Capítulo 3

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"Eu tenho o seu gosto e eu do seu jeito. A cor do seu rosto eu já sei de cor." - Clarice Falcão, Um Só

Caio avisou que achou por bem irmos andando para podermos conversar mais, já que onde nós estávamos indo era perto. Concordei com a cabeça e dei um sorriso leve para mostrar que estava tudo bem, pois eu sabia que no fundo seu carro usado tinha quebrado outra vez naquele mês.

Passamos as primeiras duas quadras em um silêncio desconfortável porque eu tentava pensar em algum assunto bom para conversarmos. Sentia uma pressão invisível em minha mente, pois sabia que Caio já havia ido a muitos encontros - principalmente quando éramos adolescentes. Ele podia ser pobre, mas era atraente e nenhuma garota, até mesmo da Ala J, na época do Ensino Médio, rejeitaria um encontro com Caio. Jean reclamou uma vez para mim que garotas ligavam incontáveis vezes para o telefone fixo de sua casa e que foi um alívio para ela e sua mãe quando cancelaram a conta por não poderem pagar mais.

— Você esteve na clínica hoje? - Puxou assunto e o agradeci mentalmente por isso.

— Sim, foi bastante divertido — comentei sentindo uma agonia por não saber onde colocar minhas mãos. Inferno. — Por que Jean estava com um papo estranho de festa na empresa? Ela te disse algo sobre isso?

Ele sorriu amarelo a minha pergunta e coçou a nuca.

— Eu menti pra ela. — Abri a boca para perguntar o motivo, mas ele continuou. — Acho que é melhor esperarmos o dia do nosso prazo chegar para dá a notícia. Quero fazer surpresa.

Olhei para ele tentando confiar naquela história de sermos destinados como antes, mas a voz de Ivanna invadiu minha mente em sussurros. Cuidado, menina.

Decidi ser sincera com ele e contar-lhe o que estava se passando em minha cabeça, mas o vislumbre de Jack correndo para dentro de uma casa com som alto me desconcentrou. Naquela hora da noite era normal haver festas no bairro. Não eram lugares muito seguros já que sempre a polícia era acionada e pessoas eram presas todos os finais de semana com porte de armas, drogas ou sei lá o que. Ver Jack entrando naquela casa que tremia por causa do som alto, me fez querer desistir de meu encontro e puxar aquele garoto pelas orelhas até sua casa; no entanto, a voz de Caio subindo umas oitavas pelo barulho que faziam dissipou minha ideia.

— Estamos chegando perto. - Avisou com um sorriso.

Dei uma olhada para trás cogitando em procurar pelo Jack, mas eu estava ali para um encontro, para uma noite especial. Suspirei, sorri de volta para Caio e voltei a acompanha-lo com a certeza que descobriria o que estava acontecendo mesmo com Jack em outra hora.

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Donny's era a lanchonete/restaurante mais frequentada pelas pessoas dos bairros circunvizinhos ao meu. Era um lugar muito aconchegante e tinha comidas boas que poderiam ser pagas com menos de trinta dólares - se você fosse comer cereal com passas, é claro. Tinha também um cardápio diversificado de vários países; você quer comer comida mexicana? Chinesa? Seja o que for, eles tem! Eu costumava vir aqui no começo da minha adolescência com meus colegas de escola para comer nachos, nós comprávamos fazendo uma vaquinha. Havia quase uma década desde a última vez que tinha pisado no restaurante e quando percebi que era esse o lugar onde Caio queria me levar, não pude deixar de ficar animada.

Meu destinado abriu a porta para mim com gentileza e não pude deixar de agradecer me sentando em uma das mesas perto da janela. Meus olhos capturavam a decoração alegre do lugar enquanto Caio sentava em minha frente na mesa conjugada.

— Gostou do lugar? — perguntou pegando o cardápio na mesa. — Sei que não é grandioso, mas...

— Tudo bem — disse. — Eu gosto daqui.

Our Worlds Collide [Primeiro Rascunho]Onde histórias criam vida. Descubra agora