Capítulo 9

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"Nota: A escotofobia é o medo irracional à escuridão. Geralmente, é originada de um trauma que ocorreu em algum momento na vida (geralmente na infância) do indivíduo. Nos indivíduos que possuem um certo controle sobre essa fobia, o medo só se manifesta após um certo período de tempo na escuridão, em geral, de 15 a 20 minutos, já os mais sensíveis a essa fobia entram em um surto psicótico no qual começam a ter alucinações, podendo muitas delas passar por visualizações de situações irreais, assim como também ouvir e associar sons que consideram estranhos e anormais a algo irreal."  

Cantarolava de forma nervosa a mesma música enquanto em passos lentos tentava chegar às escadas que dariam para o andar de cima. A bateria que tinha era pouca e tinha medo que o telemóvel se desligasse, ainda por cima enquanto andava apenas com a fraca luz do flash a iluminar-me o caminho. 

Desviei um pouco a cortina da sala para de alguma forma tentar ver a casa de Joey, a chuva era intensa e dificultava-me a visão, mas consegui perceber que o seu carro ainda não havia chegado. Acho que nunca tinha presenciado tantos cortes de energia como ultimamente e isso era dos meus piores pesadelos. Sentia-me perseguida pela casa enquanto caminhava pé ante pé com medo de embater em alguma coisa. Subi as escadas praticamente de gatas, os pelos dos meus braços arrepiavam-se e esforçava os meus dentes para não baterem uns nos outros enquanto tremia. 

"El, tens vinte anos, deixa de te comportar como uma criança", soa o meu subconsciente irritado, mas o enorme barulho preenche o espaço e eu deixo soltar algumas palavras feias  fazendo instintivamente uma pausa sentada no meio das escadas. 

Ele sabe muito bem que o meu medo não se relaciona com infantilidades, ele foi adquirido na pior fase da minha vida em que as luzes psicológicas do meu mundo se desligaram, causando-me este transtorno pelo escuro físico.

"Recompõe-te!", soa a pequena voz na minha mente e obrigo o meu corpo a subir mais uns degraus até chegar ao andar de cima. 

Aponto a luz em todas as direcções observando tudo ao pormenor e assusto-me até com algumas sombras que os móveis formam no corredor. Torno-me ridícula nestas situações. Alcanço a maçaneta da porta do meu quarto e respiro fundo, sei que será bastante complicado adormecer neste estado amedrontado, mas é a melhor solução que encontro neste momento, pois se adormecer não darei conta da escuridão e o meu coração descansará um pouco afastando estes maus sentimentos protegida pelos meus cobertores. 

"Sim, eles protegem bastante", soa novamente o meu subconsciente realçando o facto de eu ser ridícula. Numa noite normal de trovoada, estaria enrolada de forma chata ao meu irmão, a fazer uma espécie de tenda com os lençóis enquanto lhe mexia no cabelo até pegar no sono.

Assim que abro a porta uma forte luz ataca a minha visão encandeando-me por momentos, assusto-me e recuo uns passos cambaleando, colocando a minha mão livre em frente à cara, mas segundos depois ouço o som de um carro que passara provavelmente num buraco, pois ouço as suas rodas a percorrerem a estrada molhada. Apercebo-me de que a minha janela estava aberta e a luz certamente teria vindo de lá. Penso em fecha-la mas prefiro deixar as cortinas abertas, apesar de fraca, a lua ainda é minha amiga e aparece envergonhada para iluminar um pouco o meu espaço. 

As pantufas são largadas perto da cama e sem pensar em mais nada enfio-me dentro dela num pulo. Sentada, dou uma vista de olhos pelo meu quarto enquanto um resmungo queixoso sai de mim. Não poderia haver mesmo melhor altura para estar sozinha em casa. 

O meu telemóvel apitou informando que a bateria estava mesmo nos mínimos e fui obrigada a desligar o flash para a poupar, se bem que ela mesmo sem lhe tocar duraria pouco.

Sentia-me demasiado inquieta para conseguir dormir e o barulho das árvores a embaterem umas nas outras e a roçarem na minha casa não ajudava, esta seria uma longa noite. Estico-me e arrasto o meu computador portátil até mim, com sorte ainda terei bateria para uma horinha. 

FallenOnde histórias criam vida. Descubra agora