E ela chega

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Não faz ideia de quanto tempo passei encarando a tela do Skype pensando se eu deveria ou não chamar Érica.

Após chegar ao apartamento e chorar tudo o que eu poderia, tomei um banho e recebi uma mensagem de minha mãe dizendo que passariam a noite fora. Nunca me importei muito ou fiquei chateada com essas saídas e viagens dos meus pais, mas tudo o que eu queria naquele momento era eles por perto. Eu com certeza não falaria o que estava acontecendo ao meu pai, mas um abraço... Ah como eu queria algo assim. Ponderei então se eu conseguiria falar o que estava acontecendo para a minha mãe. Ela escreve livros de autoajuda, certo? Poderia me ajudar.

Meus olhos ardiam quando eu estava ainda no banheiro me secando e mesmo a luz do celular estava me incomodando. Eu coloquei apenas a calcinha azul que eu tinha pegado e uma regata verde leve. Assim, passei a mão no espelho para poder dar uma melhor olhada no meu estado.

Olhos vermelhos e inchados, respiração ainda pesada, cabelos colados na testa, expressão perdida. Ou seja, um caos completo.

Toquei o colar em cima da pia e em seguida o prendi em meu pescoço. Assim que sai do banheiro, passei em meu quarto somente para pegar meu laptop e fui para o quarto dos meus pais. Só de passar pela porta dá para sentir o típico perfume do meu pai que sempre damos de dia dos Pais e o toque da minha mãe estava em todo o lugar.

Subi na cama de casal e engatinhei sobre a colcha branca e preta até chegar à cabeceira onde conectei a fonte do computador e me enfiei debaixo das cobertas. Sentada bem no meio eu o liguei e abri o Skype.

O fato é que eu não precisei começar a conversa, Érica me chamou com uma única e rápida mensagem. "Adivinha só prima do meu coração! Estarei indo para ai mês QUE VEM! Já que Roxanne não vem até Érica, Érica vai até Roxanne! Pois é, vou ter que sair duas semanas antes de serem férias oficiais, mas os professores já me liberaram. Eu queria poder ficar aqui pirando com você, mas tenho que ir dormir. Te amo :33"

Essa mensagem tinha sido mandada havia três dias. Eu abri o calendário do laptop e percebi que em menos de quatro semanas Érica estaria aqui.

– Eu preciso conversar com ela. – Senti minha cabeça doer e suspirei. – Não dá para esperar.

Acabei mandando uma mensagem pedindo desculpas pela demora e dizendo que eu precisava falar com ela urgente. Com um suspiro eu fechei os olhos por alguns minutos e tudo em meu corpo gritava por descanso. Resolvi fazer uma parte de um relatório da escola e deitar um pouco, apenas um pouco.

Foi bem rápido para falar a verdade, acabei fazendo ele inteiro para adiantar. Não sei explicar o que sinto quando desenho e por isso eu me levantei e fui até meu quarto pegar meu caderno de desenho. Para falar a verdade, meus pais estavam começando a achar que eu faria faculdade de artes também ou algum tipo de design.

Abri o caderno, mas nem saiu um desenho completamente rabiscado, apenas fiquei ali olhando para o papel por três minutos inteiros. Fechei-o e escorreguei para dentro do edredom, pegando o travesseiro do meu pai e colocando mais ao meio da cama. Deitei minha cabeça nele virada para o lado da minha mãe e desejando que eles estivessem ali eu dormi.

Acontece que eu não acordei apenas na manhã seguinte, mas sim quatro horas depois.

– Roxanne! – Escutei uma voz estridente meio longe para que eu pudesse reconhecer de quem era. Escutei também mais alguns sussurros e umas portas abrindo até que a porta do quarto dos meus pais foi aberta. – Ai meu Deus, tia. Ela está dormindo.

Àquele ponto eu já sabia quem estava aqui, mas eu estava muito grogue para falar qualquer coisa.

– Roxy...? – A voz da minha mãe era baixa e eu a senti se aproximar da cama. – Filha...?

Eu resmunguei quando meu pai acendeu a luz e me escondi debaixo do edredom, eu tenho certeza de que envolta dos meus olhos é puro inchaço e vermelhidão. Eu não quero que vejam isso.

– Deixe-a dormir aqui, ela deve ter tido um dia cheio. – Meu pai falou e eu pude sentir uma mão em meus ombros por cima do edredom.

– Tio, posso ficar aqui um pouco? Prometo que não a acordo! – Parece que é o destino, não é? Ela estava aqui mesmo quando eu mais precisava dela.

– Claro, só tome cuidado para ela não se irritar.

– Pode deixar que eu me controlo. – Ela deu uma risadinha e eu escutei passos saindo do quarto e a porta fechando. Ela desligou a luz e sentou na cama perto de mim. – Roxanne? Eu recebi sua mensagem no aeroporto, eu estou aqui garota... O que foi? - Com suas mãos ela puxou o edredom da minha cabeça e ligou o abajur ao nosso lado. – Vamos lá, eu sei que você está acordada.

– Eu achei que você chegava só daqui a um mês. – Minha voz estava baixa e rouca.

– A escola me liberou antes ainda e eu resolvi vir logo para cá, mas isso não é o que importa.

Eu suspirei e me sentei na cama. Érica tirou a bota que estava usando e entrou de baixo do edredom junto comigo colocando seu braço entorno dos meus ombros. Eu então contei tudo que havia acontecido horas antes. Nem percebi que algumas lágrimas escaparam quando eu terminei.

– Você se meteu numa situação muito complicada garota. – Sua mão no meu braço se apertou e sua boca beijou meus cabelos. – Mas você não é a pior como acha que é.

– É claro que eu sou Érica. Eu magoei os dois de uma forma irreparável!

– Irreparável é algo que não deveria existir em seu vocabulário, Roxanne. Estou falando sério. Não tem controle de seu próprio coração e isso aconteceu. Mas agora você tem que decidir o que vai fazer... Vamos primeiro dar um tempo para a sua mente, ok?

Eu levantei meu rosto para olhá-la e me perguntei o que eu fiz para merecer tantas pessoas legais perto de mim. Assenti, mas não consegui sorrir. Sendo sexta-feira as coisas ficavam mais fáceis já que não teria que ver Sara na escola no dia seguinte.

– Por que amanhã nós duas não saímos? Faz muitos anos que não venho para o Brasil e preciso de uma guia urgente. – Piscou para mim e eu assenti novamente. – Acho que não quer que seus pais te vejam assim, não é? Bom... Vamos simplesmente dormir aqui.

– Você não quer tomar um banho nem nada?

– Estou ótima.

Isso era tão a cara dela.

Mas enfim, nós duas deitamos e não a vi dormir por que apaguei assim que fechei meus olhos, mas me pergunto qual foi a reação dos meus pais ao nos verem ali.

DilemaOnde histórias criam vida. Descubra agora