castigo dela. A Lola não merece tanta importância.

— Não quer fazer nada?

Encaro seus olhos. Ela ri:
— Ah, eu já fiz. Arranquei o aplique dela quase todo!

Reviro os olhos. Isso parece tão pouco. Mas ela está feliz. Concordo. Levanto do chão lhe ajudando a levantar do sofá.

— Vem pra cama.

— E a gente? Tenho horário para voltar. — Esther pergunta.

— Vou deixar vocês em casa. — Aviso. Cuidando da minha namorada primeiro.

( … )

Só precisei levar a alegre e a antisocial. A Gabriele fico para dormir com a Tereza, guerreira aquela garota. Tranco a porta do quarto atrás de mim, tiro a camisa e me deixo do lado da Aurora.

Ela vem para cima de mim. Abraço sua cintura. Fecho os olhos.

— Não me liga chorando. Você me assunto. — Sussurro.

— Bebê? Você acha que a culpa foi minha?

— Não, nunca mais se culpe por ser machucada! — Aperto ela. O que motiva as pessoas. Eu queria entender. — Você não fez nada de errado.

— Queria que entendessem como é se sentir assim. E se colocassem no lugar dos outros.

Garotos cruéis! - Livro 01Onde histórias criam vida. Descubra agora