Depois da segunda caótica que tive, o resto da semana foi tudo que eu precisava: tranquila. Pela primeira vez, no que parece um século, me senti calma e, o melhor, não fiquei me martirizando. Realmente precisava desse tempo para processar tudo.
Nem acredito que tem mais de uma semana de todo aquele caos que acreditava que não teria solução e muito menos sossego.
Como é bom não sentir raiva de mim mesma, de não brigar comigo mesma pelas atitudes erradas que tomava diariamente, de não me sentir mal por magoar pessoas que eu me importo. Sei que não posso apagar as besteiras que fiz e falei, mas posso aceitar que já foi feito e que não há nada que eu possa fazer para reverter o que aconteceu. Estou tentando ser a minha avó: otimista.
Na escola, onde tive mais receio de como ficaria a dinâmica, está tranquilo. Nos dias em que eu passava o intervalo com o time de hóquei, estou passando com a Chris, onde costumamos ficar nos outros dias da semana. E, sendo bem sincera, está bem melhor, pelo menos não tenho que ouvir sobre hóquei toda hora e ficar sorrindo de falas que não acho graça.
Já em casa, o assunto ainda é o Liam, e à medida que chega perto da sua chegada, mais ansiosa minha avó fica.
O Travis ainda não fala comigo, nos jantares de semana ele ficou o mais calado possível, e nessa segunda, que somos só nós dois, ele não proferiu nenhuma palavra, quer dizer, apenas o básico. Ele não apareceu no jantar de sábado e nem no de domingo.
Queria que ele não tivesse raiva de mim, mas o que me resta é dar tempo ao tempo. Sei que seu forçar, só piorará. Na verdade, não queria ter dito aquelas besteiras a ele, que de besteira não tem nada.
***
Essa é uma quarta-feira atípica. Principalmente porque minha avó comprou um banquete de salada para o jantar, e chamou o Louis e o Travis para comerem conosco. Não os vejo como apreciadores de salada, mas minha avó está empolgada demais para eu cortar o barato dela.
Ajudo a montar a mesa enquanto eles não chegam e, tentando arrancar uma explicação para esse jantar saudável.
— Eu já falei, quando os meninos chegarem — amo que ela sempre se refere ao Louis e ao Travis, como meninos, sendo que o Louis deve ter uns sessenta anos — eu contarei.
Que segredo é esse que precisa ser comemorado com salada? Ela está feliz, então deve ser algo bom, eu acho. Um belo bolo explicaria sua empolgação, não uma salada.
Minutos depois eles chegam, fico animada de vê-los, isso significa que vou saber que segredo é esse. Porém, ainda é estranho ver o Travis e fingir na frente deles que está tudo bem entre a gente.
— Salada? — Travis exclama ao olhar a mesa de jantar repleta de diversos pratos de salada. — A nossa janta vai ser salada? — pergunta calmo, mas com desgosto.
Louis o cutuca com reprovação.
— Nada de reclamar — briga com o Travis, depois se vira para a minha avó —, o jantar será salada? — pergunta, porém, ao contrário do Travis, ele pergunta com cautela.
Travis revira os olhos e Dona Kitty dá uma risada.
— Vamos, sentem — ela diz, com seu sorriso largo, como se não aguentasse mais guardar o seu segredo.
— Vó, conta logo o porquê desse buffet de salada — peço quase impaciente.
— Então — faz uma pequena pausa para alargar ainda mais seu sorriso —, o Liam me ligou hoje de manhã, me contando as novidades — faz novamente uma pausa, tenho a impressão que se ela alargar ainda mais seu sorriso, sua boca vai rachar. — Ele não virá sozinho, ele virá acompanhado de sua namorada, Ava! Os dois querem contar pessoalmente uma novidade! — Ela dá um gritinho de empolgação assim que termina de falar.
Nenhum de nós três falamos nada, apenas observamos a minha avó com sua empolgação exagerada. Não os conheço, não sei dizer o porquê dessa felicidade toda, o que eu queria mesmo entender era o porquê de um buffet de salada para contar isso. Estou tentando analisar sua fala para conectar a novidade com esse banquete saudável, mas não há explicação.
— Mas o que o banquete de salada tem a ver com essa novidade?
— Essa empolgação toda é por isso?
— E qual é a novidade?
Eu, Travis e Louis perguntamos na mesma hora.
Observamos o sorriso extra largo de minha avó sumir.
— Ah, vocês, francamente! Esperava mais empolgação. — Ao perceber que ainda continuamos perdido com toda essa situação, ela bufa — eu não sei a novidade, mas se ele está trazendo uma garota pela primeira vez, deve ser sério, pode ser que ele vá pedi-la em casamento ou que ela esteja grávida! Como não se empolgar com isso?
— Okay, mas o que a salada tem a ver com isso? — pergunto ainda indignada com essa mesa só de salada.
— Como se comemora algo com salada? — Travis pergunta, soando tão perdido quanto eu.
— É, não entendi o lance da salada — até o Louis entra nessa.
— A Ava é vegana. Por isso montei esse buffet de salada, para vermos que temos opções de boa comida sem origem animal.
— O quê? Ela é mesmo do Texas? Como alguém que mora no Texas é vegano? Não faz sentido! — Louis exclama indignado.
Confesso que segurei o riso, é engraçado o ver assim.
— Espera, você está sugerindo que todos nós viremos veganos enquanto eles estiverem aqui? — Travis pergunta com cautela.
— Sim! Temos que agradá-la, e será por apenas quatro dias. No fim, vocês irão me agradecer, fará bem para a saúde de vocês. Olha o quanto de opções boas que tem aqui.
— Mas, vó, eu como muito, isso não vai me satisfazer — digo calma, mas por dentro estou gritando.
A verdade é que acho super foda quem é vegetariano, vegano, então, uma pessoa completamente iluminada, mas não sou essa pessoa. Vegetariana eu até conseguiria, mas viver sem queijo, sem leite e sem ovo, seria um pesadelo.
— Todos nós comemos muito — Louis diz com um olhar de revolta, mas sua voz está mais calma — nem eu e nem o Travis sabemos cozinhar comida vegana, quer dizer, só macarrão no alho e óleo ou molho de tomate, espera, macarrão é vegano?
Todos nós refletimos por um tempo. Ninguém aqui sabe.
— Posso olhar nos ingredientes depois. Vocês não precisam cozinhar, combinei com a Dona Blanca, ela que fez esse buffet e ela entregará nossas refeições enquanto eles estiverem aqui.
— Isso é sério? — Travis pergunta desconfiado.
— Claro! São só alguns dias, ninguém aqui é desnutrido, todos conseguem sobreviver por quatro dias só de verduras e frutas. O Liam está muito empolgado, vamos recepcioná-los muito bem, e sem reclamações — minha avó briga conosco.
Nós ouvimos calados. Ela tem esse poder, Dona Kitty quase nunca é contrariada, a sua palavra é sempre a que permanece. Mas em um bom sentido.
— Okay, mas se ele vem de casal, eles não vão dormir comigo no meu quarto, né? — Travis pergunta com uma certa cautela.
— Eles não vão dormir no seu quarto, eles vão dormir no quarto do seu tio e o seu tio irá dormir comigo.
— É sério isso? — Travis e Louis pergunta na mesma hora e na mesma entonação surpresos.
— Claro! Agora podemos comer?
Mais uma vez, todos obedecem. Comemos calados, o que não é muito comum, Dona Kitty e Louis sempre conversam e, claro, sempre tem alguma implicância entre ele e o Travis. Mas dessa vez ninguém fala nada, só comem as milhares de opções de salada com cara fechada.
Alguns momentos fiquei com vontade de rir na mesa, especialmente quando via alguma expressão de desgosto do Louis e do Travis, ou quando o Louis enchia a salada de limão e sal.
De um modo curioso, eu estou animada para a chegada do Liam e da sua namorada vegana. Vou passar fome, mas pelo menos sei que vou rir.
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O Garoto da Casa ao Lado
RomansaZoe Brooks, uma adolescente recatada, muda-se para o interior com sua excêntrica avó após um incidente em sua cidade natal. Lá, ela conhece Travis Avery, seu vizinho problemático. Enquanto tenta se integrar na nova escola, Zoe acaba caindo nas graça...