O Quarto

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Noah já não ia à fisioterapia havia uma semana, tampouco frequentara a escola nesse período de tempo. Não queria sair de seu quarto nem mesmo para comer, mal ia ao banheiro furtivamente e voltava para a cama. Sua mãe estava preocupada com ele, perguntava o que estava acontecendo, mas ele não respondia nada. Ficava olhando para a parede, os olhos vidrados e sem vida. Se ele escutava ou não o que a mulher dizia era um grande mistério.

Greg e Marcy... A cena dos dois dentro da sala de música repetia-se na mente do menino inúmeras vezes. Por mais que ele tentasse, não conseguia evitar. Ele aceitara que sua namorada o traía, mas nunca esperou que faria isso com seu melhor amigo.

Para a surpresa do próprio, Noah não chorou. Ele apenas abaixara a cabeça e saíra sem fazer barulho pelo corredor da escola. Ele se perguntou como não notara antes aquilo, pois, agora, tudo parecia claro. O jeito que eles se falavam, o tanto de tempo que eles ficavam juntos. Sempre que encontrava Marcy no corredor, Greg estava junto. Ele queria saber há quanto tempo aquilo acontecia, mas o que isso mudaria? 

O menino permanecia em sua mesma posição na cama —virado de lado, com uma mão embaixo da cabeça e outra na cama à sua frente. Estava com os olhos abertos, observando o nada novamente. Seu celular vibrava e tocava, e isso acontecia frequentemente. Devia ter umas quinhentas mensagens não lidas ali. E, se dependesse de Noah, elas permaneceriam não lidas.

Foi então que alguém bateu à porta do quarto. Alguns segundos depois, Noah ouviu um rangido e passos. Uma menina se colocou de pé diante de Noah e ele só conseguiu ver sua saia azul claro, pernas finas e brancas feito leite e sapatos com estampa de vaquinha. Ele nem precisava olhar o rosto da pessoa para saber quem era.

—Eu posso saber com a autorização de quem você está faltando à escola? —A voz irritada de Peggy soou no quarto enquanto ela colocava as mãos na cintura. Não houve resposta.

A menina franziu o cenho e observou o rosto do melhor amigo: o osso da bochecha marcava, sua pele estava pálida e desbotada, em um tom doentio, os olhos envoltos por gigantescas olheiras roxas e os lábios secos e rachados. O cabelo parecia um ninho de rato, ou talvez até mesmo o próprio animal.

—Uou... — A postura de Peggy se desmanchou. Ela agachou-se até ficar com o rosto frente a frente com o do menino. Olhou-o dentro dos olhos e segurou no antebraço dele. —Noah, está me ouvindo?

Se não fosse pelo peito mexendo, Noah poderia ser dado como morto. Peggy sentiu um gosto amargo na boca. Ela nunca vira o amigo assim, nem mesmo quando sofrera o acidente e o visitara no hospital. Ele estava desacordado, óbvio, mas não estava tão mal assim. 

Alguém chegou à porta e observou os dois. Peggy virou o rosto e viu que era Miriam, com os braços cruzados e os olhos fixos no filho. Ela estava abalada, parecia querer chorar, porém se fazia de forte.

—Ele está assim há dias... Não quer comer, não responde... Só levanta para ir ao banheiro, e isso é raridade... Não sei o que está acontecendo.

Peggy voltou-se ao amigo, que olhava para ela, mas parecia ver através da menina, como se ela não estivesse ali. A garota passou a mão no rosto de Noah e acariciou sua bochecha com afeto.

—A senhora já ligou para um médico?

—Não, ainda não... Não achei que fosse sério no começo, mas piorou muito... Achei melhor ligar para os amigos dele antes de eu pedir ajuda profissional.

—Mais alguém vai vir? — Peggy perguntou, mas a mulher não soube responder.

—Greg não atende o celular, o de Marcy está desligado... Mas, talvez... — Miriam franziu o cenho e deu um passo para trás. — Eu já volto.

As vicissitudes da vidaOnde histórias criam vida. Descubra agora