12 - (DES)ALENTO (parte 2)

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Cláudio era um mistério. Acabei percebendo que o que eu sentia por ele não era paixão, mas uma curiosidade terna, intensa e constante. Eu queria entendê-lo, conhecê-lo, saber o que existia por trás da casca. Não que ele fosse falso ou inane, mas eu sempre tive a impressão de que eu não conseguia alcançá-lo em toda sua profundidade. E o que mais me intrigava era não saber ao certo o que ele pensava sobre mim. Eu não sabia. Não tinha como saber. Nós não conversávamos o suficiente para que eu tivesse uma resposta satisfatória e eu jamais, sendo amigo dele ou não, perguntaria isso com todas as letras, usando seja lá qual paráfrase, para ter algum tipo de confirmação.

Talvez eu estivesse lendo as entrelinhas erradas. Como eu disse, a beleza é das coisas pequenas. Cláudio nunca saiu sem me dizer aonde estava indo e me perguntar se eu queria ir junto. Que obrigação ele tinha de fazer isso? Zero. Não importava se era para ir à casa da Jéssica—quando eu geralmente aceitava—ou se para sair com pessoas que eu não conhecia nem de nome ou para ir ao cinema com a Carol: ele sempre me convidava. E eu quase sempre recusava. Talvez por isso tenha permanecido um pouco cinzenta a nossa relação por certo tempo... Então houve um dia em que resolvi aceitar um convite e sair com ele.

Por coincidência o bastante, o convite foi feito na semana em que completaria quinze dias que eu saíra de casa; quinze dias que me pareceram quinze anos. Meus pais, conforme o esperado, não se manifestaram em nenhum aspecto. Nenhuma ligação, nenhuma mensagem, nenhum sinal de vida ou de preocupação com a minha vida. Foi como se eu tivesse perdido os dois, ao mesmo tempo, num incêndio fatal, e tivesse sido adotado agora por Cláudio e Francisco, que eram o mais próximo de uma família que eu tinha. Quando parei para pensar nisso, fui tomado de assalto por uma solidão sem precedentes. Nunca, nem nas minhas horas mais sombrias, me senti tão sozinho, abandonado. Mas, decidido a não me deixar abater por isso que eu sentia, aceitei sair com ele—sem maiores ou menores pretensões: eu só não queria ficar sozinho no meu quarto pensando nas coisas que meu cérebro queria pensar.

Não perguntei aonde iríamos nem quem estaria junto; só troquei de roupa e fui. Ele avisou ao pai que estava de saída—coisa que sempre fazia—e que não tinha hora para voltar. "Cuidado pra dirigir na volta" era a recomendação que Francisco sempre fazia.

Era raro que eu e Cláudio trocássemos alguma palavra enquanto ele dirigia. Por algum motivo, era o momento de nossa convivência em que fazíamos mais silêncio. Se conversávamos pouco nas outras situações, quando ele estava ao volante, então, éramos mudos do início ao fim do trajeto. Algo na atmosfera do carro, na concentração dele, no embaraço inevitável que eu sentia ao lado dele naquela circunstância sem saber explicar o porquê... Não conversávamos, simplesmente. O carro seguia pelas ruas fazendo seus ruídos próprios e nossas respirações se entrecruzavam pelo pequeno espaço, até que, nesse dia, ele me perguntou de forma muito direta:

— Como você tá?

Não perguntou com doçura ou carinho ou preocupação: perguntou como quem espera uma resposta lacônica, monossilábica em troca. Fiquei mais intrigado do que surpreso, mas respondi, dentro do limite da naturalidade:

— Tô bem... Por quê?

— Por nada... Pra saber.

Tentei voltar ao meu longo lapso de desatenção, mas não consegui. Fiquei reprisando as palavras na minha mente e tentando ler todas as entrelinhas imaginárias que estariam por trás delas. Meu pensamento mais imediato foi que eu estava quieto demais, sério demais, e que minha tristeza por fazer duas semanas que meus pais não me procuravam estava estampada em letras vermelhas garrafais no meio da minha testa.

— Você não conversa...

Ele continuou. Dessa vez o tom foi quase de protesto.

Eu não converso? — indaguei. Realmente não havia entendido o que ele quis dizer com essa.

Prazer e Remissão (romance gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora