Capítulo 01 : whisky duplo

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Sienna Cameron

Apertei o volante, me sentindo tensa. O silêncio dentro do carro era quase palpável, e eu não fazia ideia de como mudar aquela situação. Olhei para o espelho retrovisor, vendo o garotinho de cabelos loiros sentado no banco de trás enquanto fitava a janela. A cada dia que passava, eu sentia Caleb se afastando mais de mim. Não sabia mais o que falar ou fazer para mudar aquela expressão apática em seu rosto ou para fazer com que um sorriso surgisse em seus lábios. Talvez eu fosse uma mãe tão péssima quanto a minha. Talvez estivéssemos todos fadados a decepcionar quem amamos, inclusive a nós mesmos.

— Acho que foi melhor assim — disse, chamando sua atenção. — Talvez sábado que vem seu pai possa vir também.

Os olhos azuis, idênticos aos meus, me fitaram por apenas alguns segundos antes de se voltarem para a janela.

— Não quero que ele venha — murmurou com seriedade.

Seriedade demais para um garoto de apenas oito anos.

Suspirei, voltando-me para a estrada, vendo que o sol ainda brilhava no horizonte, prestes a se pôr. Não era para estarmos voltando para casa antes das dezenove horas, mas a apresentação da sala de Caleb havia sido adiada de última hora. Um dos alunos acabou passando mal apenas alguns minutos antes da apresentação. Jason, meu marido, havia ficado em casa, mergulhado em papeladas da prefeitura e, por isso, não pôde vir. Mas, pelo que parecia, Caleb não se importava com isso e tampouco queria que ele viesse. E isso me preocupava.

Estacionei o carro na frente da casa amarela de cercas brancas, que eu chamava de lar, e caminhei até a entrada, escutando os passos de Caleb atrás de mim. Quando a porta se abriu, minhas sobrancelhas se franziram ao notar a casa silenciosa demais.

Eu não precisei de muito para perceber que não estava apenas silenciosa, mas também vazia.

No quarto, o paletó de Jason estava esquecido sobre a cama de casal. Ao guardá-lo, um bilhete deslizou para fora do bolso, parando diante dos meus pés. Agachei-me, pegando-o entre os dedos. Nele havia uma hora marcada e um endereço, rabiscados com uma caligrafia que não era de Jason. O perfume doce, inconfundivelmente feminino, chegou ao meu nariz, fazendo meu coração acelerar, não pelo cheiro, mas pelo que ele representava. Amassei o papel entre os dedos enquanto lutava contra as lágrimas que ameaçavam se derramar, fazendo meus olhos arderem. Pisquei algumas vezes e respirei fundo antes de rumar para fora do quarto.

[...]

Meus pensamentos eram um amontoado de vozes altas e baixas, nítidas e desconexas, ecoando dentro da minha cabeça enquanto eu dirigia até o endereço do bilhete.

Meu carro avançava pelas ruas, ignorando sinais e limites de velocidade. Multas eram o menor dos meus problemas.

Cheguei a tempo.

A tempo de ver Jason, meu Jason, entrando em um motel com outra mulher. Uma mulher ruiva de cabelos curtos. Parada a apenas alguns metros de distância, vi meu marido conduzindo a mulher para dentro do local com a mão em sua cintura, a mesma mão que ainda exibia uma aliança.

E, por incrível que pareça, as lágrimas não vieram. A vontade de chorar estava lá, alojada no meu peito, mas ainda assim, as lágrimas não vieram. Talvez, depois de tanto tempo chorando, já não existissem mais lágrimas para serem derramadas. Diante daquela cena, eu sentia tudo e nada.

Me sentia anestesiada.

Entrei no carro, segurando com força o volante, enquanto ainda fitava a fachada do motel piscando em vermelho neon. Como se estivesse me provocando.

Sentimentos Proibidos : Sendo reescrito Onde histórias criam vida. Descubra agora