Epílogo

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ERA UM DIA PERFEITO DE VERÃO. CHUMAÇOS DE NUVENS

cruzavam o céu azul-claro enquanto uma leve brisa soprava a grama sob a

luz quente do sol. Havia um festival de rua acontecendo na praça do

vilarejo para celebrar a coroação de Mary e agradecer ao povo de Balmoral

por sua ajuda. Havia também quadrilhas, mastros enfeitados para as

crianças, jogos e brincadeiras, e um palhaço malabarista, além de violinistas

e de escoceses tocando gaitas de foles. Cavalos e burros de crinas penteadas

e trançadas com fitas douradas estavam à disposição para serem montados

pelas crianças da cidade. Sorri ao ver Calígula, uma cabeça mais alta do que

os outros cavalos, carregando três crianças nas costas e aguentando

pacientemente várias outras que lhe penteavam o rabo. A igreja tinha sido

pintada desde que o exército de Hollister tentara queimá-la, e ela brilhava

de tão branca sob o sol.

Tendas tinham sido armadas na praça para o caso de chuva, mas

não havia chance de isso acontecer. Fileiras de longas mesas se espalhavam,

cobertas com tortas e bolinhos caseiros, pães recém-saídos do forno,

queijos, cidra gelada, e outras delícias há muito esquecidas. Pessoas

viajaram quilômetros para participar da festa.

Em seu primeiro ato como rainha, Mary doou as terras reais para os

fazendeiros britânicos. Por toda a Inglaterra, safras frescas foram plantadas

para alimentar a nação. As massas não estavam mais passando fome. E o

mais importante: Cornelius Hollister estava seguramente preso na Torre de

Aço, e o exército dele havia debandado.

Mary recebia seu povo de braços abertos. A ferida provocada pela

flechada ainda lhe causava dor, e, apesar de ela tentar disfarçar, às vezes eu

a via estremecer, antes de se policiar e disfarçar com um sorriso gracioso.

Eoghan estava constantemente ao lado dela, o cabelo escuro e trajando um

terno de verão azul-marinho. Os dois filhinhos dele brincavam nos mastros

enquanto ele e Mary observavam.

Depois da prisão de Hollister, Wesley e eu havíamos ido até a casa

onde Nora e Rita moravam. Nós as encontramos cansadas e magrinhas,

meros esqueletos do que tinham sido, vivendo de ervas e dos enlatados que

tinham armazenado. Então decidimos trazê-las para Balmoral, onde foram

instaladas na pequena casinha de jardinagem: uma casa nova, livre das

lembranças que lhes traziam pesadelos desde aquela noite. Mas nunca lhes

contei que eu tinha participado daquele assalto.

Eu estava em uma área ensolarada no gramado vendo Wesley e

Jamie jogarem futebol. Jamie finalmente estava aprendendo os truques do

jogo que antes nunca pôde jogar. Minha visão ficou turva com lágrimas

enquanto ele ria e corria, chutando a bola livremente. Por que será que

cenas felizes agora enchiam meus olhos de lágrimas? Mas eu não queria

chorar. Assim, me levantei e me dirigi para as mesas repletas de comida.

Polly, Clara e George estavam reunidos em volta do general

Wallace, que contava novamente histórias sobre os aviões de guerra em que

voara muitos anos atrás. Clara estava sentada bebendo um copo de

limonada. Ela usava um vestido novo, que ela mesma tinha costurado. Eu

reconheci o tecido: pequenas flores roxas contra o fundo azul. Aquilo já

tinha sido a cortina do quarto de Polly.

Polly se aproximou. Ela tinha prendido o cabelo no alto e usava um

vestido branco e amarelo que já tinha sido de Mary.

— Você está bonita — eu disse.

— Você também — Polly retrucou.

Meu cabelo tinha crescido até um pouco abaixo das orelhas, e a

cicatriz no rosto estava desaparecendo.

— Você viu aquele bolo de chocolate? Estou morrendo por um

pedaço.

Peguei na mão dela.

— Vamos pegar um pedaço — então caminhamos até a mesa,

olhando embasbacadas para o bolo redondo de três andares. Eu não

conseguia me lembrar da última vez em que tinha comido chocolate. Aquilo

era uma raridade.

Quando cortamos uma fatia para dividir, vi um garotinho

carregando uma tigela branca e azul cheia de morangos. Ele parecia ter 5 ou

6 anos e vestia um macacão.

— Dá só uma olhada nesses morangos! — Polly gritou, a boca cheia

de bolo. — Onde você os encontrou? — ela perguntou para o menino,

olhando embasbacada para a tigela como se olhasse para uma linda obra de

A cor vermelha vibrante das frutas e o brilho delas era de encher a

boca de água — mas também havia algo estranho nelas. Eu peguei um,

depois outro, e depois um terceiro. Cada morango era exatamente igual,

como se tivessem sido feitos com um molde.

Polly colocou um morango nos lábios, prestes a mordê-lo.

— Polly, espere! Não! — eu gritei, derrubando o morango das mãos

dela. Um tom de rosa manchou-lhe os lábios.

— O que foi? — ela gritou, assustada com o pânico que viu nos

meus olhos.

Então peguei rapidamente um guardanapo e limpei o sumo dos

lábios dela, como uma mãe faria com uma criança. Em seguida, abri a fruta

no meio com os dedos. Lá dentro estava cheio de pequenas estrelas de

metal. Deixei o morango cair no chão, me virando para correr atrás do

menino. Percorri a grama superlotada, procurando o azul do macacão dele,

o cabelo louro quase branco, mas não o vi entre as pessoas dançando,

bebendo e tocando música. O sol bateu no meu rosto e protegi os olhos,

mas sabia que não iria encontrar mais nenhum sinal dele.

O menino tinha desaparecido.

A Última PrincesaOnde histórias criam vida. Descubra agora