Príncipe Hugo

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Hugo teve contato com a morte de pessoas queridas muitas vezes em sua vida. As primeiras vezes foram aos seus nove anos de idade, quando um ano repleto de perdas e luto caiu sobre a família.

Jay, seu bisavô, faleceu e não muito tempo depois foi Ülv, que com a saúde debilitada pelo envenenamento que havia sofrido décadas atrás, por fim não aguentou. Em seu leito de morte o homem, já passado dos sessenta anos, chamou por sua Abelhinha, que era como ele havia passado a chamar Rebeca depois de saber da história dela com o príncipe Carlo. Ele morreu nos braços de seu amor.

Alguns meses depois, Jocasta, tesoureira do reino e avó de Hugo, também se foi. Rebeca foi a que mais sofreu com esses golpes. Se tratava da morte de seu amado pai, seu leal marido e de uma mulher que havia sido muito mais do que apenas uma amiga. Após esse eventos, ela praticamente não foi mais vista, perdeu muito peso e ficou pálida e fraca, pois mal comia.

A estirpe real tinha de fato uma saúde de ferro, e eles possuíam uma atração maior do que o normal para a magia e o desconhecido, porém essa alta sensibilidade fazia com que eles ficassem especialmente vulneráveis em momentos de extrema tristeza, solidão ou tormentos da alma.

Virgínia por vezes desmarcou compromissos para ficar ao lado da filha em sua cama nesse momento difícil, para lhe fazer companhia e se certificar que ela comesse. Os filhos também a visitavam, Álvaro e Ágata trazendo seus próprios filhos para alegrar a avó, Ângelo, que era o que morava em um castelo mais distante também fez esse esforço, e Ana tentou até servir de sua sopa para a mãe, mas o que a princesa sofria ia além do que a colher que curava os enfermos podia ajudar.

Em um desses dias que ia visitar a princesa, Virgínia percebeu que Rebeca não acordava e não tinha mais pulso. Seu corpo ainda estava quente e a rainha não pensou em outra coisa senão em se debruçar sobre ela para sentir o seu calor antes que este fosse embora. Não foi capaz de chamar por ninguém, apenas a abraçou em silêncio.

A maldição de ter que enterrar um filho havia passado de Ana para ela, com a diferença de que Rebeca era a única que Virgínia tinha. Sua única filha e herdeira, a quem ela orientava e depositava sua fé. Virgínia acreditava que um dia Rebeca seria uma rainha melhor do que ela, pois a princesa tinha um perfeito equilíbrio entre a bravura e a compaixão. Era determinada, generosa, honesta e leal, tinha tantas qualidades que era difícil não pensar em todas elas enquanto a abraçava. Em seu silêncio pensou nas palavras não ditas e nas palavras que não foram ditas o suficiente. Será que Rebeca sabia da dimensão do amor e do orgulho que a mãe tinha por ela?

Esses pensamentos foram interrompidos quando uma criada deixou cair a bandeja com o café da manhã ao se deparar com a cena.

A rainha ficou tão abalada que sua sanidade foi posta em questão por alguns no futuro, pois às vezes ela se esquecia do que tinha acontecido e falava da filha como se ela ainda estivesse viva. O que acontecia era que Virgínia tinha uma ligação muito forte com o mundo dos sonhos e passou a sonhar vividamente com Rebeca frequentemente, a ponto de confundir seus sonhos com a realidade. Os encontros com Ravi também pararam por completo durante muitos anos, o que a deixava ainda mais desorientada.

Hugo preservava boas memórias dos avós, como quando Rebeca passou pomada em seu joelho depois de ele cair tentando subir em uma árvore, tinha cinco anos e fez birra só aceitando que a vovó o tratasse. Já com Ülv ele ouviu as lendas mais fantásticas sobre Ranullr e aprendeu sobre sua história e mitologia.

O último avô vivo de Hugo, Roger, era também o mais velho de todos e este faleceu quando o príncipe tinha treze anos, deixando a vaga de conselheiro da rainha para Túlio. Foi então que a família que antes vivia em seu próprio castelo, voltou à corte da capital permanentemente e o pré adolescente ficou ainda mais próximo de seus primos mais novos.

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