Álvaro, Ágata, Ângelo e Ana foram recebidos pela família e compartilharam um jantar onde contaram suas histórias fantásticas, e era notável como aquilo havia os aproximado. No fim do jantar a rainha pediu a presença de Álvaro para ter com ela pela manhã na galeria.
- Sabe por que eu gosto de ter conversas importantes aqui? - ela perguntou ao neto quando eles se encontraram.
- Não, senhora - enquanto ele respondia ela se aproximou da estante de livros e pegou um deles, mas logo o príncipe notou que não se tratava de um livro e sim um caderno amarelado e envelhecido.
- É aqui que guardo isso - mostrou a ele. - O diário do rei Hugo. Me sinto mais sábia só de tê-lo por perto.
- Não sei se estou acompanhando - ele disse com a sobrancelha arqueada.
- Quando você me mostrou a pintura de Ângelo, isso me lembrou de algo que li no diário - ela folheou o caderno até encontrar a página que se referia. - "O príncipe do leste irá achar o amor em um jardim a oeste do oeste do oeste" - recitou.
- "Oeste do oeste do oeste"? Isso não faz sentido. Perdão, Vossa Majestade, sei que o rei Hugo foi um grande homem, mas ele não era...
- Tenha respeito! - ela interrompeu veementemente e Álvaro chegou a sentir o corpo enrijecer com a tensão. Por mais bravo que fosse, não havia ninguém que não se intimidasse com a própria rainha. - Sim, as profecias o tornaram paranóico, mas isso não as torna menos reais. Hugo teve acesso a um conhecimento mágico que mexeu com sua mente, e o mesmo aconteceria comigo se eu não tivesse Ravi em meus sonhos me orientando. Ele entende melhor do que todos nós como isso funciona - aquilo deixou Álvaro desconfortável, era de conhecimento apenas para os membros da família o laço que a rainha tinha com seu irmão adormecido, mas o assunto era tabu e ninguém sabia dos detalhes.
- Peço perdão, minha vó - ela assentiu, aceitando o pedido de desculpas.
- Você, dentre todas as pessoas deve levar isso a sério. O diário foi passado para o meu pai, que o ignorou, e depois para mim. Sua mãe sabe da existência dele, mesmo que nunca tenha lido, mas eu tento orientá-la sobre essa responsabilidade sempre que posso. E um dia essas profecias cairão em suas mãos também - Álvaro ficou arrepiado, ele gostava de se imaginar rei, mas não sabia que isso viria com um conhecimento capaz de enlouquecer um homem e muito menos que sua avó possuía esse conhecimento. Ficou em silêncio por alguns instantes imaginando o que a rainha sabia e qual o peso que isso tinha em suas decisões.
- Eu prometo que aprenderei sobre as profecias com cautela - Virgínia sentiu firmeza em seu tom de voz e se orgulhou do neto.
- Eu sei que acaba de voltar de viagem e lhe darei o direito de repousar, mas você deve se preparar para outra, bem mais longa. A moça da pintura usa roupas tradicionais de Yeotang, a milhares de quilômetros a oeste, e você deve ir até Cheon, a cidade mais a oeste do país.
- Entendo, mas a profecia diz que tenho que ir para o oeste três vezes. Onde fica esse jardim?
- Descubra.
Apenas dois dias depois da conversa, Álvaro rumou ao país distante. Foram vários meses de viagem, tanto por terra quanto por mar. Durante o caminho ele fez amizades com marinheiros, comeu iguarias variadas e apesar das inúmeras oportunidades que teve de experimentar breves romances, ele abriu mão desses prazeres por uma mulher que ainda não conhecia.
Ele gostaria de ter levado o quadro consigo, mas sabendo que não seria nada prático, optou por deixá-lo em Querates, mas não sem antes passar horas a fio o olhando sem parar, para não se esquecer de nenhum detalhe. Qualquer coisa na pintura podia ser uma dica de onde encontrar a moça e não havia um dia sequer em que ele não pensasse nela.
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Era dos Contos
FantasyEra dos Contos é uma releitura de contos clássicos dos irmãos Grimm e poemas épicos, todos passados em um universo de fantasia, mas aqui a história não acaba no felizes para sempre e nós acompanhamos os personagens durante todas as suas vidas, então...