Capítulo 9: Do que você gosta?

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Depois de uma hora, Érika estava me encarando como se quisesse me matar. Tinha tentado ensinar a ela um pouco de xadrez, antes de ela fugir para a cozinha murmurando que estava com fome. Fui atrás dela, a ajudando a assaltar a geladeira. Érika ainda resmungou sobre eu parecer uma sombra atrás dela.

—Meu pai vai chegar daqui a pouco. Deveria ir embora —Afirmou, me fazendo olhá-la com as sobrancelhas erguidas, antes de roubar algumas pipocas da travessa que ela estava segurando.

—Você prometeu que não ia me expulsar. —Retruquei, fazendo-a soltar uma risada e balançar a cabeça negativamente.

—Não estou te mandando embora, apesar de que você deveria sim ir embora. Só estou tentando lembrar do fato de que meu pai não pode te encontrar aqui. —Ela me lançou um olhar carregado, como se esperasse que eu me engasgasse com a pipoca que eu estava roubando dela. Abri um sorriso, antes de ignorar o que ela estava falando.

—Presta atenção, pirralha, estou tentando te ensinar a jogar. Talvez assim você não perca tão vergonhosamente pra mim quando tentamos jogar pra valer. —Falei, erguendo uma das peças e batendo na testa dela de leve, quando a vi revirar os olhos. —A rainha é a peça mais poderosa do jogo de xadrez. Você pode movê-la em todas as direções, quantas casas quiser.

—Eu sei o que cada peça significa, seu besta. Não sou tão burra assim. —Ela roubou a rainha das minhas mãos, antes de batê-la na minha testa, da mesma forma que eu tinha feito com ela. —E isso é muito tedioso.

—Assim você me magoa. Xadrez não tem nada de tedioso. —Afirmei, vendo-a me lançar um olhar sarcástico, como se estivesse se segurando para não dizer uma coisa pior. —Tudo bem, então me fala, do que você gosta?

—Por que quer saber? —Questionou, parecendo um pouco sem graça com a minha pergunta, como se ninguém nunca tivesse se interessado por isso antes.

—Estou te mostrando uma das coisas que eu mais gosto de fazer. Pode me mostrar as suas também. —Dei de ombros quando ela me encarou desconfiada, enfiando um punhado de pipoca na boca, antes de olhar pra tv, parecendo não querer me encarar. Ela estava fazendo muito isso essa noite. Toda vez que eu procurava os olhos dela, ela evitava olhar pra mim, sendo que antes ela sempre me encarava como se eu fosse um desafio.

—Gosto de livros, doramas e surfe. —Falou, muito, muito baixo. Precisei me inclinar um pouco para perto dela para entender o que ela tinha dito, antes de abrir um sorriso. —Do que você gosta além de xadrez?

—Futebol, tatuagens e estou pegando gosto por música depois que seu irmão começou a me ensinar a tocar bateria. —Érika olhou pra mim com a menção do seu irmão, com os olhos adquirindo um brilho diferente, como se ela desejasse que ele estivesse ali. —Estou pensando em pedir uma bateria para os meus pais. Presente de 18 anos.

—Quando é o seu aniversário? —Érika questionou, quase no automático.

—21 de dezembro. —Falei, vendo-a torcer o lábio como se estivesse se segurando para não sorrir, enquanto eu erguia as sobrancelhas. —E o seu?

—19 de agosto.

—É daqui a algumas semanas. —Constatei, e Érika confirmou com a cabeça, me lançando um sorriso torto. —Vai ser depois das duas semanas de pausa dos jogos. Eu vou ter acabado de voltar.

—Está tentando se autoconvidar pro meu aniversário? —Questionou, e eu acabei soltando uma risada, gravando aquela informação na minha cabeça, porque sabia que não podia esquecer daquela data.

—Bah, você vai me deixar de fora da sua festa, pirralha? —Indaguei, levando a mão ao coração como se aquilo o partisse ao meio. Érika riu, revirando os olhos, antes de empurrar meu ombro.

—Não é como se você não fosse invadir minha festa se não fosse convidado. —Retrucou, e eu dei de ombros tentando passar o ar mais inocente de todos. Érika parou de sorrir, encarando a travessa de pipoca no seu colo, que tinha sido esquecida. —Nem vai ter festa. Provavelmente eu nem vou poder sair de casa nesse dia. Meu pai não vai deixar que eu me divirta nem no meu aniversário.

—E quem disse que ele precisa deixar ou não? —Questionei, me inclinando para perto de Érika, o que a fez olhar pra mim com aquela expressão desconcertada. Roubei a rainha que ainda estava nas mãos dela, usando-a para tocar a ponta do seu nariz. —Você está de castigo, certo? Não pode sair de casa se ele não deixar. Então pode fazer a festa acontecer aqui.

—Ele não vai permitir. —Érika insistiu, antes de hesitar por um momento, olhando para a casa ao redor, abrindo um sorrisinho que eu conhecia muito bem já. —Na verdade, eu não preciso pedir a autorização dele. Ele disse que eu não podia sair de casa, mas não falou nada sobre eu trazer pessoas aqui.

Érika pareceu animada de verdade pela primeira vez na noite, a ponto de se inclinar e apertar uma das minhas bochechas com força. Aquilo me pegou totalmente desprevenido, porque eu estava ocupado demais encarando o sorriso enorme que estava nos lábios dela, além do brilho travesso nos seus olhos.

—Obrigado, esquisito. —Érika se afastou, enquanto eu erguia a mão e esfregava minha bochecha onde ela havia apertado, ignorando o calor que se concentrava no meu rosto. —Até que você está tendo umas boas ideias ultimamente.

—Acho que você está tentando me elogiar, me ofendendo ao mesmo tempo. —Comentei, fazendo Érika sorrir, enquanto eu observava o rosto dela, sem conseguir desviar o olhar.

—Não quero que seu ego fique grande demais. —Érika checou a hora no celular, torcendo os lábios em resignação antes de voltar a olhar pra mim. —Juro que não estou te expulsando como ontem, mas você precisa mesmo ir. Meu pai já deve estar quase chegando.

Olhei para a hora, sabendo que ela estava certa, mesmo que eu não quisesse ir. Mas já tinha passado da meia noite. Não podia demorar demais, porque mesmo sendo sábado, eu ainda tinha jogos de manhã e à tarde. Não queria receber um puxão de orelha do professor por não estar dormindo direito. O campeonato era importante pra mim e eu precisava me concentrar pra vencer.

—Amanhã a tarde então? —Questionei, só pra ter certeza que Érika queria mesmo fazer aquilo e que iria me esperar. Comecei a juntar o tabuleiro de xadrez no sofá, catando as peças espalhadas, enquanto sentia os olhos dela me observando. Tentei não me incomodar com isso, mesmo que minha pulsação disparasse sempre que ela olhava pra mim. —Tudo bem se o Rodrigo ir junto?

—Claro, mas eu só tenho duas bicicletas. —Afirmou, e eu mordi o lábio para não sorrir com a ideia que passou pela minha cabeça.


Continua...

Todas as ondas do amor / Vol. 4Onde histórias criam vida. Descubra agora