Cap. 37 | Elisa - Revisado

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Henrique morde o corte no meu braço, seus lábios tocando a minha pele, e, enquanto ele suga meu sangue, sinto um leve formigamento correr pelo meu corpo. O calor da magia de cura tenta, com esforço, percorrer minhas veias. Ele está tentando ativar meu poder de regeneração, desesperado para me salvar. A dor excruciante que antes queimava em minha pele começa a diminuir, e um alívio tênue se espalha, mas a exaustão ainda me prende. Minha respiração está pesada, e meus olhos mal conseguem se manter abertos.

Abro os olhos e vejo Henrique, meu noivo, com o meu sangue escorrendo de sua boca. Há uma mistura de desespero e determinação em seus olhos enquanto ele se inclina sobre mim, a preocupação evidente em cada gesto.

— Você vai ficar melhor — ele sussurra, e sem esperar por resposta, se joga em cima de mim, como se quisesse me proteger de tudo ao nosso redor.

Ouço barulhos de luta ao fundo, som de corpos se chocando, de magia se manifestando no ar. Minha mente volta para Clementina. Ela estava lutando por nós. Ela veio para nos salvar, penso, enquanto tento reunir forças. Viro a cabeça com dificuldade e, por um breve momento, vejo Clementina. Ela está lutando... e perdendo. Charlotte a domina, sua magia é brutal, implacável.

O desespero aperta meu coração, e eu sei que preciso fazer algo, qualquer coisa. Meus lábios se movem, murmurando palavras antigas, o único feitiço que consigo lembrar naquele estado de fraqueza.

Oled kõigist tugevam, ole kerge, ole vari, ole võimas, anna talle jõudu... — tento conjurar o feitiço, minha voz mal sai. As palavras soam fracas, distantes, como se pertencessem a outra pessoa. Nem sei se funcionou, mas não posso desistir.

Forço meus olhos a se abrirem novamente, tentando ignorar a dor que pulsa pelo meu corpo. Minha visão se ajusta a tempo de ver Clementina no chão, imóvel, e por um instante meu coração parece parar. O corpo dela está fraco, derrotado. Mas, então, algo estranho acontece.

Uma luz, intensa e pura, começa a irradiar do peito de Clementina. É tão forte que me faz ofegar, algo que nunca vi antes. A luz se expande, lentamente, envolvendo seu corpo inteiro. Ela brilha com uma força descomunal, como se seu próprio ser estivesse se transformando. O alívio que Henrique havia me dado desaparece, substituído por uma mistura de choque e fascínio. Charlotte, que até então parecia imbatível, agora olhava para a cena com a mesma incredulidade que eu. O que estava acontecendo?

A luz continuava se alastrando, como se emanasse de dentro de Clementina, até seu corpo inteiro estar envolto por um brilho resplandecente. Quando finalmente para de brilhar, percebo que algo havia mudado. E drasticamente.

Clementina... Ela não era mais a mesma. Seus cabelos loiros, antes opacos e sem vida, agora reluziam com um tom de caramelo dourado, como se estivessem banhados pela luz do sol. Seus olhos, antes de um verde apagado, agora brilhavam intensamente, um verde vívido, cheio de vida. Sua pele, que costumava ser pálida, estava saudável, com uma tonalidade normal, como se a vida tivesse voltado a ela. E seus lábios, que antes eram quase incolores, agora tinham um tom avermelhado, vibrante. Ela parecia maior, mais imponente. Seus traços, que antes já eram belos, agora estavam divinos, quase como se ela fosse uma deusa encarnada.

Charlotte, que antes exibia confiança e arrogância, agora estava paralisada, incapaz de processar o que estava diante dela. Eu também.

E então, Clementina abriu os olhos. Quando seus olhos se encontraram com os de Charlotte, algo mudou novamente. Os olhos verdes brilhantes de Clementina subitamente ficaram vermelhos, como o sangue mais puro e intenso. Algo havia despertado nela, algo que eu não conseguia explicar, mas que claramente mudava o rumo daquela luta.

— Enfrente a fúria de Sadigam — a voz de Clementina ecoou pela sala, mas não era mais sua voz. Era profunda, poderosa, masculina, como se algo ou alguém estivesse falando através dela.

Um arrepio percorreu minha espinha ao ouvir aquelas palavras. Havia algo de primordial naquela entonação, algo que eu jamais havia presenciado antes. As mãos de Clementina começaram a brilhar com uma intensidade quase insuportável, a luz tão forte que tive que semicerrar os olhos. Até Henrique, que estava tentando me proteger, desviou o olhar, incapaz de suportar o brilho.

Eu mal conseguia respirar. Clementina estava diferente, completamente dominada por essa nova força, e ao invés de desespero, senti um misto de admiração e terror.

Ela ergueu as mãos brilhantes, e a luz tomou a forma de raios de pura energia, que se lançaram em direção a Charlotte. Não era uma simples rajada de poder. Não, era mais do que isso. Eu vi claramente quando uma sombra negra começou a ser puxada de Charlotte, como se Clementina estivesse sugando sua essência. A energia negra parecia ser arrancada dela, forçada a sair, e o grito que Charlotte soltou foi um som de pura agonia, que reverberou pelo espaço como uma onda de dor.

Os gritos de Charlotte ecoavam pela sala, e eu a observei, completamente impotente. Sua expressão de arrogância e superioridade havia desaparecido, sendo substituída por um terror absoluto. Charlotte estava se contorcendo, tentando resistir, mas era inútil. A energia negra fluía de seu corpo como uma sombra, sendo devorada pelo brilho implacável de Clementina.

A intensidade da cena me fez perceber que eu não estava apenas testemunhando uma luta comum. Era como se algo mais antigo, algo divino estivesse intervindo. A luta de poder entre vida e morte, entre luz e trevas.

Finalmente, depois do que pareceu uma eternidade, Clementina parou. O brilho ao redor dela diminuiu gradualmente, e suas mãos cessaram de puxar aquela escuridão. Charlotte, por outro lado, caiu ao chão com um baque seco. Seu corpo parecia esvaziado, sem vida, sem alma. O grito cessou abruptamente, e o silêncio tomou conta do ambiente.

Charlotte estava morta.

Meu coração batia forte, e eu mal conseguia acreditar no que acabara de acontecer. Clementina ficou de pé, ainda resplandecente, mas agora calma, olhando para o corpo inerte de Charlotte.

Um raio de luz explodiu das mãos de Clementina, iluminando cada canto da casa com uma intensidade que era quase ofuscante. A luz se espalhou como um fluxo de energia pura, envolvendo tudo em seu caminho. As paredes tremiam, e o ar estava carregado com uma sensação de poder absoluto, uma onda de magia que pulsava como um coração.

Mas, assim que a luz começou a se dissipar, um grito profundo ressoou dentro de mim. Clementina caiu, o brilho de suas mãos se apagando, como se toda a energia tivesse sido drenada de seu corpo. Ela desabou no chão com um baque, a luz que antes emanava dela agora se foi, e a sala, que antes estava radiante, foi subitamente preenchida por uma escuridão opressiva.

— Clementina! — chamei, a voz trêmula, enquanto me agachava ao seu lado. — Por favor, acorde!

Adotada por VampirosOnde histórias criam vida. Descubra agora