Capítulo 20

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NUVENS ESCURAS DE FULIGEM ATRAVESSAVAM O CÉU DA

cidade. O dia virava noite. Um som de manivela vinha da parte de trás da

torre. A ponte levadiça estava sendo baixada e os guardas estavam

trocando de posições — bem no horário. Agachei-me, pronta para correr,

alongando, com um sorriso amargo, os músculos doloridos.

Eu tinha passado o dia examinando minuciosamente a Torre, e

agora conhecia cada centímetro do terreno, do fosso e do muro em volta da

construção. Tinha decorado os horários da ponte levadiça. Se eu me

apressasse, alcançaria os soldados que estavam prestes a entrar na Torre e

me juntaria a eles, entrando despercebida, em seguida, na cozinha. De lá eu

seguiria o jantar de Hollister até o quarto dele, cuja localização poderia ser

secreta mesmo para os súditos, mas os roncos do meu estômago me

lembravam que todo mundo precisa comer.

Disparei na direção do muro que circundava a Torre, me mantendo

abaixada e confiando na escuridão para me esconder. Parei por um

momento à sombra do muro para recuperar o fôlego e limpar o suor da

testa. Duas filas de guardas marchavam firmemente em direção à ponte

levadiça. Quando o último soldado passou, entrei na fila atrás dele,

mantendo a cabeça baixa e seguindo o ritmo dos pés dele.

Estremeci quando atravessamos a ponte levadiça que levava à

Torre. Desde que a visitara quando era pequena, sempre tivera muito medo

dela. A guilhotina, as marcas na pedra onde a lâmina tinha batido diversas

vezes, as manchas de sangue que ainda existiam depois de centenas de anos

de chuva. Eu pensava nas câmaras de tortura, onde prisioneiros inocentes

sofreram — e ainda sofriam. E me perguntava se eles gritavam, sem serem

ouvidos nem respondidos, como a mulher no parque. Eu sabia que os gritos

dela iriam assombrar meus sonhos e me dar pesadelos.

Já lá dentro, encontrar a cozinha foi fácil: só precisei seguir o cheiro

de comida e a fila de soldados famintos. Mantendo os olhos sempre baixos,

entrei no fim da fila, me misturando com os outros ao passar por uma

entrada de pedra. Apertei a arma escondida dentro do casaco. Nos

corredores escuros da Torre de Aço, um sino bateu e uma voz soou lá de

cima: — Hora de alimentar os prisioneiros.

A fila de soldados se encaminhou para uma cozinha úmida,

localizada em um calabouço. Panelas de ferro borbulhavam sobre o fogo. Lá

dentro, vários cozinheiros cortavam a cabeça e o rabo de ratos e ratazanas,

de cobras de esgoto e de sapos. Em seguida, tiravam a pele dos animais e

jogavam as carcaças nas panelas. Uma gaiola no chão, perto do fogo, estava

A Última PrincesaOnde histórias criam vida. Descubra agora