— Norah! – Ian gritou, assustado.
Gabriel deu uma risada fantasmagórica. A voz era bem mais grave do que a idade sugeria. Tonta, Norah não entendeu de imediato o que tinha acontecido. Não tinha entendido quem desferira o golpe.
Só depois de alguns segundos é que ela percebeu, com assombro, que estava diante daquele que vinha ameaçando-a nos últimos dias e tirando suas noites de sono. Ela virou para Gabriel, pressionando a mão contra a lateral da cabeça como se isso pudesse fazer a dor parar.
— Então foi você? – as palavras saíram falhadas. Com rapidez ela levantou, chegando até Ian, que a amparou.
Gabriel ficou um tempo sem responder. Admirou a cena, estava se alimentando dos rostos amedrontados da dupla que estava ali, indefesa e sem chance de escapar. Depois de respirar profundamente o ar mofado do ambiente, disse:
— Ficou com medo? Pena que durou tão pouco. Eu teria esmagado sua mente com tanta perturbação. Finalmente estamos frente a frente, da forma que me convém. Quando ele pediu para que meus irmãos e eu ficássemos de olho em vocês, a primeira coisa que fiz foi observar mais de perto. E naquele dia em que te conheci, quis matá-la no mesmo instante.
— Aquele esbarrão que você me deu...
— Pude sentir a ira correr nas suas veias quando você foi derrubada. Uma raiva cega, superficial – ele pegou um dos ursos que estava em uma mesa ao lado, acariciando-o. – uma raiva fútil.
— Quem enviou vocês? – gritou Ian, cortando o assunto.
— Não me interrompa, descendente de Erin – Gabriel arremessou o urso com força no garoto, que colocou os braços na frente da cabeça para se proteger.
— Não pude me aproximar tanto quanto gostaria. Se fôssemos mais próximos teria um prazer ainda maior em te matar agora.
— E Marieta? O que fez com ela? Ou ela também é uma de vocês? – perguntou a menina.
— Foi um pretexto para ficarmos próximos de vocês. Nossa tarefa era apenas ficar de olho nos descendentes desinformados até que vocês chegassem aqui e matá-los apenas quando chegasse a hora. Não fique tão preocupada com Marieta. Ela vai servir para me alimentar, em breve – ele fez um gesto com um dos braços, percorrendo o lugar e mostrando os ursos acumulados.
— Do quê você está falando?
Gabriel riu sarcasticamente:
— A velhice não é algo que eu goste. O corpo vai apodrecendo, perdendo o frescor, você vê suas capacidades escorrendo pelo ralo. Ah, a velhice é para os tolos. A morte também não é uma coisa que me agrade. Sabe o que me agrada?
— Eu não quero saber! – gritou Ian, erguendo uma das mãos na direção do garoto. – Lampejo da Descendência!
Norah, assustada, viu uma flecha de luz romper a penumbra da sala indo de encontro à Gabriel. Ele, em um movimento brusco, se jogou para o lado, mas o golpe passara de raspão em sua orelha, arrancando uma lasca de sangue. Furioso, o garoto avançou com destreza em Ian, acertando-o com um soco no rosto. O menino caiu no chão com um baque surdo.
— A sua sorte, Ian, é que eu não posso matá-lo. Apenas ele poderá fazer isso, se quiser. Se eu tirasse sua vida, ele me mataria. Mas é claro que se me ferir de novo arranco seu terceiro olho com um golpe só – disse, colocando a mão no ferimento da orelha e ignorando-o por ter percebido que era pequeno. Ele virou para Norah, que deu um passo para trás com horror. – mas, como ia dizendo, o que me agrada é a infância. Os primeiros anos de vida, cheios de energia. Tudo é permitido: errar, fazer o mal, experimentar.
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Os Descendentes e a Ferida da Terra (Livro Um)
FantasíaA Ferida da Terra precisa ser contida. O tempo corre. A situação piora. Mas o que ela é, Ian não sabe. Ele não sabia nem mesmo da existência de um novo continente, vizinho ao Brasil, assustadoramente mascarado por uma magia que não poderia ser denom...