"Fertylla, eles o encontraram."
Audível, o sussurro chegou em sua mente, captando a essência contida neste, soube de quem era.
Saindo de seu estado de torpor, se ergueu e caminhou até a entrada da caverna. Uma nova lufada de vento invadiu o ambiente e pareceu rodar em sua volta eriçando os pelos de seu braço. Dali ela podia ouvir o tilintar do metal que se chocava logo acima e o rasante das asas que cortavam os céus. A guerra logo chegaria e os anjos já estavam agitados como se ela pudesse começar a qualquer segundo.
Olhando além, observou as torres e os alvos campos que cresciam ao pé da encosta onde estava. Focando ainda mais o olhar pode observar as formas que corriam pelos campos, animais das mais variadas espécies que andavam livres pelo sétimo céu onde Mickel montara guarda com seu exército.
Seus olhos se voltaram para o horizonte e ela caminhou até a beirada do precipício onde a boca da caverna surgia, um raio de luz bateu em seu corpo como se sinalizasse que o momento chegará. Fechando os olhos, sentiu momentaneamente o calor que a luz trazia contra o seu corpo e com essa sensação gravou aquele momento em sua mente. A guerra a alcançara e o momento de retomar a sua luta chegara. Enquanto se atirava do precipício, permitiu que os eventos que antepassaram a sua vida até ali passassem em sua mente, ao fim abriu um sorriso e se permitiu ser livre.
Ao longe seria possível ver os seus cabelos vermelhos chacoalharem contra o vento enquanto despencava, segundos depois eles explodiram em tons ainda mais intensos junto a uma onda de energia escarlate que percorreu seu corpo.
Inundando sua mente, sentiu quando a energia irrompeu de cada poro de seu corpo e a tomou como chamas em palha seca. O brilho escarlate a dominou correndo a sua volta como ondas que ganhavam vida e pareciam dançar, independente do vento ou de qualquer lei conhecida. Rapidamente suas costas pesaram e delas um imenso par de asas brancas surgiu, abrindo-as, levantou o corpo e com um rasante sobre rochas que se aproximavam começou a planar em direção ao horizonte. Ao longe um rastro cada vez maior de energia escarlate, como um cometa, pode ser visto a partir de seu corpo que em um único instante explodiu em luz e desapareceu junto ao rastro como se nunca tivesse existido.
Parada, Fertylla retirou o elmo de sua armadura e observou o demônio a sua frente que pela expressão parecia duvidar do que via. Atrás dele, outros demônios se encolhiam e se desmaterializavam fugindo.
_ Este é um péssimo dia para ter saído Laufell e pelo visto seus amigos o abandonaram.
_ Ah, capitã, diretamente das asas de Mickel no sétimo céu, não seria mais prudente que permanecesse o bajulando?
_ Ah não se preocupe, acredito que Mickel ficara feliz em ver o estrago que vou lhe causar.
_ Tola, não imagina o poder que acumulei desde nossa última batalha. - Puxando sua espada novamente, o demônio começou a envolver seu corpo em uma espécie de fumaça negra que o rodeou e avançou contra Fertylla que o alcançou ainda no ár.
O brilho da energia escarlate chocou contra as trevas e ambos pareceram se engolfar no ar enquanto suas espadas se chocavam e ambos subiam pelo céu.
De onde estava, Lyra observou sua comandante e o duque se erguendo cada vez mais enquanto batalhavam, se voltando para Kille viu o fascínio no rosto do garoto que agora observava a cena como a um espetáculo, seus olhos antes com medo agora brilhavam. O despertando da visão, o segurou em seus braços e dirigiu a ele:
_ Temos que ir agora.
_ Mas e quanto a ela, não podemos deixá-la, ela é a capitã!
_ É sim, e por isso temos de ir, ela vai ficar bem, mas a presença dela aqui irá trazer outros demônios, mais duques vão vir.
_ Mais um motivo para ficarmos, você pode ajudá-la.
_ Ela ficará bem garoto. - Vindo de um outro ser, a voz chamou a atenção de ambos que brevemente se colocaram em posição de defesa, mas logo que sentiram a energia que se aproximava afrouxaram as mãos. - Não se preocupem, Fertylla sabe se cuidar e logo nos alcançara. Mas como sua mãe disse, realmente temos que ir.
Reconhecendo o segundo dos capitães a sua frente, Lyra guardou a sua espada e seguiu em sua direção, um sorriso brilhava no rosto do capitão enquanto os observava. As suas costas, Kille que naquele estado já conseguia sentir energias o estudava como se aquele fosse o primeiro ser sobrenatural que virá naquela noite. Soltando também um sorriso seguiu sua mãe enquanto o ser erguia sua mão na direção contrária a eles e criava um vórtice de luz branca. Se virando, o próprio ser entrou no vórtice enquanto sua mãe se postou ao lado em sua espera.
Voltando o olhar para os céus, viu um último relance das energias que se chocavam e sem aguardar pulou para dentro do vórtice enquanto falava para si mesmo:
_ Ele é da segunda raça.
Momentos depois que ambos entraram no vórtice e ele desapareceu, o chão voltou a ganhar uma nova cratera com a queda de Laufell que fora lançado dos céus por um ataque de Fertylla. Já sem forças, o demônio tentou se arrastar no centro do buraco que surgiu com sua queda, mas antes que ele avançasse alguns metros o chão voltou a tremer com o pouso de Fertylla as suas costas. Sem expressar sentimentos, a capitã caminhou até o demônio que naquele momento tentava se levantar e usando uma das pernas o jogou de volta ao chão, ainda com a perna sobre as costas do demônio, abaixou e agarrando duas de suas asas as puxou. Enquanto o demônio gritava, o chão vibrou e começou a abrir devido a força com que seu corpo era prensado contra a terra, logo suas costas estalaram e o sangue negro brotou das duas asas que se partiram de suas costas restando apenas dois rasgos e pedaços de ossos onde antes elas nasciam. Enquanto gritava amaldiçoando a capitã, o demônio sentiu o aperto saindo de suas costas e voltou a se arrastar tentando se afastar de Fertylla que agora só o observava.
Deixando um rastro de sangue negro que parecia queimar até mesmo a terra, o demônio foi se afastando, mas logo congelou ao sentir a voz da capitã, dessa vez brutal e penetrante como uma espada pronta para o abate:
_ Avise a ele, avise a Lucifer que ele voltou.
Olhando para as suas costas, Laufell contemplou o olhar de Fertylla e teve certeza de quem a Potestade se referia. Foi então que com uma explosão de luz, assim como ela chegara, também desapareceu, deixando apenas o duque e suas duas asas arrancadas jogadas ao lado da cratera.
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PRINCIPIUM
General FictionAs bombas caiam de forma sincronizada. Para aqueles distantes das grandes cidades, foi uma bela visão, uma daquelas que sempre nos arranca o fôlego ao lembrar. Para aqueles que ardiam em chamas, o Inferno se tornava real. Os gritos vinham de todos...