Capítulo 22

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Com um suspiro, colocou o capuz do pesado casaco e andou até a pista para tomar um ônibus. Chegou no curso molhada até os ossos, o cabelo encharcado e o rosto branco de frio. Os amigos de classe começaram a ajudá-la. Uma enxugou seu cabelo com uma toalha de papel enquanto outro tirou suas botas e as meias molhadas.

- Meias de homem! -alguém gritou, fingindo estar horrorizado- A bela dama usa meias grossas de homem por dentro das botas femininas!

Todos riram e Anahí também, sentindo-se solta e livre pela primeira vez em semanas. Sua blusa estava molhada e Paul tirou o próprio suéter de lã preta para ela vestir. As garotas da classe fizeram uma barreira protetora contra os olhares masculinos.

Quando ficou pronta, as roupas molhadas foram colocadas na frente do aquecedor e Anahí não vestia nada além da lingerie, sob o suéter que batia em seus joelhos.

A aula acabou e as roupas continuavam úmidas. Paul ofereceu uma carona direta para sua casa em vez de irem ao pub, e Anahí aceitou, apesar de ficar alerta com a expressão dele.

Entraram no carro esportivo e ela relaxou, confortada pelo ar quente.

Paul: Está melhor? -ele perguntou-

Anahí: Sim, desculpe fazê-lo perder o aperitivo.

Paul: Não tem problema, prefiro ficar aqui com você. -disse com a voz rouca-

Um calafrio percorreu seu corpo.

Anahí: Na próxima pode virar à esquerda. –falou, mudando de assunto-

Paul: O que Alfonso acha de você estar comigo toda quarta-feira à noite?

Anahí engoliu em seco. Não queria falar sobre Alfonso, nem baixar sua guarda.

Anahí: Ele me dá o maior apoio -respondeu, rindo da mentira. Alfonso detestava que ela fizesse o curso e detestava vê-la sempre com o caderno de desenho na mão, lembrando-o quem era o responsável por sua volta às artes-

Paul: Mas ainda não fez nenhuma caricatura dele. Já desenhou todos da família, menos Alfonso.

Anahí: Ele não é um bom modelo -ela disse- Agora pode seguir reto até a próxima bifurcação.

Paul: Alfonso? Pois acho que ele é o modelo ideal, um demônio nos negócios e um homem comum em casa. Um ótimo tema para uma caricatura misturando os dois.

Não concordou. No momento, não via nada de engraçado em Alfonso. Há algum tempo teria se deliciado fazendo a caricatura dele, agora não mais.

Anahí: Um dia desses vou fazer. Chegamos. Minha casa é aquela branca com a BMW preta na frente.

Alfonso já estava em casa. Sentiu um arrepio que não era de frio.

Paul parou e desligou o carro. Podiam escutar o barulho da chuva nos vidros. Ele virou-se no banco para olhar Anahí e ela o encarou.

Anahí: Bem, obrigada pela carona. -disse, sem fazer nenhum movimento para sair do carro. Sentia-se presa numa armadilha pela expressão de Paul, pelo calor do carro e pela própria sensação de desejo-

Paul: Foi um prazer -disse, ausente-

A mente dele estava longe, procurando no rosto de Anahí um sentimento que ela não sabia se aparentava ou não. Logo percebeu que sim, pois Paul inclinou-se e beijou seus lábios com suavidade. Não correspondeu nem se afastou. A mão dele acariciou seu rosto, o polegar tocando seus lábios para que abrissem. Subitamente, ela teve certeza que não era o que queria e afastou-se. Ele a deixou se afastar, encostando-se no assento e olhando-a através dos olhos semicerrados.

Anahí: Desculpe -ela murmurou, confusa-

Paul: Do quê?

Anahí não conseguiu responder, só queria estar fora do carro e começou a abrir a porta.

Paul: Você quis ser beijada, Anahí -disse com suavidade- Não importa o que pense, lembre-se de que desejou o beijo tanto quanto eu.

Ele tinha razão, e ela corou de culpa. Quisera o beijo para sentir como seriam outros lábios que não os de Alfonso sobre os seus.

Agora sentia-se infantil e irritada por ter deixado acontecer. Não queria que Paul pensasse que haveria lugar para ele em sua vida. Alfonso era o único homem que amava. 

Que droga! O amava com mais paixão a cada dia!

Correu para a casa debaixo da chuva e só então pensou se Alfonso vira sua chegada. Olhou para as janelas e não viu movimento atrás das cortinas. Com certeza, ele esperava que ela viesse de ônibus e não deu atenção ao barulho do carro de Paul.

Alfonso não estava na sala. A porta de escritório permanecia aberta e nem sinal dele. Anahí o encontrou na cozinha.

Anahí: Chegou mais cedo do que eu esperava. -ela disse casualmente ao entrar-

Charmoso, vestindo jeans e uma camiseta preta, ele ignorou o comentário dela e suas mãos tremeram um pouco ao colocar água na chaleira.

Alfonso: Chamei um táxi para levar minha mãe. Ela ficou preocupada ao ver seu carro na porta e você desaparecida. Poderia ter avisado que mudou de idéia.

Anahí: O carro não pegava, então decidi ir de ônibus. Não imaginei que Ruth fosse ficar preocupada. Amanhã ligo para me desculpar.

Silêncio.

Alfonso parecia concentrado na preparação do chá e nem lhe dirigiu o olhar. Anahí percebeu que ele estava bravo por algum motivo. Teria visto algo?

Anahí: Estou ensopada... -disse num esforço para parecer normal e corando de culpa- Vou subir e tomar um banho quente. Você já comeu? Posso fazer seu jantar...

Alfonso: Não! -falou com tanta violência que ela afastou-se. O observou recuperar o controle e respirar fundo- Não. -repetiu devagar- Eu já jantei, obrigado.

Ela sentiu um frio na espinha, sem saber se era medo ou culpa. Subiu e deitou-se, preparada para enfrentar Alfonso quando subisse para o quarto. 

Ele não subiu. Alfonso não entrou no quarto aquela noite.

A Falta que Você me Faz [ADP]Onde histórias criam vida. Descubra agora