Eu estava cem por cento lúcido, mais lúcido do que jamais estivera. Lúcido e decepcionado, mas não tão surpreso. Era melhor aceitar de uma vez por todas que minha vida agora deveria seguir sem Sílvia e Álvaro, que isso seria melhor para mim no final.
Mas ainda era noite de Natal. Eu estava na rua vazia da minha casa sem ter exatamente para onde ir. Cláudio ofereceu me buscar depois que eu terminasse minha visita, mas acho que ele imaginou que ela fosse ser um pouco mais longa e bem-sucedida. Ele deveria estar feliz na casa da mãe dele a uma hora daquela, e não seria eu a interromper o momento com a minha inconveniência. Além disso, eu não estava a fim de estar com ele e o pai dele naquela noite, naquela circunstância.
Lembrei-me então de que Jéssica também havia me convidado para estar com ela e a mãe... mas também julguei inapropriado aparecer lá àquela hora. Acabei fazendo o que me restava: ir até a avenida mais próxima e esperar por um táxi para me levar de volta para casa, onde dormi o sono dos justos até o dia seguinte.
Explicar a noite da ceia foi um desgosto. Nada saiu como eu idealizara. Nada. Jéssica se lamentou junto comigo, Cláudio manteve calada sua indignação, Francisco não sabia, creio. Na quinta-feira, parecíamos estar todos de luto em um dos pátios da universidade, todos compassivos pelo meu infortúnio. Já eram dez para as nove da noite quando Léo apareceu para trazer um pouco de alegria ao meu espírito.
— Ih, gente! Morreu vaca aqui, foi?
Ele se sentou ao meu lado, enganchando meu pescoço para me aproximar e beijar meu rosto.
— Nada, a gente tava só conversando — Jéssica respondeu.
— O que vocês 'tão fazendo aqui hoje uma hora dessas? Vocês ainda têm aula?
— A Semana de Talentos atrasou o calendário da faculdade inteira, né? Tem professor entregando nota e aplicando exame só essa semana...
— Eu fui um que peguei exame — admiti. — Mas o meu foi no primeiro horário; já tô livre... E você? O que tá fazendo aqui?
— Eu vim pegar nota também, não tenho mais aula e não peguei exame.
— Esses curso coxa de Humanas... — Cláudio zombou, suspirando. Léo o ignorou.
— E tá tudo bem? — ele perguntou mais para mim que para os outros dois.
— Tô bem, e você?
— Bem também. Como passou de Natal?
— Hum... Normal.
— Xi!... Não gostei desse "Normal", não. Que que houve, Dinho?
— Hora que vocês não 'tiverem se comendo ele te conta — Cláudio se levantou; Jéssica fez o mesmo. — Bora pra sala? Eu não terminei minha prova ainda.
— Eu não tenho aula mais — Léo respondeu —, vim aqui atrás de vocês só pra ver se vocês 'tavam por perto; já tô indo embora. Você já tá indo, Eugênio?
— Até que eu queria, mas vou esperar a carona do Cláudio...
— Ah! Bom, então, que a gente fica aqui conversando.
— Você não tava indo embora? — Cláudio zombou de novo.
— Tava, mas, já que o Eugênio vai te esperar, a gente fica por aqui, depois você me deixa em casa.
— Folgado pouco, hein?
— Pronto, ó! Resolvido. Manda mensagem a hora que acabar sua prova, que a gente te encontra.
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Prazer e Remissão (romance gay)
Romance::: LIVRO COMPLETO! ::: NÃO RECOMENDÁVEL A MENORES DE 18 ANOS. Quando ingere uma superdose de sedativos para dar cabo da própria vida, Eugênio só quer se livrar daquele poço sem fundo de desgosto, tristeza e solidão. Ao acordar deitado no chão de...