Radical

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Acordei com o meu celular tocando. Deveria ser sete horas da manhã pela claridade. Olhei para o relógio digital da escrivaninha e percebi que eram oito horas. Tateei debaixo do meu travesseiro para achar meu celular e ao olhar para ele vi que o número era desconhecido e eu nunca atendo chamadas desconhecidas.

Como o toque estava me irritando, eu desliguei meu celular e o coloquei dentro da gaveta da escrivaninha. Minha mente demora a processar que eu já acordei então até uns dez minutos depois que acordo eu fico neste estado meio vegetativo. Depois de mais cinco minutos, eu levanto e vou direto para a cozinha.

– Bom dia, pai – falo bocejando.

– Bom dia, Roxy – ele afasta o laptop sorrindo para mim.

Ele estava sentado na mesa da cozinha com uma caneca preta com café e um pratinho com melancia, ou o que sobrara dela. Seu laptop estava com o Word aberto então inferi que estava escrevendo. Meus pais escreviam desde quando tinha a minha idade e era praticamente impossível vê-los sem escrever por mais de dois dias. Escreviam de tudo, mas minha mãe tinha mais gosto para livros de romances com uma pegada de autoajuda e meu pai por romances policiais.

Todos curtiam seus livros e já tinham ganhado o suficiente para vivermos em uma mansão, mas meu pai sempre disse que este dinheiro deveria ser guardado para o futuro, afinal, estávamos felizes naquele apartamento e com o estilo de vida que levávamos. Não precisávamos de mais. 

Eu sempre achei isso sensato da parte do meu pai e eu concordava com ele. Nunca precisei de muito para viver e aquele apartamento era grande e nosso já. Para que mais? Minha mãe nunca pareceu discordar ou concordar, ela nunca tocou neste assunto comigo.

Eu me sentei ao lado dele.

– Já escovou os dentes?

Levantei novamente. Ele riu baixinho e eu revirei meus olhos. Fui para o banheiro e escovei os dentes; voltando para a cozinha, peguei um pratinho e um pedaço de bolo de milho. Eu abri o gabinete debaixo da pia e vi que faltava alguma coisa.

– Não tem mais chá?

– Sua mãe bebeu o último ontem.

– Ah – eu estava um pouco irritada por dentro, mas não era como se eu fosse demonstrar isso. – Cadê ela?

– Foi ao mercado comprar o chá, tesoura e mais algumas coisas. Ela saiu um pouco antes de você acordar, acho que ela queria voltar com o chá antes.

Eu sorri levemente e assenti fechando o gabinete. Peguei meu bolo, sentei-me a mesa e o comi a seco mesmo. Eu gosto muito de chá e minha mãe também, mas ao contrário dela que consegue tomar café para começar o dia eu apenas gosto de chá de manhã. Fazer o quê? Também tenho as minhas frescuras.

– Roxy... – meu pai me chamou e pelo seu tom eu já sabia o que ele iria dizer. – O editor ligou e...

– Quanto tempo passarão fora? – abocanhei um pedaço grande do bolo. Ele sempre tinha aquele tom quando dizia que teriam que viajar.

– Um mês – ele suspirou. – Vai ser uma das viagens mais longas que faremos e nós pensamos que...

– Vou ficar ótima sozinha – eu sorri para tranquilizá-lo. Não queria menções à casa dela. – É só me deixarem o dinheiro que farei o mercado.

Ele me olhou nos olhos e eu sustentei o seu olhar, para garantir que nenhuma dúvida existia ali.

– Bem – ele suspirou. – Sem problemas então, garotinha – ele levantou da cadeira e deu um beijo na minha testa. - Só não compre coisas congeladas, ouviu bem? Sabemos que tem paixão por esses negócios horríveis.

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