Capítulo 12

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Capítulo sem revisão e sujeito a alteração.

"Você não precisa ser tão corajosa essa noite." - Brave, The Shires.

Eu ganhei a primeira bicicleta um mês depois do meu aniversário de sete anos. Ela era rosa, cheia de figurinhas e tinha uma buzina branca um tanto dura para se apertar por ser nova. Steve Blackwell, meu pai, me ensinou a andar sem rodinhas, embora sempre estivesse cansado do trabalho quando chegava em casa. Minha mãe costumava nos acompanhar nas tardes em que íamos ao parque, porém ela nunca interveio no nosso momento pai e filha - ela apenas nos olhava com um sorriso pequeno e doce que poucos da Ala O conseguiam esbanjar. Mesmo depois de não precisar da guarida de meu pai o tempo todo, eles ficavam de longe mantendo o olho em mim. Os dois.

Meus pais estavam lá toda vez que eu virava para observá-los. Eu nunca estive sozinha.

Mesmo quando meu pai morreu de forma tão cruel, eu nunca estive sozinha.

Mas as coisas na vida são incertas, não é? Depois de dois anos descobrir que os constantes esquecimentos da minha maior defensora não eram normais. Eu tinha quinze anos na época. Assistir à Letícia Blackwell morrer aos poucos era uma das dores mais insuportáveis que já tive. Ver uma mulher forte, que abriu mão de seu conforto para viver uma história de amor, se debilitar aos poucos me fez passar muitas noites chorando durante a adolescência, entretanto não demorou muito para eu perceber que navegar em lágrimas não me daria as soluções que precisava. Como a aflição era rotineira, ela se tornou suportável. Não que eu não tivesse crises, mas já não era mais uma novidade. Quando a situação é irreversível, você acostuma. Não era como se eu tivesse outra opção.

Eu entrei na Coral pela minha mãe e por causa disso não pude estar ao lado dela no seu último dia de vida. Tentei afastar aquele pensamento de mim e repetir que não era culpa de ninguém, porém era quase impossível. Durante o voo de volta para casa segurei as lágrimas. Chorar na frente de estranhos não me agradava, assim como o rosto cheio de compaixão de Andrew passou a me incomodar. Acho que não tinha digerido a notícia direito, pois quando encontrei Jean esperando-me com o carro de Caio e abracei-a, comecei a soluçar.

Algo tinha sido arrancado de dentro de mim; a realidade me atingiu ao ter que organizar um enterro. Lembranças da minha infância e adolescência pareciam estar em todos os lugares que eu andava na Ala O. A sensação de uma guerra perdida massacrava meu corpo e tudo que eu queria era me afundar na tristeza, mas negava fazê-lo antes de dá um funeral digno a minha mãe.

O silêncio raro e as carinhas tristes das crianças do meu bairro ao pedir que mandassem recado para seus pais sobre a morte da minha mãe dilacerou o coração.

A pior parte, entretanto, foi o enterro. A pior segunda-feira de todas.

Me preparei apenas para escutar as frases confortantes que, no fim, não mudaria nada e o olhar de pena que sempre evitei receber desde pequena, mas não para o resto.

Encontrei algumas amigas da minha mãe que se mudaram para longe ou estavam preocupadas demais com suas vidas para visitá-la com frequência. Uma delas se chamava Sarah e tocou em meu rosto do jeitinho que ela fazia quando eu era criança.

- Ela está em um lugar melhor agora.

Aquilo transpassou o peito e lhe dividiu em dois. Por que aqui, do meu lado, não pode ser o lugar dela? Eu não era suficiente? Eu não podia cuidar dela? Por quê?

Qualquer coisa que segurou minha sanidade evaporou quando a vi deitada no caixão. Eu tinha evitado pensar em seu corpo frio dentro daquele ataúde. Letícia Blackwell estava com um vestido rosa - sua cor favorita e parecia muito como ela era antes da doença. Minha mãe podia muito bem estar dormindo.

Our Worlds Collide [Primeiro Rascunho]Onde histórias criam vida. Descubra agora