Capítulo 43: Você não foi um acidente.

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Estou tão nervosa que estou enjoada desde que acordei. Não é normal eu me sentir assim, mas consumo ficar imaginando várias coisas erradas acontecendo quando tenho alguma coisa importante no dia. A questão é que meu aniversário era hoje. 17 anos era quase um marco na minha vida, já que eu ainda estava precisando suportar o meu pai.

Hoje, mais do que qualquer outro dia, estou desejando que ele saia de casa a tarde e não volte até a manhã seguinte. Ele já tinha feito isso algumas outras vezes, então não seria totalmente uma surpresa. Além do fato de eu não esperar que ele se lembre do meu aniversário. Não quero que ele atrapalhe absolutamente nada hoje, muito menos a Suellen.

Passei o dia todo perambulando pela casa, tentando arrumar qualquer coisa fora do lugar, sendo que eu nem mesmo tinha toque com essas coisas. Mas eu me sentia incomodada, porque estava com medo de alguma coisa sair errada. Léo deveria ter chegado hoje de manhã, porque os jogos já tinham começado. Mas não havia qualquer sinal do ônibus ou dos colegas dele na escola, além de ele e Rodrigo terem parado de responder minhas mensagens.

Quando começou a anoitecer, tinha quase certeza que aquela era a forma de o universo mostrar mais uma vez que em odiava. Eu nem mesmo deveria estar tão incomodada com o fato de eles não me responderem. Mas era meu aniversário e os dois tinham prometido que viriam. Os últimos dias tínhamos falado tanto por ligação que eu não conseguia pensar em um momento que eu não queria estar falando com eles.

—Você não parece muito animada. —Camila murmurou, escorando o queixo na minha cabeça enquanto me abraçava por trás. Eu estava sentada na frente do espelho e ela atrás de mim, arrumando meus cabelos. Então vi os olhos dela procurarem os meus com uma pergunta silenciosa.

—Estou animada. Só estou ansiosa. —Dei de ombros, como se eu não entendesse de onde vinha esse sentimento, mesmo que fosse uma mentira. —Os outros já chegaram?

—A Manu e o Bernardo avisaram que estavam vindo já. O Felipe respondeu que a Júlia ainda estava se arrumando. —Camila voltou a mexer nos meus cabelos, enquanto eu assentia de leve, sentindo um gosto amargo na minha boca. —Você está esperando mais alguém?

—Não, claro que não. —Soltei uma risada, balançando a cabeça negativamente como se aquilo fosse uma bobagem. Mas Camila me olhou pelo espelho, como se soubesse que eu estava mentindo. —Estou com medo do meu pai estragar tudo.

—Se ele chegar, a gente finge que ele é invisível. —Camila sugeriu, e eu acabei rindo, mesmo que não fosse tão fácil assim. Fechei meus olhos enquanto ela terminava de arrumar meu cabelo, antes de pegar o estojo de maquiagem e sorrir pra mim.

Tinha aceitado aquilo depois de ela insistir muito, assim como o vestido preto que ela tinha insistido que eu usasse. Acho que a Érika de 16 anos estaria revirado os olhos se me visse tão arrumada assim. Mas eu tinha sentido vontade de me arrumar um pouquinho mais, porque estava me sentindo diferente.

[...]

Camila tinha descido para ajudar Eduardo a arrumar as coisas na mesa, além da decoração fofa de balões que eles tinham resolvido encher durante a tarde, mesmo que eu tivesse resmungado que era coisa de crianças. Ainda não tinha tido coragem de descer, porque não queria que meu irmão me visse. Na verdade, não queria que ninguém me visse.

O vestido preto de alcinha ia até meus joelhos e Camila tinha feito um ótimo trabalho no meu rosto, porque eu estava realmente bonita. E ela tinha deixado meus cabelos mais ondulados que o normal, além das duas tranças pequenas que ela tinha feito bem em cima, prendendo atrás como uma coroa. Não era eu que eu via quando olhava no espelho e sabia que todo mundo notaria.

Camila — Eles já estão quase chegando.
Desce aqui.
Eu bato no seu irmão se ele for um idiota.

Soltei uma risada ao ler as mensagens de Camila, engolindo em seco antes de ficar de pé e caminhar até a porta. Hesitei antes de sair, sentindo minha barriga gelada e minhas mãos soando. Engoli aquela ansiedade e sai do quarto, porque eu nunca tinha sido covarde daquele jeito. Não podia virar agora.

Desci as escadas escutando a música eletrônica que Eduardo provavelmente tinha colocado, observando os balões espalhados pelo chão da sala, que eles não fizeram questão de prender pelas paredes. Eduardo estava afastando um pouco o sofá, abrindo mais espaço para a mesa onde estava o bolo quando me escutou chegando.

—Finalmente, pirralha. Achei que ia ter que te arrastar lá de... —Ele olhou pra mim de relance, continuando a empurrar o sofá, antes de parar de olhar pra mim como se tivesse levado um susto. Apertei meus lábios quando vi a surpresa nos olhos dele, como se ele jamais esperasse me ver daquele jeito.

—O que foi? —Questionei, esperando que ele fizesse alguma piada idiota. Mas Eduardo piscou algumas vezes e balançou a cabeça negativamente, abrindo um sorriso fraco.

—Nada, eu só... Acho que não tinha me dado conta até agora do quanto você cresceu rápido. —Afirmou, e dessa vez foi a minha vez de ficar surpresa, porque Eduardo falou aquilo como se esperasse que eu nunca deixasse de ser a irmãzinha criança dele. —Ainda me lembro quando nossa mãe chegou do hospital com você e a colocou no meu colo. Eu tinha 6 anos e morria de medo de derrubar você, porque você era tão pequena e parecia tão frágil.

Eduardo parou de falar, desviando os olhos de mim para o chão, como se tivesse voltando as lembranças daquela época. Infelizmente eu não tinha nada sobre esse tempo, porque era pequena demais pra me lembrar. Mas ouvi-lo falando me fez desejar ter o poder de lembrar.

—Eu sei que as vezes você pensa que eles não queriam você. Que você foi um acidente. Mas você não foi, tá? —Eduardo me encarou de novo, abrindo um sorriso que soava como se ele não soubesse como dizer aquilo. —Eu costumava pedir por um irmão antes de você nascer. Eu via meus amigos na escola com os irmãos e achava tão legal. Ficava morrendo de inveja. Eu cheguei a pedir isso de presente de Natal. Tipo, literalmente escrevi isso pro papai Noel em uma carta.

Soltei uma risada, o que fez Eduardo rir também, mesmo que parecesse um tanto envergonhado por contar aquela parte da vida dele que eu não fazia ideia. Depois que minha risada parou, junto com a dele, eu fiquei sem saber como reagir aquilo, sentindo algo se agitando no meu peito,

—Eu irritei muito eles porque queria muito mesmo um irmão. Então você não foi um acidente ou qualquer coisa do tipo. Eles planejaram um segundo filho. Então quando você pensar que eles não te queriam ou sei lá... —Eduardo balançou a cabeça, abrindo um sorriso que soou quase doloroso. —Eu quis você. Sempre e isso nunca mudou.



Continua...

Todas as ondas do amor / Vol. 4Onde histórias criam vida. Descubra agora