Capítulo 28

59 8 3
                                    

A melodia matinal que nos últimos meses me despertava, composta pelo canto das gaivotas em perfeita harmonia com os sussurros das ondas, foi substituída por uma canção desconhecida

Ops! Esta imagem não segue nossas diretrizes de conteúdo. Para continuar a publicação, tente removê-la ou carregar outra.

A melodia matinal que nos últimos meses me despertava, composta pelo canto das gaivotas em perfeita harmonia com os sussurros das ondas, foi substituída por uma canção desconhecida.

Trinados nunca antes ouvidos e passos apressados sobre uma armadura de ferro ecoavam ao longe, a orquestra dissonante anunciando um novo dia. O aroma fresco da maresia ainda pairava no ar, mas agora parecia cada vez mais distante, como uma lembrança esmaecida. Eu não estava mais em alto-mar.

Estava em terra firme.

Tentei erguer meu corpo da cama de pedra, mas ele protestou, cada músculo se contraindo em dor. Os meus olhos lacrimejaram e o meu peito vacilou por um instante. O aperto cruel e sufocante tornava respirar mais difícil do que deveria ser. Levanto a cabeça com dificuldade, meus olhos ainda se ajustando à claridade da única luz que entrava de uma minúscula janela adornada por grades de ferro. A lassidão inundava a minha boca com um gosto de ferro, que também tinha gosto de sangue, amargando a língua.

Contenho um grunhido ao me sentar, moderando a dor até onde podia.

Uma dor mais aguda, lancinante, atingiu a parte inferior da minha cabeça e arrancou dos meus lábios um gemido. A névoa da inconsciência dissipava-se lentamente, revelando a realidade cruel: a luz ofuscante que se infiltrava por uma única fresta na parede de pedra e o canto úmido e frio que me cercavam.

O pânico me acertou como um punho gelado em meu estômago. Eu reconheceria aquela canção em qualquer lugar, em qualquer tempo. Gaios-áureos. Eu estava em Arcatia.

Arcatia.

No calabouço do palácio.

Mais precisamente, na cela mais profunda. A cela reservada para os piores criminosos, para os traidores da coroa. O lugar onde a esperança não alcançava e a luz do sol era apenas uma lembrança distante.

As poucas vezes em que estive aqui despertam os meus sentidos. Uma onda de desespero me invade, sufocando qualquer chance de fuga. O ar rarefeito está impregnado com um cheiro úmido e fétido. A luz, ou a falta dela, é uma preocupação constante. Preso. Aprisionado.

Eu fui capturado.

Tinha retornado ao lugar que um dia chamei de lar. As mesmas torres que presenciaram meus sonhos e aspirações agora se erguiam como sentinelas implacáveis, desafiando os céus. Embora os corredores abriguem memórias douradas da minha infância, as muralhas ainda eram impenetráveis se transformando em uma armadilha mortal se fechando em torno de mim.

Instintivamente, aperto meus olhos, hesitantemente. A única fresta de luz invadiu os feriu como lâminas incandescentes. Tento me acostumar à rudeza da luz e busco enxergar através da névoa que teima em embaçar minha visão. Aos poucos, a cela se revelou aos meus olhos. As paredes de pedra áspera e úmida acolhem o frio gélido e repulsa meu nariz.

As lembranças clareiam meus pensamentos.

Lembro de estar na casa, à espera do retorno de Callisto e dos piratas. O poder da árvore de pétalas lilás, uma promessa firmada com a existência de uma lenda, capaz de libertar Rhascourt e seus piratas da maldição que os assombrava. Lembro da imensidão castanha me encarando com os olhos incertos e cheios de dúvida. Rhascourt parecia hesitante, com medo.

ALGUM LUGAR DO OCEANOOnde histórias criam vida. Descubra agora