Não era incomum ver Norah reclamar. E naquele momento o alvo da irritação era o clima, que estava demasiado abafado, mesmo para o rotineiro inverno quente do Rio de Janeiro. Ela caminhava pela calçada ao lado de suas únicas e suficientes amigas, Jéssica e Angelina, que igualmente amaldiçoavam o calor enquanto abanavam as mãos sobre si mesmas.
— Ligaram o maçarico hoje? Não tem como ficar de bom humor assim – Norah revirou os olhos.
— Nem me fala! Estou irritadíssima em usar esse uniforme – reforçou Jéssica.
As três usavam o traje da escola, uma calça jeans e uma camisa branca com o símbolo do colégio. A peça que cobria as pernas do trio era mais justa no corpo, de forma que a silhueta fosse modelada sem exageros. A camisa seguia o mesmo raciocínio, não exibindo qualquer parte larga.
Norah mexia com impaciência no laço com presilha que estava na cabeça, tentando afastar os fios loiros e brilhantes que insistiam em grudar no rosto.
— Estou morrendo de fome – disse Angelina, ao olhar o relógio-pulseira preto.
— Pelo menos naquela droga de galeria tem ar-condicionado e algumas opções de comida. Não quero comer o de sempre hoje – retrucou Norah.
— Não vejo a hora de chegar – disse Jéssica, prendendo o cabelo ruivo, liso e comprido em um rabo-de-cavalo.
— Ultimamente as coisas lá em casa estão insuportáveis. Ainda prefiro comer na rua do que em casa, mesmo com esse calor nojento – resmungou a loira. – as coisas lá estão cada vez piores. Estou sem paciência.
— A cretina da sua madrasta já mudou para lá? – perguntou Angelina.
— Nem sonhando! A Emília só vai morar lá depois que casar.
— Não engulo aquela sonsa – disse Angelina.
— Ninguém gosta dela. Só o meu pai.
— Ah, ela até que tem uma personalidade interessante – zombou Jéssica.
— Você é ridícula – Angelina riu. A ruiva também.
— Aquela vadia solteirona é má – disse Norah.
— Solteirona ela já não é faz tempo, fofinha – disse Angelina ao girar o dedo indicador no ar, apontando para Norah.
— E ainda vai infernizar a sua vida quando chegar – a ruiva reforçou.
— Meu pai é um trouxa, isso sim.
— Trouxa é o esquisito do seu irmão. Aquele infeliz deve ser adotado. Não é possível. Aliás, você e ele vão rodar em breve. Contagem regressiva para a chegada da madrasta cheia de estilo! – a voz carregada com o deboche de Angelina violentou os ouvidos de Norah.
— Estilo? Aquela mulher é uma brega. Se veste como um trapo. Exagerada, histérica. Ai, como me irrita! Acorda, Angelina, estilo quem tem somos nós. Ninguém do primeiro ano se mete com a gente. Todas querem estar em nosso lugar.
— Ah, é verdade – disse Jéssica fechando os olhos e inclinando a cabeça para o céu azul e quase sem nuvens. – todas-querem-ser-como-a-gente.
— Querem, mas não vão ser, meu bem – Angelina ajeitava a flor de pano branca que começava a cair do cabelo.
— Não posso fazer nada se esse pessoal não tem o mesmo berço que eu. Imagina se eu vou me misturar com os retardados das outras turmas. Nem meu irmão, que tem meu sangue, é bom o bastante para estar perto de mim. De nós – o tom frio da voz de Norah poderia impactar alguém que ouvisse de fora, mas era banal para as duas amigas.
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Os Descendentes e a Ferida da Terra (Livro Um)
FantasyA Ferida da Terra precisa ser contida. O tempo corre. A situação piora. Mas o que ela é, Ian não sabe. Ele não sabia nem mesmo da existência de um novo continente, vizinho ao Brasil, assustadoramente mascarado por uma magia que não poderia ser denom...