Capítulo 29 - O Rabisco

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Era intervalo do recreio e Rafaelo estava caminhando para a sala de Ian e Higino. O caminho não era longo. Ele era da turma três e os dois garotos, da um. Logo, eram apenas duas portas depois, no mesmo corredor. Foi lá que combinaram de se encontrar, depois dele ter recebido uma ligação de Norah na noite anterior.

Segundo a menina, eles tinham encontrado um caderno de anotações da mãe e adentraram a madrugada folheando as páginas, buscando alguma pista que pudesse ajudá-los a enfrentar Zero. Norah não entrou em detalhes e isso fez Rafaelo custar a dormir. A ansiedade foi a companhia dele por longas horas até o sono finalmente chegar.

O menino não notou que dois alunos da mesma sala que ele tinham saído antes e estavam parados na frente da porta da turma dois e quando viram Rafaelo, fizeram questão de caminhar na direção contrária do menino. Distraído em pensamentos, ele sentiu um tranco no ombro, como se outro ombro tivesse batido no dele.

Ele não estava errado. O dono do outro ombro, inclusive, era um rosto tristemente familiar: Manolo passara por ele, com Cássio ao lado. Os olhos de Rafaelo encontraram os do loiro, que faiscavam raiva.

— Toma cuidado, traíra! – disse o menino, alto. Mas o burburinho entre os alunos alvoroçados pelo recreio era tão grande que Manolo não foi ouvido por quase ninguém. Rafaelo, no entanto, tinha entendido cada parte da frase, mas preferiu ignorar e chegar até a sala de Ian e Higino.

Quando os dois amigos apareceram na porta, Rafaelo notou que a noite tinha sido longa para eles também. Olheiras começavam a aparecer nos rostos cansados. Especialmente Higino, que ainda ficou mexendo no caderno mesmo depois que Norah pegou no sono. Os dois irmãos dormiram no chão do quarto da menina e o corpo naquele dia reclamava com dores pela má postura. O tímido magricela segurava o caderninho da mãe.

— Você está horrível – disse Ian, ao ver Rafaelo.

— Nada que atrapalhe meu charme – ele brincou, embora tivesse um fundo de verdade.

— Nenhum de nós conseguiu dormir, direito, né? – Higino comentou.

Os outros dois assentiram.

— Onde está minha irmã e Mabel?

Assim que Higino fez a pergunta, viu Mabel saindo da quarta sala e quando passava na frente da segunda turma, Norah também saiu. As duas chegaram juntas no parapeito da primeira sala, onde o trio de meninos estava.

— Vocês estão com umas caras péssimas – disse Mabel rindo, que estava com o cabelo preso em um rabo-de-cavalo. Os fios mais curtos perto da nuca davam voltinhas no pescoço e Ian ficou vermelho ao achar aquilo lindo.

— Ha ha ha. Olha quem fala. Nem sua beleza está te ajudando a disfarçar a ansiedade. Posso sentir o cheiro da sua agitação daqui – disse Rafaelo com deboche.

— Eu estou me roendo de curiosidade para saber o que vocês viram nesse caderno! – ela disse.

— Melhor a gente sair daqui – disse Norah, sombria. – não podemos expor esse caderno e muito menos os nossos segredos.

— Pensamos muito se a gente trazia isso para cá ou não. É um item valioso, além de ser a última recordação da nossa mãe – disse o menino.

— Vamos até o pátio. É mais disperso de alunos – sugeriu Ian.

Os cinco caminharam apreensivos pelo corredor do primeiro andar e olhavam atentos os outros alunos enquanto desciam pelos lanços de escada. Havia uma sensação de segredo obscuro no ar. Aquele mistério que ninguém podia contar, que era sério e grave ao mesmo tempo, que apenas aquele quinteto, no meio de tantos alunos, sabia o que era.

Os Descendentes e a Ferida da Terra (Livro Um)Onde histórias criam vida. Descubra agora