Novos Anjos Capítulo 4: A primeira briga

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Um mês se passou bem normalmente, quem pensa que temos tempo pra socializar ou fazer novos amigos se engana redondamente, nossas vidas são só estudar o dia inteiro, a maioria dos professores não dá folga pra dar um pio sequer, muita aula, lição e exercícios, estava sendo sufocante, pra aumentar o drama minha tia resolveu me dar de presente 2 h extras nas quintas feiras a tarde para aula de reforço. Segundo as palavras dela para me readaptar as aulas brasileiras.

Claro que exagerei um pouco, nesse mês pude conhecer um pouco mais de meus novos amigos e da turma em geral. Pra começo de conversa aquela turma do 7 A era conhecida como uma turma um pouco bagunceira, os professores viviam reclamando de muita conversa e pouco interesse e que a maioria dos alunos agora só queria saber de namorinhos e ficadas. Era a adolescência chegando, incrível como eles não entendem.

Eu pessoalmente me sentia um pouco peixe fora d'água, além de voltar de uma cultura diferente eu sempre me vi como a frente do meu tempo ,fui obrigado a amadurecer muito rápido, mais parecia um adulto em corpo de criança. Sim, eu tinha uma situação privilegiada com meus tios, mas minha vida anterior foi bem complicada. Eram memórias doídas que iam e vinham, nunca conheci meu pai, vivi na rua com minha mãe, passamos fome até o dia que vi ela morrer. Não tinha um só dia que eu não pensasse nela, não era nada incomum eu acordar chorando principalmente nos primeiros anos com minha nova família.

Hoje eu já estava mais calmo, minha tia como sempre era superprotetora e fazia tudo o que eu queria, as vezes eu até me pergunto pq eu nunca me aproveitei mais disso , acho que era porque eu amava demais ela, um sentimento forte de gratidão por tudo que ela me fez sem nunca me fazer grandes cobranças.

Eu pensava muito sobre gostar de garotos, será que era algo passageiro? Coisa da idade? Será que minha tia aceitaria? Os meus primos eu não fazia ideia, já tinha visto eles com meninas mas nunca nada sério, nos EUA dificilmente a gente tinha muitas relações fora da família.
Nesse tempo conheci um pouquinho mais dos meus amigos novos, o Arthur era um menino muito simples, vinha de uma família bem diferente da maioria dos alunos da escola, como aluno bolsista ele tinha uma escola de elite mas não tinha o mesmo padrão de vida. Muitas vezes eu me sentia culpado por tudo que eu tinha, ele era um menino alegre, super pra cima mesmo tendo tão pouco e eu tinha muito. Ao mesmo tempo eu achava tão fofo quando via ele no cantinho dele todo pensativo e tímido totalmente contrário ao primeiro Arthur que se via, ele era muito estudioso certamente dava valor aquela bolsa com orgulho.

Já o Flávio era sorridente o tempo todo, por mais que a gente não se falasse o tempo todo ele sempre buscava falar com a gente nos intervalos com aquele sorriso perfeito dele, me derretia todo. Mas também tinha um lado todo misterioso, as vezes ele sumia nos recreios e ninguém conseguia encontrar. Aquele dia foi um deles, busquei então o Arthur que estava quietinho sentado perto da cantina lendo um livro.

-Ei Arthur- chamei- Você viu o Flávio por aí?

-Ah, ele some as vezes né? Já vi que algumas vezes ele vai comer lanche lá na sala da mãe dele, mas tem algumas vezes que...
-O que? Indaguei.
-Nada não – respondeu dando de ombros.
-O que foi Arthur? Falei preocupado, você sabe de algo? Ele tá em alguma encrenca?
-Não é nada- falou- quer dizer... eu vi algo mas não quero ficar fazendo teorias nem sendo fofoqueiro, ele tem a vida dele né?
-Poxa, mas do jeito que você diz eu fico preocupado. Que tá acontecendo?
-Deixa pra lá, ah você vai se chatear se souber.
-Vou? É o que então?
-Para Paulo, não quero falar.
-Vai ficar com raiva por isso é? Bestão. Levantei a voz.
-Não grita por besteira, vai ficar com birra porque quer saber da vida dos outros, vai ficar de fofoquinha?
-Poxa, é isso que você acha? Indaguei com voz chorosa e baixando a cabeça.

Não sei o que deu em mim, ele levantou a voz de um jeito tão... sei lá...pareceu uma das vezes que eu lembro da minha mãe gritando comigo quando eu queria algo e ela não podia me dar, passávamos muita necessidade. Droga o momento não tinha nada a ver com esse de agora, eu não conseguia entender porque aquela memória me voltou a cabeça. Talvez porque pedi algo e não fui atendido? Ou eu tinha ficado tão mimado que não conseguia admitir ser contrariado? Só sei que no posterior segundo  desabei a chorar.

O problema é que o Arthur talvez por não acreditar que eu chorasse por tão pouco começou a me passar sermão.
Para de ficar se fazendo de pobrezinho aí, que coisa, parece um bebezão.
Cala aboca- respondi constrangido me levantando e mostrando minhas lágrimas.
-N- não...quer dizer... o- olha Paulo eu não...

Me levantei prontamente e saí caminhando sem deixá-lo completar sua fala, fui acelerando o passo enquanto ouvia sua voz me chamando ir ficando mais distante.

Tudo que eu lembro do momento seguinte é de estar numa cabine do banheiro sentado no vaso e me debulhando em lágrimas silenciosas. Passaram 2minutos, 5...10...perdi o senso de tempo quando ouvi a porta se abrir. Aposto que é o chato do Arthur -pensei me encolhendo silenciosamente para não ser descoberto.

Vem, bora entrar aqui rapidinho – ainda tem tempo antes do intervalo acabar e ninguém nunca vem pra esses lados- ouvi uma voz em tom baixo.
-Parece que não tem mesmo ninguém. Olha, vamos naquela cabine? Falou uma segunda voz.
-"Bora entrar?" "Vamos?" Como assim? São duas pessoas e acabaram de entrar na mesma cabine? Meu coração acelerou- fiquei com medo e ao mesmo tempo curioso, eram duas vozes de meninos.

Pra sorte de uns e azar de outros, eles entraram em uma cabine quase ao lado da minha, talvez umas 2 cabines de diferença. Dava pra ouvir sem sem ouvido, bastava eu respirar devagar.

-Vai, baixa aí, posso ver? Perguntou a primeira voz meio trêmula. Ouvi claramente um zíper abrindo e o som de tecido mexendo.
-Olha como ele tá duro agora, vai experimenta.
-Meu Deus – pensei suando frio. É isso mesmo? Teria alguém chupando o pinto de outro a poucos metros de distância de mim? E agora, o que eu faço? Talvez eu só estivesse deduzindo coisas demais.

Pra minha sorte não demorou 30 segundos e ouvi a sirene de fim do intervalo. Novamente as vozes voltaram apressadas.

-Que droga, eu jurava que tinha mais tempo, vamos, rápido.
E aí você gostou?
-Foi tão pouquinho, faz em mim na próxima por favor?
-Faço sim, prometo – ouvi um som que parecia um beijo. Quer dizer ..eu deduzi, quem era eu no auge dos meus 12 anos pra saber o som de um beijo? Mas finalmente saíram.

Voltei devagar para a sala de aula, pensativo sobre aquela rápida e bizarra experiência. Nem notei o Arthur ao fundo da sala me chamando. Sem querer dei uma ignorada meio malvada nele depois notei que ficou meio cabisbaixo mas não tentou mais chamar pela voz já que a professora chegou.

A aula foi passando bem devagar e monótona, depois de uns minutos uma bolinha de papel caiu na minha mesa. Atrás de mim vi uma colega, a Maria Eduarda discretamente apontando o dedo pro Arthur. Abri o papel.

-"Foi mal, desculpa"

Começamos a mandar bolinhas um pro outro.

-"Bobão" respondi com um desenho de carinha malcriada.

-"Isso é um sim ou um não?"
-Presta atenção na aula menino"debochei
-" Tá com raiva de mim?" Fez uma carinha 
-"E se estiver?" Provoquei

Estava esperando uma nova mensagem mas só ouvi um resmungo.

-Meninos- disse a professora – sala da diretoria agora.

Estávamos ferrados.
















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