Novembro parecia ter sido cortado ao meio, pois passara tão depressa quanto um ratinho de esgoto correndo em direção a migalhas deixadas por humanos em uma rua suja de alguma grande cidade. E, mesmo em um tempo tão aparentemente curto, Noah pôde sentir o gosto da vergonha e das chacotas. Sua fama de "O cadeirante que foi jogado na piscina" logo se espalhou pela escola e virou motivo de piada por uma semana inteira. Só não passara disso pois Greg não deixou. Aquele cara realmente tinha poder naquela escola.
Tirando a semana de horror, se fôssemos analisar bem o mês de novembro do garoto, veríamos que fora um mês bastante monótono. Ele ia para a escola, em seguida fisioterapia e, depois, para a casa. Sem mais festas ou coisa assim —também, com o que houve em sua última tentativa de se socializar, sua escolha é bastante compreensiva. O único acontecimento que destoou dessa realidade foi o dia 22. Dia do jogo dos Dodgers contra os Cardinals.
Noah estava animado para caramba por causa daquele jogo. Sempre fora fã de carteirinha dos Dodgers desde pequeno e não perdia um jogo se quer junto ao seu pai —Que também era um fã fanático. Desta vez, a animação era ainda maior, pois eles não veriam pela televisão, eles iriam ao jogo.
Mesmo que Mirian não achasse uma boa ideia, George comprara dois ingressos para o jogo de beisebol. O homem havia notado o baixo astral de seu filho e achou que aquilo o animaria — e acertou na mosca!
Bem de manhazinha, sem que sua mãe o acordasse, Noah se arrastou para o lado da cama e puxou a cadeira de rodas. Ele nem parecia o mesmo garoto preguiçoso que reclamava para acordar às seis. O menino se jogou para o fora da cama e caiu sentado sobre a cadeira. Nem ele sabia que possuía tanta habilidade em fazer aquilo... O que os Dodgers não fazem, não é mesmo?!
Quando sua mãe chegou ao seu quarto para chama-lo, assustou-se quando viu a cama vazia. Ela correu pela casa em busca de seu filho, o encontrando no banheiro colocando a pasta dental na escova de dentes. Mirian, sem saber o que dizer, retomou sua postura e desejou bom dia ao garoto, que a respondeu com um largo sorriso, antes de enfiar a escova em sua boca e esfregar rapidamente. Era possível ouvir seus dentes gritando por misericórdia e clemência.
Assim que Mirian deixou o banheiro, Noah fechou a porta e se despiu. Ele, sozinho, passou da cadeira de rodas de passei para a de banho, que estava no canto do banheiro, e rolou para debaixo do chuveiro. Usando um pente, o garoto esticou-se o máximo possível e conseguiu abrir a torneira, deixando a água cair sobre seu corpo.
Seus lisos, porém ondulados, cabelos castanhos colaram-se ao seu corpo enquanto o garoto se ensaboava. Ele deixou a água enxagua-lo e despejou xampu em sua cabeça, esfregando os cabelos rapidamente. Noah estava se sentindo ótimo, não só pelo jogo que veria mais tarde, mas também por sua independência. Ele não estava precisando da ajuda de ninguém para fazer aquilo e isso era um máximo!
Já de cabelos limpos, o menino terminou de tirar o sabão do corpo, quando, ao olhar para baixo, ergueu suas sobrancelhas. Em dois meses consecutivos, Noah não... ahn... aparou a grama uma vez se quer. E você sabe o que acontece quando não se apara a grama por tanto tempo, não é? Exatamente. Ele, então, esticou-se para o lado e alcançou o armário. Com a ajuda do pente, novamente, fez com que a tesoura caísse na pia e a pegou, indo fazer seus trabalhos de jardinagem.
Limpo, cheiroso, seco e aparado, Noah enrolou-se numa Toalha do modo que pôde e seguiu rapidamente para seu quarto na cadeira de passeio. Lá, ele abriu o guarda-roupas e vestiu-se com cueca, calça jeans —sim, acredite, ele conseguiu—, blusa e boné dos Dodgers e um tênis All star costumeiro. De dentro de seu guarda-roupas, Noah puxou o que parecia ser uma mão gigante azul com um dedão levantado. Nela, lia-se "#1".
O garoto disparou para a cozinha, onde encontrou seu pai preparando Waffles. O homem parecia estar tão animado quanto o filho, até assobiava enquanto fazia o café da manhã.
—Aposto que ninguém dos passarinhos vai rebater as bolas do J. P.! —Exclamou Noah com certo entusiasmo e direcionou-se para a geladeira, abriu a porta e tirou dali uma garrafa de suco de laranja.
—Frankie Montas, garoto! Esse é o nome do sucesso! Foque J. P. pode errar. Frankie? Nunca!
Os dois ficaram falando de Beisebol por toda a manhã, afinal, era domingo e nenhum dos dois precisava sair para estudar ou trabalhar, e até mesmo ignoraram os outros moradores da casa que tentavam interrompe-los. Nenhum dos irmãos de Noah gostava de Beisebol. Um era louco por malhação e, o outro, preferia assistir desenhos japoneses e se esconder na escuridão de seu quarto, o qual ganhou o apelido de "caverna".
Dez e meia em ponto, Noah e seu pai foram para o carro e o abasteceram com o Kit torcedor. Luva gigante, bandeira dos Dodgers, cornetas e bastão de beisebol —que servia para caso houvesse... desentendimentos entre as torcidas. Resolve-se tudo com a democracia, claro. Afinal, o que é mais democrático do que um bastão de beisebol enfiado goela abaixo dos inimigos?! Eu não consigo imaginar! Trinta minutos depois, eles já estavam preparados para partir. Noah sentado no banco do carona com o cinto de segurança colocado e George no volante, ajeitando o espelho retrovisor.
Sem muita demora, George gritou um "ESTAMOS INDO" e meteu o pé no acelerador, dando ré, manobrando na rua e seguindo caminho pelo lado direito da faixa. O dia estava ensolarado para a alegria dos dois. O vento batia no rosto de Noah e balançava seus cabelos. O mesmo acontecia com George, mas sem a parte dos cabelos... o cara era careca, sabe?
***
Noah estava indignado. Ele e seu pai voltaram para casa o caminho inteiro xingando e gritando, batendo as luvas de beisebol no painel do carro e até as jogando pela janela enquanto estavam na estrada.
Quando chegaram em casa, Mirian se virou para eles com um sorriso, mas não ousou dizer uma palavra se quer ao ver a expressão dos dois.
—Que palhaçada! —Exclamou Noah ao seguir para o quarto.
—Roubo! Aquele Juiz filho da... Filho de uma.... Ah, aquele juiz! —Esbravejou George.
Resultado do jogo: Dodgers perdem por causa de um arremesso.
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As vicissitudes da vida
RomanceÉ curioso o que um acidente de carro pode fazer na vida de suas vítimas. É algo com um poder tão destrutivo e impactante, embora tão normal de se ver nos noticiários da televisão. Alguma vez já imaginou o que acontece com as pessoas após o acidente...