— Ela disse o que eu acho que disse? – perguntou Ian para os outros, mas Mabel, Higino, Norah e Rafaelo estavam tão atônitos quanto ele.
— Eu... – Mabel tentou responder.
— Ela é sua avó? – Higino perguntou.
Mas Ian não conseguiu dizer nada. Era inconcebível demais. Inacreditável demais. Julliette, a velha desprezível e esquisita, tão fria quanto má, era avó dele.
Norah não percebeu que a boca estava aberta e o queixo caído pela surpresa.
— Ela é minha... avó? – ele perguntou para si mesmo.
— Foi o que ela disse – Rafaelo cortou a perplexidade dos outros.
— Meu pai – Ian respondeu. – meu pai foi embora quando a gente ainda era muito pequeno. Eu não lembro dele e meu irmão menos ainda. Nem fotos ele deixou, sabe?
Mabel se aproximou, dando-o um meio abraço. O rosto redondo e as bochechas estavam em chamas de tão vermelhas. Ele continuou:
— Nós nunca conhecemos a minha avó paterna, nem mesmo a minha mãe. Só pode ser ela. Minha avó materna eu e Miguel chegamos a conhecer.
Ele sentiu um embrulho no estômago ao ter o pensamento de que, sendo assim, Emília era sua tia.
— Não sei o que dizer – comentou Higino.
— Estou chocada – disse Norah.
— Emília... aquela mulher nojenta... minha tia. Minha família. Que nojo!
E toda a sensação de repulsa no coração de Ian também foi sentida por todos.
— Eu fui atacado por ela. Atacado por alguém que disse ser da minha família. Isso não se faz. Não se faz!
Todos estavam pensativos e não tinham o que dizer, embora quisessem muito confortá-lo. Ele continuou o desabafo:
— E ainda disse que viemos aqui como eles previram. Estamos aqui porque eles queriam que estivéssemos. Nos conduziram para cá sem a gente saber – ele andou até a beirada do precipício e gritou, enchendo os pulmões de ar tanto quanto conseguiu. – O QUE VOCÊS QUEREM DE NÓS, SEUS MALDITOS?
A voz alcançou o céu e desapareceu em um eco carregado de lamento e raiva. Em seguida, seu ombro foi tocado e apertado de leve. Era Norah.
— Vamos ficar bem – ela sorriu com tristeza. Ele assentiu. Quando ele virou, todos estavam sorrindo para ele. Era um sorriso pesaroso, mas ainda assim, sincero e repleto de cumplicidade.
Higino sentiu um pontada de raiva, ele não soube o porquê, mas tinha a ver com Julliette. Ou talvez com Emília. Elas eram da família de Ian, seu grande amigo. E a velha estava envolvida na morte de Caroline. Era uma raiva densa, diferente. Não era cega ou rebelde.
— Temos que continuar e seguir o caminho que as luzes indicaram – disse Rafaelo.
Eles concordaram e começaram a andar para a lateral de onde estavam e descobriam atrás de algumas rochas altas e sangrentas um caminho irregular que descia. Não conseguiam ver se levavam direto ao local onde as luzes de Rafaelo indicavam, mas acreditavam que sim.
Pé ante pé eles foram descendo, evitando as poças vermelhas e viscosas e o toque nos filetes de sangue, fresco ou seco, que permeavam as rochas alaranjadas e terrosas.
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Os Descendentes e a Ferida da Terra (Livro Um)
FantasyA Ferida da Terra precisa ser contida. O tempo corre. A situação piora. Mas o que ela é, Ian não sabe. Ele não sabia nem mesmo da existência de um novo continente, vizinho ao Brasil, assustadoramente mascarado por uma magia que não poderia ser denom...