Capítulo 19

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Assim que o trinco foi aberto, a tampa da caixa se abriu, se inclinando tanto para frente que inevitavelmente acabou atingindo o chão com um estampido oco. No minuto seguinte, diversos espíritos saíram de dentro da caixa de madeira de modo apressado e começaram a voar rapidamente por entre os alunos do primeiro ano da Blackwood Academy.

Mantendo seus corpos rijos e completamente tesos, em uma tentativa de permanecerem imóveis, nenhum dos adolescentes moviam um músculo sequer enquanto os familiares os rodeavam a procura de seus devidos donos.

Pouco a pouco, cada um dos guias espirituais encontrava seus donos e formavam uma conexão de alma com os bruxos a quem pertenceriam. Alguns adquiriam a forma de pequenos e simples animais, como, por exemplo, coelhos ou cachorros de pequeno porte, enquanto outros se transformavam em animais maiores, tipo lobos ou até mesmo seres do mesmo tamanho que o cervo branco da professora de Adestramento, e criaturas mágicas.

- Imagino que devem se lembrar de como a conexão de alma entre bruxo e familiar é extremamente importante - Maya se pronunciou enquanto observava orgulhosamente seus alunos encontrarem seus familiares. Seus lábios sustentavam um sorriso contente - essa é uma conexão muito forte que interliga os espíritos com suas almas, conectando suas mentes e seus sentimentos com os de seus familiares. Desse modo, eles poderão sentir quando vocês estiverem em perigo ou precisando deles, independentemente de qual seja o grau de importância da situação - a brasileira explicou, caminhando calmamente pela arena e por entre os adolescentes.

Yandra respirou fundo em uma tentativa falha de relaxar, nenhum dos espíritos havia tentado chegar perto dela ainda e, por mais que tentasse manter a calma e dizer para si mesma que não tinha nada com que se preocupar porque tudo ficaria bem, a indiana já estava começando a ficar nervosa com a possibilidade de não conseguir encontrar seu familiar naquela aula. A aflição correndo por seus vasos sanguíneos se intensificava a cada segundo que se passava.

Sim, ela havia dito para Sasha ficar tranquila e que não existia motivos para a ruiva achar que iria ser a única a não encontrar seu familiar, até porque esses casos eram extremamente raros e muito difíceis de acontecer, mas ela mesma já estava começando a achar que entraria para essa pequena porcentagem de bruxos azarados que só se conectavam com seus guias espirituais depois de se formarem.

De repente, um vulto prata translúcido passou por ela, rodeando a morena algumas vezes antes de parar de frente para ela.

Os olhos azuis estrelados da indiana se arregalaram quando o espírito diante de si começou a se metamorfosear.

Enquanto a criatura ia tomando forma, Yandra sentiu uma estranha conexão sendo feito em seu interior. Era como se alguma coisa, ou alguém, estivesse se conectando com sua alma.

Foi preciso apenas alguns minutos para que a conexão de alma fosse realizada e a transformação do familiar fosse finalizada. Quando a bruxa de cabelos pretos ondulados piscou seus olhos, como se estivesse saindo de um transe hipnótico, um gato de pelagem preta como ébano e olhos incrivelmente azuis como o oceano estava parado de frente para ela carregando uma expressão entediada em seu rosto felino.

Hesitante, a garota de dezesseis anos se abaixou e lentamente esticou sua mão direita na direção de seu familiar, na intenção de fazer uma carícia leve na cabeça do bichano. O animal não se moveu, deixando que ela lhe tocasse.

Seus pelos negros como a escuridão eram macios, parecia que ela estava tocando em seda cuja o tecido era tão fluído como a água. Repentinamente, o gato virou água, rodeou o pulso da bruxa e subiu pela extensão de seu braço até que conseguisse chegar a seu ombro, repousando no local, já de volta a sua forma felina logo em seguida.

Tudo o que a morena conseguiu expressar diante de tal demonstração de magia foi um arregalar de órbitas e o escancarar de sua boca.

- Uau, um gato d'água! - Antonella exclamou, admirada, quando se aproximou de sua aluna - parabéns, senhorita Mishra - a professora a parabenizou, chamando Yandra por seu sobrenome - raramente os espíritos elementais se interessam em ser os familiares de algum bruxo, eu mesmo não tive tanta sorte, apesar de amar Edelweiss com todo meu coração e não o trocar por nada neste mundo - disse, lançando um olhar carioso para seu familiar. O cervo branco retribuiu com a mesma intensidade e emoção presente em suas orbes negras.

- Obrigado, senhorita Antonella - a indiana agradeceu, mantendo um tom formal em sua voz para se referir a bruxa mais velha. Suas bochechas esquentaram quando a brasileira lhe lançou um sorriso caloroso e gentil.

- Qual será o nome dele? - indagou, arqueando uma de suas sobrancelhas.

A morena franziu a testa e mordeu o lábio, adquirindo um ar pensador enquanto se esforçava para conseguir bolar um nome para seu familiar.

Minutos se passaram e ela ainda não havia conseguida ter uma ideia de que gostasse e parecesse ser boa aos seus olhos. Milhares de nomes passavam por sua cabeça, mas nenhum deles parecia ser bom o bastante para nomear o espírito. Um cujo significado fosse oceano ou escuridão, referente a seus belos olhos azuis e pelos pretos, não era o suficiente para ela, lhe parecia muito simples. Tinha que ser um nome especial, com um significado importante.

De súbito, uma ideia surgiu em sua mente, como um ponto de luz em meio a escuridão profunda.

Kalindi.

Imediatamente, Yandra sabia que aquela era a escolha perfeita que tanto havia procurado por aqueles minutos que mais pareceram ser horas.

Ainda sentindo a pelagem macia de seu familiar acariciando sua bochecha enquanto ele continuava repousando em seu ombro, a indiana fitou sua professora e sorriu alegremente para a mesma.

- Seu nome vai ser Kalindi - anunciou orgulhosamente, erguendo-se cuidadosamente para não acabar derrubando o gato sem querer.

Em seu ponto de vista aquele era o nome perfeito para seu familiar, afinal, Kalindi significa "Rio Yamuna", que é considerado sagrado na tradição hindu, tal qual sua ligação com o espírito.

- Belo nome - Maya elogiou, sorrindo gentilmente para a mais nova antes de se afastar e caminhar em direção a outro aluno.

A mágica das estrelas nos seus olhos (Clareira encantada: livro 1)Onde histórias criam vida. Descubra agora