22: De pobre a sem teto.

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Aurora

Ninguém nunca choro por mim. Nem a minha mãe adotiva, pelo menos não na minha frente.

Aprendi uma coisa quando pequena, encontrei um pássaro machucado e cuidei dele, mas ele morreu. Moral da história: Não pegue animais desconhecidos para cuidar, você vai sofrer pela lei da vida.

Foi quando entendi o significado da frase "passar dessa para melhor".

Não quero usar o Enzo, não quero o dinheiro dele — não mais, antes as coisas pareciam passageiras. E nem o da Teresa, ou o da Gabriele. Elas já me ofereceram algumas vezes. Vai chegar um dia que vou ter que me virar, por isso não quero aceitar. Mas sei que o Enzo vai ficar muito bravo quando souber.

Ele ainda está no meu dormitório. Bem na minha frente. Terminamos a primeira parte do trabalho. Eu quero lhe contar, não me sinto bem em esconder.

Bocejo, estou um pouco cansada.

— Enzo… — começo encarando as minhas mãos. Mexo a perna nervosa. — Quero que você entenda que estou bem, e mesmo que não esteja vou ficar. Não quero que fique preocupado. — Começo sem saber como explicar. — Eu sou adotada. E eu, e a minha mãe adotiva, a gente sempre quis a mesma coisa. Que eu terminasse a faculdade, não importava qual curso eu escolhesse.

Ele fico em silêncio.

— Foi difícil conseguir uma bolsa, eu estaria mentindo se dissesse que foi fácil. Minha mãe mora na cidade vizinha, ela trabalha em uma pequena loja de roupas. E…  — paro de falar. — Nem uma de nós acho que seria tão difícil, achamos que daríamos um jeito. O dinheiro que ela pode me mandar não cobre todas as despesas básicas e o aluguel do dormitório.

— Ela sabe disso?

— Não. — Nego várias vezes com a cabeça. — Tenho que escolher todo mês entre comprar os meus remédios e comer todos os dias. Então fiz um acordo com a enfermaria da universidade, eu compraria os remédios e ela me daria soro para compensar a falta de nutrientes. Já tentei arrumar um emprego, mas as oficinas próximas não aceitam mulheres e não recebi resposta quando botei currículo em outros lugares.

Ele fica em silêncio, assimilando as informações.

— A quanto tempo está fazendo isso?

— 1 ano e dois meses — engulo em seco. Espero que ele brigue comigo, que me repreenda. Mas quando levanto o rosto só vejo o Enzo, calmo e gentil.

Ele dá uns tapinhas na sua perna:
— Venha aqui!

Vou para o seu colo sem entender. Ele me abraça apertando. Abro a boca, chocada:
— Você é a mulher mais forte que eu conheço.

Fecho os olhos com força e escondo o rosto no seu peito. Parece que ele está tentando me fazer chorar. Quando tento retribuir o abraço e passar os braços em volta do seu tronco, ele segura meus pulsos e passa pelo seu pescoço.

— Essa é a parte que você chora! — Enzo sussurra.

— Não vou chorar, tenho um namorado chorão para fazer isso por mim! — Levanto o rosto zombando dele.

— Eu também sou rico, só para deixar registrado.

— Não quero seu dinheiro, bebê.

— Mas amor!

Nego.

( … )

03:26

— Não mereço um beijo?

— O que? Por que?

O Enzo saiu para comprar comida, mesmo quando eu disse que não precisava, e volto falando no telefone.

Garotos cruéis! - Livro 01Onde histórias criam vida. Descubra agora