— Quantas moedas temos? — perguntou Gabriel.
Ambos andavam na rua indo em direção a placa de entrada da cidade. Gabriel se empolgou com a ideia de usar roupas comuns pegando assim as mais exageradas sendo uma camisa verde neon, uma calma apertada do joelho para cima com a canela larga lembrando uma barra de vestido da cor laranja também néon, e um par de tênis beges. Era a pessoa mais colorida da rua, talvez de toda a cidade. Naomi andava ao seu lado contando as moedas em sua bolsa de couro curtido. Fora mais modesta na escolha da vestimenta como que para compensar o parceiro, sendo uma camiseta vermelha desbotada, uma causa azul bebê e tênis azul escuro.
— Setenta e quatro. — respondeu quando conferiu uma segunda vez.
— Deve dar para um bom tempo.
O rapaz fazia questão de mexer muito as pernas na hora de andar para fazer a calça sacudir de forma espalhafatosa, e pela sua feição ele estava realmente achando incrível.
— Naomi! — exclamou Gabriel, muito animado. — Essa calça com um sobretudo seria uma das melhores coisas do mundo!
— Não. Não, seria.
— Você não entende nada de moda. — Fazendo questão de sacudir ainda mais as pernas enquanto andava, Gabriel se vira para a sua parceira. — Te garanto que os Antigos iriam concordar comigo, eles entendiam das coisas afinal criaram o sobretudo.
— Eles quase se extinguiram e destruíram o planeta em uma guerra nuclear por motivos mesquinhos — retrucou Naomi.
— Ok, eles entendiam de algumas coisas.
Naomi soltou o ar de forma divertida, a estranha obsessão de Gabriel por sobretudos era algo engraçado, mesmo ele nunca tendo vestido um. Ambos andavam lado-a-lado com suas mochilas nas costas, a Corva levava um colchonete enrolado preso por um barbante em suas costas onde escondia sua katana e facas de combate, Gabriel por sua vez levava somente uma bolsa comum, o lado bom de usar um arsenal de Corvo comum era sua praticidade.
Passar pelas ruas sem chamar a atenção era algo totalmente novo para Naomi, claro que não totalmente pela extrema escolha de vestimentas do rapaz a seu lado, mas ainda assim não receber olhares intensos ou de medo era algo bom.
— Jonas falou que iriamos com a mesma caravana da última vez, certo? — perguntou Gabriel somente para tirar a dúvida, e quanto teve um aceno positivo de Naomi a sua pergunta continuou. — Deve ser o Nasor!
— Espero que não estejam irritados com você ainda.
Gabriel abriu um sorriso amarelo, ao lembrar de que assustou a todos dando alguns tiros para cima, na época tentou avisar que somente fez isso para espantar alguns bandidos, o que não mudou em nada seu tratamento no resto da viagem.
— Não! — disse Gabriel otimista. — Duvido que tenham guardado mágoa. Espero.
O resto do caminho seguiu sem problemas, tirando o fato que agora as pessoas não tentavam se distanciar deles por serem Corvos, o que custou em quinze minutos a mais do que teriam demorado somente dez. Então chegaram.
O aro de entrada da cidade estava aceso e escrito em luz neon era possível ler: Cova 34. Um aglomerado de pessoas rodeava o local esperando pelo início da peregrinação da comitiva até a outra cidade. Naomi contou quinze carroças de bois, lembrava serem mais. As carroças já se encontravam em fila indiana com dois touros a frente de cada. Era possível ver os músculos se contraírem nos animais, como se estivessem ansiosos para começar a viagem. Pessoas gritavam por cima dos veículos uma com a outra, e algumas crianças corriam de animal a animal vendo se estavam bem presos.
Gabriel passou os olhos pela comitiva procurando por Nasor o achando na primeira carroça conversando com uma Corva, ao se aproximar mais conseguiu distinguir Strazza e dois outros que não sabia os nomes, deviam ter chegado em sua ausência. Ver Strazza foi uma surpresa, causando uma pequena estranheza no rapaz, pois a Corva era responsável pela manutenção dos veículos do Ninho, se a própria estava saindo era porque precisava de algo que não poderia confiar em um leigo para trazer.
Duas das crianças começaram a discutir repentinamente perto de um os animais, o mais novo um garoto falando que o nó não estava como era para ser, já a mais velha uma garota jurava de pés juntos que não havia nada de errado, foi preciso a intervenção de um adulto para que ambos não se atracassem, o que rendeu risadas de todos a volta.
Os Corvos se afastaram um pouco de Nasor, para verem como estava indo os preparativos, parando um momento na dupla recém-chegada, e então voltaram a se focar na vistoria novamente, Gabriel igual aos dois sabia bem o motivo de não demonstrarem os conhecer, talvez ele, eles realmente não soubessem quem fosse, mas Naomi era impossível não saberem. O motivo dessa imagem de ignorância vinha da época de treino, quando avistar um Corvo trajando algo diferente de seu uniforme, era porque estava em alguma missão da qual precisasse de descrição.
Strazza passou a menos de dois passos da dupla disfarçada sem demonstrar o menor interesse, sumindo no fim da caravana.
— Então chegaram! — falou uma voz de forma calorosa.
Nasor veio em direção a ambos, dando tapas calorosos nos ombros de Naomi, e parando por longos segundos analisando o estilo de Gabriel. O velho líder de caravana não envelheceu nada no último ano, dizer que estava igual seria mentira, pois o homem emagreceu muito.
— Faz algum tempo! — respondeu Gabriel animado. — Estava esperando a gente?
— Bom — retrucou se aproximando para sussurrar o resto. — Um pedido do próprio líder de um Ninho é difícil de recusar.
Vendo a dupla ficar sobressaltada com a mesão de serem Corvo, o homem somente riu dando palmadas nos ombros dos dois. Dizendo na sequência.
— Fiquem tranquilos, não vou falar nada. Como eu disse agora mesmo, foi um pedido do líder de vocês, então é melhor que ele fique me devendo do que eu a ele.
— Continua meticuloso. — comentou Gabriel com um sorriso felino. — Bom, já que seus convidados de honra chegaram, a caravana pode partir.
— E você continua engraçadinho como sempre — falou Nasor com o mesmo sorriso do Corvo. — Só tente desta vez não atirar para cima, não foi muito inteligente da última vez.
— Vou fazer meu melhor! — disse Gabriel.
Ele não havia esquecido do acontecido, pensou o rapaz um pouco sem graça.
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Corvos
Science FictionA Terceira Guerra dos Antigos fez a humanidade perder toda a glória, obrigando os sobreviventes a se esconderem no Bunker. Setecentos anos passaram desde o acontecimento, e para manter a ordem o grupo armado Corvos foi criado.