28: Ex ou assombração?

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Aurora

Sua mudança de atitude na hora H, me espanto um pouco. Fiquei com tanta fome depois que fiz o Enzo fazer o almoço enquanto comia um pacote de bolacha. Ele não reclamo, está radiante como novo. Enquanto estou toda dolorida, exatamente como desejei ficar.

O sofá é um pouco desconfortável no momento. Choramingando, encarando ele vestido e de costas perto do fogão:
— Estou toda dolorida!

Ele ri alto como se fosse uma piada.

— Desculpe, amor, mas não sinto muito. Faria de novo. — Enzo viro o rosto, as bochechas vermelhas.

— Claro que faria… — Resmungo comendo minha bolacha.

A porta da frente é aberta de repente. Teresa entra de mãos dadas com a Gabriele. Elas sentam do meu lado. Fasto pro lado fazendo um careta, ainda consigo sentir como se ele estivesse dentro de mim, igual a sensação de passar muito tempo na piscina.

— Aí, como é que foi? — Teresa sussurra pra mim. — Escutei uns gritos!

Jogo a almofada pequena do sofá nela. Meu rosto ganha cor.

— Ursinha, não vamos ser intrometidas.

— Eu agradeceria. — Quero enterrar minha cabeça no chão.

— Tá bom. — Teresa resmunga.

Para a minha sorte o Enzo chama pra comer. Levanto, é desconfortável sentar. O garoto sorri, vindo me ajudar. Me apoio nele. Olho para baixo envergonhada.

Sento na cadeira à mesa. O garoto coloca comida em um prato pra mim. Se serve tão. Então tono que elas estão nos encarando.

Ignoro.

— Enzo, tenho que estudar para as provas do fim do período. Não vou poder ir amanhã à festa da praia. — Aviso.

— Também tenho que estudar e terminar um trabalho.

— Verdade, as provas estão logo aí. — Teresa nota fazendo uma careta em desagrado.

Gabriele se volta pra mim:
— E que festa é essa? Não sabia que nessa cidade tinha praia.

— Lola está dando outra festa antes das provas. Está brava com o pai que não deixo ela namorar um traficante. Pelo menos foi o que me conto.

Enzo ri, cobrindo o rosto com a mão. Olho confusa.

— Não é um traficante, ela está ficando com o Marcos. Aposto que ele mentiu para parecer perigoso.

— Que idiota!

Passei a maior parte do final de semana estudando, comendo e assistindo. Até engordei um pouco nos últimos meses. Dormir no sofá viro costume. Fecho os olhos.

— Amor? — Acaricio seus cabelos tentando dormir.

— Oi.

— Não consigo dormir.

Começo a cantar:
— Nana, neném
Que a Cuca vem pegar
Papai foi na roça
Mamãe foi trabalhar…

— Tá, já entendi. Vou dormir!

( … )

Chegamos na faculdade no horário certo para variar. Organizo meus livros didáticos no armário de metal, esses não queimaram. Olho para o meu namorado brincando com um cubo mágico do meu lado. Pego algumas embalagens de comida e coloco na bolsa para jogar no lixo depois.

Fecho a porta. Me assustando com o garoto loiro que aparece do nada. Meu coração dá um pulo, meu estômago se revira, dou um passo para trás.

— Au-ro-ra! — Cantarola meu nome com um sorriso que me dá náusea.

Engulo em seco. Ele está aqui, aqui, aqui. Vou para trás do Enzo sem aviso. Aperto sua camisa.

— Disney? Qual é o problema?

Meu rosto deve estar palito. Jurei que nunca mais teria qualquer contato com ele.

— Me chamo Julian, sou o namorado dela.

— É mesmo? Que consciência, eu também!

— Você não é mais meu namorado… — Sussurro, nervosa. Tentando desmentir o Julian.

Medo, posso ter confundido com amor uma vez. Meu ex é como uma assombração, ele não deveria nem existir, mas aparece nos piores momentos. Vê-lo me olhando me incomoda mais do que vê-lo em si. Tento ignorar.

— Não concordei com o nosso término.

— Você parece ser gente boa. Por que não aparece no treino de futebol da tarde?

— Acho que eu vou. A gente se vê depois Aurora!

Só respiro aliviada quando ele vai embora. Enzo se vira com a mandíbula trincada, seus olhos castanhas claros me encaram. Envolvo seu pescoço, o puxando para um abraço. Tentando acalmar meu coração medroso. Não sei porque ele resolveu aparecer agora. Estava indo tudo bem, eu comecei de novo, eu não sou mais a garota ingênua que aceito ser espancada pelo namorado bêbado.

— O que ele fez com você? Me fala Aurora.

— Ele me batia quando ficava bêbado, muito mesmo. Então eu fugi, terminando por telefone. Nunca achei que ele me acharia. Não falei antes porque queria esquecer, e fingir que nunca aconteceu! — Aperto ele com força, me segurando para não chorar mais por aquele filho da mãe miserável.

Enzo acaricia meu cabelo:
— Tá tudo bem. Ele não vai mais chegar perto de você.

( … )

Me escondo no banheiro na hora do intervalo. Estou assustada demais para sair. A cabine do banheiro chega a me dar nervoso. Fecho os olhos contando até 10. Sentei na tampa da privada mesmo.

Começo a rir e chorar em desespero:
— Não estou com medo…

Essa sou eu de verdade, uma garota medrosa, teimosa e insegura. O Enzo me ajudo a perceber em alguns momentos que eu não precisava ter medo. Que eu merecia mais.

Não é justo pedir pelo mínimo. Queria ter conhecido ele antes. Não tem noção de espaço pessoal e sempre me pergunta se pode fazer as coisas, mas é o melhor namorado que uma garota poderia ter.

— Ele não vai me machucar, não vai! — Pareço uma tola. Sorri sem humor. Às lágrimas escorrem pelas minhas bochechas.

Esfrego os olhos tentando parar. Não gosto de chorar na frente de ninguém. Às pessoas não entendem que a única coisa que quero fazer é chorar, quero ficar triste. Não quero ouvir um “não chore”.

Sai pra fora depois de me acalmar. Jogo água no rosto. Pisco tentando disfarçar os olhos inchados com um sorriso meia boca. O espelho me diz que não está dando certo.

— Queria voltar no tempo.

Garotos cruéis! - Livro 01Onde histórias criam vida. Descubra agora