Tive que concordar com Viriato quando ele disse que há certa verdade na máxima de que falta de sexo deixa as pessoas de mau humor, pensando que, consequentemente, a existência de sexo eleva o astral. Aquela segunda-feira de meio de novembro deve ter sido uma das melhores da minha vida. Nunca, nunca antes fui para o trabalho tão feliz quanto naquele dia. Saber que eu chegaria ao prédio e não precisaria evitar Viriato, mas, pelo contrário, iria tratá-lo como um ser humano normal era quase como começar um emprego novo onde seu superior é seu melhor amigo. Não só ele era outro, mas eu também era.
Tivemos de nos controlar. Minha vontade era migrar minha mesa para o lado da mesa dele e ficar por lá mesmo, na sala dele, mas precisávamos manter as aparências. Boa parte dos meus colegas—todos, quase—sabiam que eu era gay, mas eu não podia expor Viriato nem dar deixas para que os outros captassem alguma coisa que deveria ser mantida em sigilo. O máximo que fizemos pelos dias que seguiram foi almoçar juntos. Nada mais. Digo, isso e uns amassos na escada para o estacionamento, também. Era o que dava para fazer. Estávamos jogando um jogo perigoso, eu sabia, mas a adrenalina, a sensação de perigo, de estar em um lugar público e poder ser descoberto, isso dava um sabor ainda mais picante ao nosso crime. Eu é que devia tomar muito cuidado para não acabar me apaixonando, pois, se acontecesse, eu estaria em maus lençóis.
Passei a transmitir ao meu cérebro, desde o final de semana que passamos na casa dele, a mensagem "Isso é só curtição, Eugênio, ele é casado, tem uma filha da sua idade, ama a esposa; você é só um garoto; aproveite, mas não se envolva; ele é seu chefe" e ela foi eficaz, de fato. Eu estava ciente de que havia um limite e eu não deveria transpô-lo. Por isso não me preocupei tanto; deixei que as coisas fossem fluindo naturalmente. Conversávamos sobre assuntos de trabalho no escritório, nos falávamos no WhatsApp sobre outras coisas à noite, eu ia para a faculdade, ele ia ficar com a esposa, tudo dentro da conformidade. O que me deixou ligeiramente desapontado foi o fato de não ter ninguém com quem compartilhar essa história. Eu tinha meus contatos virtuais, mas não era a mesma coisa contar a eles que contar a alguém de carne e osso.
A primeira e única pessoa com quem falei sobre Viriato foi Jéssica, assim que me lembrei de que ela era parte do meu círculo de amigos da vida real, era lésbica e seria excelente ouvinte para esse causo. Não me tomaria meia hora explicar que eu tinha um chefe insuportável e que agora nós dois transávamos. Dei a ela alguns spoilers sobre a trama na quarta-feira e marcamos de nos encontrar na sexta para que eu desse mais explicações. Como quase nunca tínhamos aula depois das nove, não era raro que fôssemos para a casa dela esticar a noite; só pedi a ela que, desta vez, ela não chamasse o restante da turma, porque eu ficaria tímido de compartilhar a saga toda com as outras pessoas. Ela concordou.
Esses planos, porém, foram bruscamente alterados na quinta-feira. Era uma noite em que minha mãe estava em casa, de folga. Eu acabava de chegar da faculdade, cansado, mas bem-humorado. Assim que abri a porta da sala, escutei um tititi muito atípico e estridente, parecendo briga vindo do quarto dos meus pais. Eles brigavam, às vezes, sim, como todo casal, mas nunca naquela altura, nunca aos gritos. Senti meu coração disparar; algo sério deveria estar acontecendo. Subi as escadas rápido, deixei minha mochila no meu quarto e fui até onde toda a algazarra estava acontecendo. Eles falavam tão alto e ao mesmo tempo que eu não conseguia entender qual era o motivo da discussão.
— Por que é que vocês estão brigando nessa altura? Tá dando pra ouvir seus gritos lá debaixo, mãe.
Sílvia estava na beira da cama, como uma fera pronta para dar o bote. Meu pai, molhado, enrolado em uma toalha, parecia acabar de sair do banho, tentando se defender do ataque que minha mãe armava.
— Seu pai, Eugênio! Seu pai! Seu pai...!
Tinha mais a ser dito, mas ela não conseguia completar a frase.
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Prazer e Remissão (romance gay)
Romance::: LIVRO COMPLETO! ::: NÃO RECOMENDÁVEL A MENORES DE 18 ANOS. Quando ingere uma superdose de sedativos para dar cabo da própria vida, Eugênio só quer se livrar daquele poço sem fundo de desgosto, tristeza e solidão. Ao acordar deitado no chão de...