- Tomara que não seja vendedor!
Ruth friccionava a toalha nos cabelos ainda úmidos enquanto ia atender à porta. Arregalou os olhos e quase caiu para trás ao puxar a maçaneta.
- Oi. - o jovem de pele lisa e negra lançou-lhe um sorriso, revelando o aparelho dentário. - Espero não ter chegado em má hora.
- Não existe boa hora pra você chegar nesta casa, Júnior. - ela olhou para trás, e continuou um tom abaixo. - Quantas vezes já falei pra você não aparecer aqui? Se o que você tem pra me dizer é tão importante, então faça o menor barulho possível. Minha mãe acabou de entrar no banho, mas ela não pode nem imaginar que eu ando recebendo gente como você!
- Como assim? - ele entrou sem cerimônias, a mão no bolso, destilando ironia. - Eu não sei se você tá por dentro, talvez você nunca tenha ouvido falar, mas racismo é crime.
- Não é por causa da cor da sua pele, não. - Ruth cruzou os braços, devolvendo-lhe o sorriso de sarcasmo. - Ela ficaria horrorizada se soubesse dos seus... "servicinhos".
- Serviços dos quais a senhorita fez uso sem o menor escrúpulo e, portanto, não tem direito de me julgar. - Júnior esparramou-se no sofá e cruzou as pernas sobre a mesinha de centro. - Eu poderia ter ligado, mas não gosto de tratar de assuntos sérios por telefone.
- Eu imagino. Hackers devem ser todos meio paranoicos com esse negócio de tecnologia. - ela sentou-se ao lado dele, puxando-lhe as pernas para baixo delicadamente. - Que assunto sério é esse? Descobriu alguma coisa?
- Você conseguiu a senha do PC da tua chefe?
- Mas eu te contratei justamente pra esse tipo de coisa! - ela se exasperou. - Que tipo de hacker não consegue descobrir uma senha por si próprio?! Júnior, se você continuar me pressionando a fazer o seu serviço, vai ter problemas!
- Sendo assim, não precisa se preocupar. - ele se levantou de súbito. - Eu me demito.
Ruth levantou, gaguejando, e tentou argumentar, mas não conseguiu impedir que o hacker atravessasse a sala em disparada e sumisse pela porta de entrada.
Cindy colocou o suporte com incenso sobre a mesa de centro. O perfume logo se espalhou pela sala, e tudo o que se ouvia era a seresta noturna dos grilos.
- Hoje foi um dia cheio, não é? - ela sorriu para os rapazes que haviam se reunido em semicírculo na sala de estar. - Que tal fazermos um break pra conversar?
- Ótima ideia, Cindy. - visivelmente ansioso, Jim apoiou os cotovelos nos joelhos. - E aí, quando vai ser a primeira eliminação?
- Acho que todos aqui já estão cansados de falar sobre o jogo o tempo todo. - ela sentou-se numa poltrona. - Eu tenho uma proposta diferente.
- Vá em frente. Pelo jeito, propostas exóticas são a sua especialidade. - Fernando sorriu. - Apesar do nosso relacionamento, não conhecia essa sua faceta.
- Não me lembro de ter mencionado a palavra "exótica", Fernando. - Cindy sorriu com uma pontinha de sarcasmo. - O que eu quero é que vocês interajam uns com os outros. Que esqueçam a rivalidade, ao menos por um momento, e falem um pouquinho mais sobre vocês mesmos. Vou chamar nossa atividade de "Roda da Sinceridade". Agora é a hora de se apresentarem oficialmente e, talvez, revelar coisas interessantes.
- Sendo assim, vou acabar logo com isso. - Jim se levantou e foi até o centro. - Jim Williams, vinte e oito anos, modelo, nova-iorquino, filho de pai brasileiro e mãe americana. Meu pai, Erom, conheceu minha mãe, Tessa, quando ela trabalhava como garçonete em um restaurante infame no Brooklyn. - ele retesou os lábios. - mas, vocês compreendem, não gosto de tocar no assunto. O fato é que eles se casaram depois que minha mãe se descobriu grávida. Meu pai abriu uma lanchonete em New York, e hoje trabalham juntos.
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Gato Borralheiro
General FictionUma metrópole qualquer, 2013. Cinderela Ramos de Moraes - ou simplesmente Cindy - é uma jovem rica, linda e independente. Presidente da Cristal Calçados, a empresa da família, tem paixão assumida por sapatos e popularidade entre os funcionários. Pa...