Ponto de vista: Maya
Avisei aos meus pais que um amigo viria buscar um livro emprestado para um trabalho da escola. Eu realmente não tinha nada melhor para inventar que justificasse que Bernardo viesse uma sexta-feira no final da tarde me ver.
Sua calça escura se ajustava perfeitamente a sua cintura, sua camisa vinho por baixo da jaqueta preta, contrastava com a sua pele clara. Seus olhos castanho-claros, pareciam desafiar as cores da sua roupa.
— Que produção. — Comentei, cruzando os braços enquanto caminhava em sua direção pelo jardim da frente de casa.
Desviou os olhos dos meus, pousando-os sobre sua própria roupa.
— Tive uma reunião na agência antes de vir.
Essa informação não deveria ter nenhum valor para mim, mas teve, por mais que eu quisesse negar. Então em que momento ele tinha encontrado Debora?
— Por que quis me ver hoje? — Perguntei, tentando dissimular a curiosidade.
— Porque me sinto confortável com você e tive uma tarde difícil.
O observei em silencio, assentindo.
Dei mais um passo em sua direção.
— Debora fez um escândalo e acabou subindo algo nas redes. A agência me chamou para averiguar o que tinha acontecido e tentar apagar o fogo.
Ele parecia exausto. Senti meu sangue fervilhar e percebi que isso havia me afetado muito além do que eu conseguia compreender.
— Por que ela fez isso?
Negou lentamente, ignorando a minha pergunta.
Abaixei a cabeça e fitei a grama fofa e húmida sob meus pés.
— Você... uhm... Quer ver um filme comigo?
Me olhou surpreso. Um sorriso formando-se finalmente em seus lábios. Não pude evitar sorrir dissimuladamente de volta.
— Sim, eu adoraria.
E foi assim que entrei em casa com a calça de moletom mais velha que eu tinha, acompanhada de um dos modelos masculinos juvenis mais cotados do momento, enquanto meus pais viam um filme velho no sofá da sala.
Mamãe se levantou de um salto, pausando o filme e olhando para Bernardo como se ele tivesse saído da capa de uma revista.
E ele tinha. De algumas, pelo menos.
Seus olhos passaram de Bernardo a mim rapidamente e vi em seu olhar que ela estava tentando entender como eu trazia um cara desses para casa vestida desse jeito.
Depois de uma apresentação bem embaraçosa, subimos as escadas até o meu quarto, acompanhados pelos olhares atentos dos meus progenitores.
Por sorte, eu era uma pessoa organizada e não havia nada de que eu pudesse me envergonhar no meu quarto.
— Eu estava terminando esse. — Apontei para a tela, sentando-me um pouco sem jeito na minha própria cama. — Mas podemos ver outra coisa, se você quiser.
Sentou-se ao meu lado, ainda com aquele meio sorrido oculto, como se soubesse algo que eu não sabia.
— A gente pode terminar esse. — Disse, encostando na cama e pegando a minha bacia de pipoca. — Aperta o play, por favor. — Completou, piscando enquanto levava a pipoca a boca.
Folgado.
Bem típico.
Por alguma razão, o filme começou a parecer muito complicado para mim. A luz apagada, a tela do computador e um cara sentado ao meu lado na cama, não era uma combinação que eu costumava fazer todos os dias.
Os créditos haviam começado, mas não nos movemos.
Suspirei um tanto inquieta, enquanto buscava algo para dizer.
— Se sente melhor agora?
Assentiu, movendo-se sutilmente ao meu lado.
— O que ela fez? Quero dizer, para que tenham te chamado da agência por isso...
— Ela queria um beijo.
Senti o coração apertar e me mexi desassossegada, tentando, sem êxito, ignorar essa sensação.
— Isso não é algo complicado. — Respondi, pausando os créditos do filme só para ter alguma coisa para fazer.
— É, porque tem alguém que eu não quero que mal interprete isso.
Evitei deliberadamente encará-lo. Minhas mãos estavam transpirando, então apertei o lençol da cama entre os dedos para me tranquilizar.
— E como terminou?
— Debora gravou um vídeo dizendo que eu tinha quebrado a promessa no segundo encontro e que pessoas como eu acham que podem jogar com garotas como ela porque nos sentimos especiais.
Neguei, sentindo culpa.
Eu tinha criado toda essa confusão. Eu e minha boca grande.
— Eu sinto muito. — Disse por fim. — Não tinha ideia de como essa minha estupida ideia afetaria todo mundo.
— Esta disposta que assumir as consequências disso? — Perguntou, pousando seus olhos felinos nos meus. Senti de novo aquele martelar acelerar minha pulsação.
— O que você quer que eu faça? — Respondi. Minha voz não foi mais que um sussurro.
Desviou os olhos dos meus, pousando-os sobre os meus lábios. Não pude evitar observar a cor intensa dos lábios dele. Aproximou-se lentamente, me dando todo o tempo do mundo para saltar da cama e sair correndo, mas não pude me mover.
Senti o roçar leve dos seus lábios sobre os meus enquanto o pulsar no meu peito incrementava.
Eu não tinha muita experiência nisso, mas pela forma como meu coração agia, pude afirmar com total certeza de que aquele era o melhor beijo do mundo.
Senti o frio que vinha me perseguindo na boca do estomago incrementar até que fosse quase insuportável. E então, o frio passou, meu coração voltou a bater ritmicamente, quando suas mãos seguraram o meu rosto levemente, e seus lábios abriram os meus, pressionando-me contra si até que ambos ficássemos sem ar.
Seu perfume suave e cítrico, passou, mais uma vez, a dominar a atmosfera ao meu redor. Segurei o tecido suave da camisa dele sobre sua cintura porque estava segura de que cairia para trás, se não me aferrasse a algo. Senti o roçar dos seus lábios ao traçar um caminho quente desde a minha boca até os meus olhos fechados, a ponta do meu nariz, a minha testa.
— Maya querida, querem comer alguma coisa?
A voz da minha mãe subindo a escada quase me fez cair da cama. Consegui me afastar de Bernardo, ainda um pouco aturdida, enquanto acendia a luz respirando fundo porque, de repente, fazia muito calor ali dentro.
O vi levar a mão a boca para esconder um sorriso que me fez querer matá-lo, enquanto eu olhava ao redor nervosa, sem saber o que fazer, e lhe lançava olhares assassinos de alerta.
Mamãe bateu na porta do quarto segundos depois, abrindo e pedindo perdão por interromper.
— Eu preparei um sanduiche para vocês. — Disse, entrando e colocando uma bandeja sobre a minha mesa de estudos. — Receita nova no meu blog. — Completou, piscando para Bernardo e para mim, enquanto abria um meio sorriso que me fez querer que a terra me tragasse. — E tem um suco de manga também. Espero que gostem.
Suspirei fundo, deixando a adrenalina escapar, enquanto caia novamente sentada na cama.
— Morrerei jovem. — Constatei, falando comigo mesma.
O vi parar ao lado da bandeja e pagar um sanduiche, começando a comer enquanto me observava com um meio sorriso.
— Ainda me deve oito encontros. Assegure-se de ficar viva até cumprir sua promessa.
VOCÊ ESTÁ LENDO
10 encontros
Ficção AdolescenteMaya sempre teve claro o que queria conquistar na vida: ser uma cientista renomada e trabalhar em projetos importantes dentro de grandes empresas pelo mundo. Então, quando finalmente conseguiu ser aceita na melhor escola do Estado, sentiu que faltav...