Capítulo 9

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SENTEI NA CAÇAMBA DO CAMINHÃO, ME APOIANDO

ENTRE um saco de farinha de trigo e um barril de algum líquido que

jorrava para lá e para cá. Meu coração estava disparado. Eu não sabia que

tipo de barulho meu pouso tinha feito, mas o motorista não tinha

encostado o carro e sequer diminuído a velocidade. Depois de alguns

minutos me senti segura o suficiente para tentar dar uma espiada e

reconhecer a redondeza.

Lá na frente, iluminado contra o céu que amanhecia, surgia o

contorno de um palácio com torres. O reflexo de luzes de carvão brilhava

nas janelas da construção. Eu a reconheci imediatamente: Hampton Court.

Eu me lembrava daquele palácio como sendo a residência de

Henrique VIII e de todas as esposas dele, uma atração turística antes dos

Dezessete Dias. Mary e eu costumávamos visitá-lo com nossas governantas,

Rita e Nora, quando éramos pequenas. Nós navegávamos pela cidade no

Barco Real, seguindo as margens verdes do rio e acenando para quem nos

observava enquanto passávamos. Era o que mais gostávamos de fazer no

verão. Nós nos vestíamos com vestidos brancos e chapéus de palha de abas

largas. E o palácio era fechado para o público, a fim de que pudéssemos

ficar no jardim tomando chá gelado com bolinhos.

Quando passamos pelo portão da frente, me escondi embaixo de um

saco de farinha. Mesmo que o exército de Hollister estivesse precisando de

novos recrutas, eu duvidava que eles iriam gostar de descobrir um

passageiro clandestino no caminhão de mantimentos.

O caminhão diminuiu a velocidade e parou. Esperei ouvir os passos

do motorista desaparecem na direção da entrada, mas em vez disso ouvi-o

se aproximar dos fundos do veículo. Segurei a respiração.

— O que temos aqui? — um homem com cabelo sujo e cacheado e

um nariz torto afastou os sacos para o lado, revelando meu esconderijo. Ele

sorriu para mim com a boca cheia de dentes quebrados.

— Estou aqui para me alistar no exército — eu disse, forçando a

voz para parecer mais forte, dura e neutra.

— Na caçamba de um veículo de serviços alimentares? Isso me

parece mais roubo.

— Por favor — eu implorei rapidamente. — Está frio aqui fora e eu

estava caminhando desde Londres. Pode checar: não toquei em nada.

O guarda me olhou de uma maneira estranha. Percebi o olhar dele

percorrendo meu rosto, meu peito e minhas pernas. Congelei. Será que ele

tinha me reconhecido?

— Bom, você está com sorte — ele falou. — Não existe alistamento

aos domingos. Em geral, você teria que voltar amanhã de manhã. Mas, como

A Última PrincesaOnde histórias criam vida. Descubra agora