Capítulo 11 - Brincando com Fogo

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Hiro

Cara, antes de qualquer coisa, fique sabendo que os filhos de Hefesto são muito azarados. Charles Beckendorf, Leo Valdez. Esses são só alguns exemplos. Geralmente, a falta de sorte é tão grande que resulta em morte. Eu mesmo não escapo. Não acredita? Tudo bem, quando terminar a última linha, volta aqui e vai ver que eu estou certo, afinal.
Eu e Soluço vamos tirar os dragões de cena – servindo de iscas vivas, é claro – para então a segunda dupla, Rapunzel e Merida, iniciar a outra parte do plano: distrair o exército de monstros, sem que os lagartos voadores estejam por perto para tostar as garotas antes que você tivesse tempo de dizer “tetrabrometacresolsulfonoftaleína!!”.
Enfio a mão no bolso e alcanço um fio extenso de cobre, retorcendo, dobrando, ocupando os dedos com o propósito de esconder de Soluço o tremor frenético nas minhas mãos. É, estou morto de medo. Mas a minha cabeça tem um mecanismo estranho pra me livrar desses momentos tensos: a minha mente me transporta para as minhas lembranças mais felizes, tipo quando Tadashi e eu visitamos o planetário com a nossa tia.
— E também teve aquele sonho — murmuro comigo mesmo, amassando os fios de cobre.
Eu estava preso num fliperama com uma garota que parecia um bombonzinho ambulante e que queria me matar. De longe, o sonho mais esquisito da minha vida, penso. Mas sempre que lembro dele, me sinto tão... Feliz.
— Acho que chegamos — Soluço interrompe meus pensamentos.
A gente tinha andado em linha reta até chegar num descampado, nos escondendo atrás dos arbustos que o contornam.
— Esses bichos são mesmo horripilantes — observo de longe as criaturas voando pelo perímetro do castelo, metros de distância. — O que a gente faz agora?
— Chama a atenção deles.
— Cara, às vezes eu odeio ser semideus — confesso —, mas imagina que louco seria a gente conseguindo completar essa porcaria de missão.
— É, seria ótimo...
Olhe, não me leve a mal, mas eu tenho que dizer que o Soluço é o filho de Hefesto mais anormal do mundo. Não, pra falar a verdade, ele nem parece filho de Hefesto. Acredite quando eu digo que ele não sabe a diferença entre porca e parafuso. Tudo o que ele sabe é fazer desenhos com carvão, babar por aquela filha de Ares que socou a cara dele no ano passado, Astrid, e fazer carinho na barriga do Fúria da Noite.
Pensando nisso, talvez Jack tenha razão, talvez somos mesmo os melhores pra essa parte do plano. “Soluço é rápido e sabe lidar com dragões; Hiro é pequeno, pode se esquivar facilmente”, ele tinha dito. “Sem falar da sua conveniente resistência ao fogo...”
Tá, mas aquilo não me impedia de não levar uma patada de réptil na cara e ser esmagado como uma panqueca.
— Eu não estou afim de morrer hoje — Soluço abre a mochila e tira um elmo de dentro, passando pela cabeça —, mas temos que fazer isso. No três, a gente grita e corre que nem louco e se separa pra ser mais difícil de sermos pegos.
Tiro a mochila das costas e deixo junto com a escultura de fios de cobre (eu fiz um kart de corrida?) nos pés de uma árvore.
— Preparado? — A voz dele abafada pelo elmo.
— É, tanto faz.
— Um...
Vai dar tudo certo.
— Dois...
Quer dizer, talvez dê certo.
— Três!
Esquece, nós vamos morrer.
— AAAAAHHHHHHHHHHH!!!!!!! — Irrompemos gritando das árvores, fazendo barulho como espartanos furiosos.
Àquela altura eu já esperava estar morto, mas nada aconteceu. Paro de agir como doido e olho para o céu. Os dragões nos olharam por um momento como se pensassem “que moleques mais sem noção” e viraram a cara. Pelo visto, somos insignificantes demais para merecermos ser destroçados.
— Outra ideia genial? — Pergunto.
— Nada. E você?
— Nenhu... — Click! A ideia surgiu. Cara, como não pensei nisso antes?
Volto correndo pra minha mochila, pegando o mecanismo delicado e sofisticado do neurotransmissor. Ele tinha sido danificado na luta contra Gothel e esmagado até empenar durante a viagem com as irmãs cinzentas, mas ainda funciona.
Passo o aro de metal na testa, a liga apertada na cabeça. Um pensamento e incontáveis microbôs saem da mochila. Eu não pude trazer todos, mas foi o suficiente.
Modo Perna Longa!, penso e as pecinhas se agrupam nos meus pés enquanto ando para o meio do descampado, ficando consideravelmente mais alto. Braços de Chuck Norris!, e a outra metade dos microbôs forma músculos enormes nos meus braços finos.
— Ei, seus caras de lagartixa, desçam aqui e venham me enfrentar! Mulas voadoras! — Obviamente dragões não curtem ser insultados.
Dois deles – um vermelho vivo e o outro cinzento – voam para baixo de cabeça, perfurando as correntes de vento em super velocidade.
— Soluço, o que a gente faz agora?!
— Corre pra longe do castelo e tenta não morrer!
Nos separamos, correndo o mais rápido que conseguimos, meus microbôs me fazem ser mais veloz, mas caramba, Soluço corre como o vento! Olho para trás por um segundo, as narinas bufantes do Cinzento, uma luz laranja incandescente surgindo na boca aberta.
— Cuidado! — Berro para um Soluço que mergulha para o lado, atrás de uma rocha, se protegendo da labareda flamejante.
Pernas-de-pau!, os microbôs me erguem bem quando o sopro quente do Vermelho faz as peças virarem cinzas e desabo no chão logo em seguida, o neurotransmissor saca pra longe da minha cabeça.
— Levanta! — Soluço me arrasta montanha abaixo antes mesmo que eu consiga ficar de pé.
— Não, esp...!
O garoto me empurra violentamente pra dentro da floresta bem quando os dois dragões lançam chamas.
— Cara, não podemos descer ainda! — Digo. — Só dois dragões estão nos seguindo, falta um!
— Se abaixa!
Enfio minha cara na terra, Cinzento investiu com a cauda que passou raspando por cima das nossas cabeças. Corremos de volta para o campo aberto, a diversão está apenas começando, mas já estamos tossindo nossos pulmões pra fora e um pequeno incêndio começou no descampado só pra “facilitar” nossa fuga.
Ao longe, o dragão branco observa o nosso circo. Provavelmente ele é o líder, Vermelho e Cinzento devem ser seus capangas.
— Hiro!
— Ahhh! — Me jogo pro lado no último momento, as chamas lambendo meus pés, meus sapatos em brasas. — Droga! Como a gente vai trazer aquela terceira lagartixa pra cá, se... Pula!
Mas é tarde demais.
Com a ponta das asas riscando o chão, Vermelho dá uma bela rasteira em Soluço, que cai com tudo no chão. Cinzento se aproxima com as patas inferiores na direção do garoto e eu faço a coisa mais idiota do mundo: desembainho a espada e me coloco na frente.
— Pelas barbas de Hefeeeestoooo! — O dragão me ergue no ar, meu tórax envolto pelos dedos escamosos do dragão que me solta de vez. — Caraaaaaaaambaaaaaaa!
Bupth!, caio com as costas no chão e é como se o ar tivesse sido sugado dos meus pulmões, arquejo sem conseguir respirar, a cabeça latejando de dor, pontinhos coloridos dançando no meu campo de visão, acho que estou tonto. Viro a cabeça e estico o braço na direção da espada, mas ela está tão longe...
Bum... Bum..., com o ouvido contra o chão, consigo ouvir os baques surdos das passadas pesadas do Vermelho, retumbando. Viro o rosto para cima, o réptil de olhos amarelos exibe dentes pontiagudos. Do fundo da garganta, o bicho faz um rugido parecido com o motor de uma moto velha. O dragão abre a boca de dentes trepados um por cima do outro, a labareda nascendo na garganta. A enxurrada de fogo ofusca minha vista e fecho os olhos, protegendo o rosto.
Sou mergulhado numa chuva ardente.
O calor é tão forte que incinera boa parte das minhas roupas e frita toda a gramínea ao redor. Abro os olhos quando já não há mais fogo algum, o dragão me encara com uma grande interrogação nos olhos, “como esse pirralho ainda não virou carvão?”.
— Sou filho de Hefesto, meu chapa — abro um sorriso e me levanto com as roupas fumegando. — Papai também é o deus do fogo.
Caramba, me sinto ótimo, nada como um banho escaldante pra recarregar as energias!
Mas os dragões não me levam muito à sério e se preparam para mais uma saraivada de chamas. Uh-oh, dou passos para trás, se eles fizerem isso de novo eu vou ficar pelado, minhas roupas estão em farrapos!
— Você pode controlar! — Soluço berra atrás de mim. — Você pode controlar o fogo!
— Cara, eu não posso fazer isso! — Olho apavorado para as bocas bem abertas de dentes grandes e tortos. Eu resisto ao fogo e posso entrar em combustão de vez em quando, mas controlar o fogo é outra história.
— Agora! — Soluço ordena.
Os lagartos gigantes liberam uma enxurrada flamejante e entro no modo automático, guiado por instinto. As chamas não me atingem, é como se eu estivesse dentro de um campo de força, as labaredas passam ao meu redor, mas não me tocam.
E aí eu faço algo mais doido ainda!
Movimento os braços e as chamas espiralam num redemoinho incandescente, agindo na mesma sincronia que eu e meus microbôs. O circo é o suficiente pra fazer os dois dragões recuarem e chamar a atenção do terceiro, que abre as asas brancas majestosas e alça voo.
Soluço comemora:
— Funcionou, ele tá vindo pra cá!
Um sorriso estica minhas bochechas até doer, mas fazer aquele truque tira todas as minhas energias, de modo que eu pare e as chamas se extinguem.
— Fique longe — digo pra Soluço —, vou fazer o mesmo com esse jacaré branco e se você ficar por perto, vai virar churrasco.
— Você tem certeza que...
— Relaxe.
Por fim, ele se afasta o máximo possível. Os dragões menores não atacam, mas se mantêm na defensiva enquanto o alfa se aproxima e, acredite, ele tem o tamanho dos dois outros juntos. Sinto o impacto debaixo dos meus pés assim que ele pousa, e a atmosfera muda.
Ele não é como Vermelho e Cinzento, que eu posso sentir o calor emanar dentro deles, fustigante. Não, esse dragão é diferente, sombrio. Ele tem uma aura tenebrosa, glacial, quase como... quase como o espírito gelado de Elsa, na primeira vez que toquei sua mão e desconfiei que ela era filha de Quione.
Frio. Gélido. Um arrepio percorre minhas costas. Nada de fogo aqui, ele é um dragão da neve!
— Só pode ser brincadeira! — São as minhas últimas palavras.
O dragão abre a boca, mas já é tarde demais pra conseguir desviar das agulhas de gelo que se lançam contra todo o meu corpo.


Olá semideuses! Pelo visto alguém virou picolé...
Quem vocês acham que deve ser a menina-bombom-ambulante nos sonhos de Hiro? Quem são as deusas guardando a Foice? (Suspense) kkk comentem aí em baixo! E caso estejam se perguntando “tetrabrometacresolsulfonoftaleína” é um termo químico.
Ah, não deixem de clicar na estrelinha ;D E isso inclui você, leitor que me acompanha e nunca votou ç.ç
Bjs.
P. S.: Vocês vão encontrar um (a) velho (a) conhecido (a) passando por maus bocados nos próximos capítulos...

Solstício de InvernoOnde histórias criam vida. Descubra agora